Nem lhes passa pela cabeça...

Anabela Fino

Sem as prestações sociais – subsídios de desemprego, pensões, rendimento social de inserção ou complemento solidário para idosos – 43,4 por cento dos portugueses estariam em risco de pobreza, revela o inquérito para os Indicadores da Europa 2020 divulgado esta segunda-feira, 11, pelo Instituto Nacional de Estatística (INE). Grosso modo, isto significa metade da população do País.

Sabendo-se que os dados se reportam a 2010 e que de então para cá o desemprego não tem parado de subir; sabendo-se que o Governo se prepara para impor o aumento do IRS, do IVA, dos transportes, dos cuidados de Saúde, dos impostos sobre a habitação e de outros bens essenciais; sabendo-se que na agenda governativa está a revisão das leis laborais para facilitar os despedimentos e embaratecer (ainda mais) o trabalho; sabendo-se que o Governo quer dificultar o acesso e reduzir o montante das prestações sociais – a questão que se coloca é elementar: como podem dignatários políticos como o Presidente da República Cavaco Silva, ou da Igreja como o Cardeal Patriarca José Policarpo falar de «sacrifícios justos» e pedir «compreensão» aos portugueses?

Chega a ser obsceno ver o presidente da Rede Europeia Anti-Pobreza em Portugal, padre Agostinho Jardim Moreira, afirmar que já ficaria «contente» se os actuais níveis de pobreza se mantivessem, enquanto manifesta o seu apoio ao roubo de metade do subsídio de Natal e diz não ver possibilidades de o Governo «diminuir a pobreza» (agência Ecclesia, 11 Julho 2011).

Não ocorre a nenhuma destas tão católicas personalidades que o Governo podia impor uma taxa efectiva de 25% à banca; tributar de forma agravada os bens de luxo; aplicar uma taxa, mesmo baixa às transacções bolsistas; tributar as transferências para paraísos fiscais que lesam o orçamento do Estado; impor uma taxa mais elevada às empresas com mais de 50 milhões de euros de lucros. Não. Tais ideias só passam pela cabeça dos comunistas, os tais que não se conformam com o facto de o rendimento dos 20% da população com maiores recursos corresponder a 5,6 vezes o rendimento dos 20% da população com mais baixos recursos, e por isso lutam pelo socialismo.

 



Mais artigos de: Opinião

Vozes afinadas da exploração

Em grande sintonia e afinação no tom, ouvimos um coro de elogios ao roubo no subsídio de Natal. Alinharam não só os suspeitos do costume mas também outros que costumam ser publicamente mais comedidos nestas coisas de roubos e assaltos a direitos. Uma actuação...

O lixo da história

Propriedade dos maiores bancos e interesses norte-americanos, mas tão apátrida como só o grande capital o consegue ser, a Moody's é uma das agências de notação de dimensão mundial que avalia o risco das grandes operações financeiras. Foi esta...

A vaca sagrada

Joseph Stiglitz é um reputado economista norte-americano, Prémio Nobel da Economia em 2001 e professor na Universidade de Columbia. Obviamente, está longe de ser um «perigoso» revolucionário marxista-leninista ou, sequer, expender cumprimentos ao socialismo. Numa das suas...

O demagogo

Logo que foram sendo conhecidos os nomes dos ministros que hoje integram o Governo do PSD/CDS-PP, percebeu-se rapidamente que, relativamente a alguns deles, estava montada toda uma campanha a partir dos media, no sentido de valorizar a participação de alguns ditos independentes, apresentados como técnicos competentes, sem responsabilidades na crise que o País atravessa, libertos de pressões partidárias, com uma visão menos formatada das causas e sobretudo com soluções para os problemas.

A Palestina vencerá

Em Setembro o povo palestiniano vai tentar que a Assembleia Geral das Nações Unidas acolha o Estado Soberano e Independente da Palestina como membro de pleno direito da ONU. Depois de longas dezenas de anos de cumplicidade das potências da NATO com a ocupação militar israelita, o povo...