Uma opção de classe

Anabela Fino

Raras vezes os por­tu­gueses terão tido opor­tu­ni­dade de ouvir ex­pli­cação tão clara sobre as op­ções po­lí­ticas do Go­verno como a que foi dada esta se­gunda-feira por Luís Campos Fer­reira, de­pu­tado do PSD, na RTP In­for­mação.

O tema em de­bate era o Or­ça­mento do Es­tado para 2012 e a pro­posta para au­mentar os li­mites dos cortes gra­duais nos sub­sí­dios dos fun­ci­o­ná­rios pú­blicos e pen­si­o­nistas, apre­sen­tadas nos úl­timos dias como uma es­pécie de ban­deira das «pre­o­cu­pa­ções hu­ma­ni­tá­rias» da mai­oria par­la­mentar. Em es­túdio com a jor­na­lista que apre­senta o pro­grama, Campos Fer­reira cla­mava a sua in­com­pre­ensão por não ver re­co­nhe­cida e acla­mada pelas opo­si­ções essa imensa be­nesse de cortar «apenas» um dos sub­sí­dios aos fun­ci­o­ná­rios pú­blicos que au­ferem entre 600 e 1100 euros, man­tendo o corte dos dois sub­sí­dios «apenas» para quem tenha ren­di­mentos a partir de 1100 euros. No es­túdio do Porto es­tava Rui Sá, an­tigo ve­re­ador do PCP na Câ­mara do Porto, que em duas pe­nadas re­duziu a pro­posta às suas ver­da­deiras di­men­sões, de­mons­trando a de­ma­gogia de pre­tender apre­sentá-la como prova de «equi­dade nos sa­cri­fí­cios» pe­didos aos por­tu­gueses e en­fa­ti­zando o facto de a banca e o grande ca­pital con­ti­nu­arem não só li­vres deles como a ser be­ne­fi­ci­ados/​en­gor­dados com mi­lhares de mi­lhões de euros que os por­tu­gueses são cha­mados a pagar com o au­mento da sua mi­séria.

Campos Fer­reira não con­testou os factos mas foi lé­pido na res­posta: os por­tu­gueses não vo­taram nas op­ções co­mu­nistas mas sim nas do PSD, que as­senta a sua go­ver­nação e a sua po­lí­tica em op­ções de classe. Ora bem. Está tudo dito, nem são pre­cisas mais ex­pli­ca­ções.

É claro que o de­pu­tado do PSD se «es­queceu» de dizer que na cam­panha elei­toral Passos Co­elho chegou a con­si­derar um ab­surdo o corte de sub­sí­dios, ga­rantiu que os fun­ci­o­ná­rios pú­blicos não se­riam mais pe­na­li­zados, re­jeitou ter­mi­nan­te­mente a hi­pó­tese de des­pe­di­mentos, etc., etc., etc. Mas bem vistas as coisas nada disso al­tera a es­sência da con­fissão de Campos Fer­reira: é tudo uma questão de opção de classe. Uns ex­ploram e ou­tros são ex­plo­rados. Por isso mantém toda a ac­tu­a­li­dade o apelo do velho Marx: Pro­le­tá­rios de todos os países Uni-vos!



Mais artigos de: Opinião

É a dignidade, estúpidos!

Há quem não ande, rasteje, mesmo que se julgue de pé. Há quem dizendo o que lhe mandam, não raras vezes mais que a mero mando à sombra da paga que lhes agiliza a prosa, julga convencer quem os ouve que ali reside réstia de pensamento ou vontade próprias. Há...

Vítor Gaspar?

«[…] Este é um dos orçamentos mais exigentes de sempre da economia portuguesa. A severidade das medidas que incorpora apenas é justificada pela situação de emergência nacional». «[…] Nós subordinamos tudo, neste momento, à...

A farsa

Os dirigentes socialistas encenaram nas últimas semanas um espectáculo de «oposição» ao OE do Governo – objectivo notoriamente difícil, dada a não menos notória cumplicidade do «socialismo democrático» em todo o enredo, iniciada pelo...

Chauvinismo euro-germânico

Referindo-se à facilidade com que o Governo alemão impõe cada vez mais os seus interesses aos restantes países da União Europeia, o secretário-geral do partido da chanceler Angela Merkel, Volker Kauder, afirmou num congresso em Leipzig: «Agora na Europa fala-se...