Hierarquias exigem mais dinheiro e todo o poder
Em 1975 – um ano apenas após o «25 de Abril» português – o mundo capitalista entrou numa alucinada fase de regeneração. Tratava-se de desenvolver, a curto prazo, um plano de acção cujos objectivos finais visavam a rápida absorção de toda a riqueza produzida pelo homem ou oculta na Natureza sob a forma de matéria-prima. Sabia-se que o plano de campanha teria de adoptar meios nada éticos e de tomar decisões politicamente incorrectas. Esse compromisso central seria assumido à «porta fechada». Em torno, manter-se-ia um silêncio feroz resguardando os segredos de um limitado núcleo de «barões da indústria», formado por banqueiros, governantes políticos, altas patentes das Forças Armadas, hierarquias da Igreja, cientistas e especuladores financeiros – plenipotenciários do capital revestidos com roupagens da defesa das liberdades, do respeito pela democracia, da filantropia e da justa distribuição da riqueza.
Nessas etapas iniciais da nova geração capitalista tudo se desenvolveu de forma discreta. As primeiras operações foram «cirúrgicas». Pensa-se agora que em todo o mundo apenas cerca de vinte mil altos funcionários, selectivamente escolhidos, tenham sido afastados da área dos centros de decisão. Pelo contrário, da noite para o dia surgiram milhares e milhares de instituições humanitárias «desinteressadas, altruístas e sem ligações a partidos políticos ou correntes religiosas». Das vanguardas plutocratas destacou-se, também, um grupo de especuladores subitamente «convertidos» à filantropia e à defesa dos direitos do Homem. A partir de então, nas novas universidades (sobretudo nas católicas) desabrocharam milhares de novos quadros, com níveis desiguais de preparação e ausência generalizada de sentido crítico.
Das guerras imperialistas, de agressão e de rapina, nunca mais se ouviu falar. Continuavam a multiplicar-se, é certo, mas «crismaram-nas» em intervenções humanitárias em defesa das liberdades, pretensamente impostas pela vontade popular, ainda que depois as populações fossem massacradas pelos «libertadores». Calcula-se que deste modo tenham sido exterminados 200 milhões de seres humanos e outros 600 milhões tenham ficado estropiados.
Afirmou então um destacado analista político da América Latina, Ortiz y Carrillo: «Em surdina, lentamente, a partir de 1975 foi iniciada a Terceira Guerra Mundial».
Dinheiro sujo e falso
A alimentação das várias frentes desta megaoperação capitalista tem exigido caudais inesgotáveis de dinheiro. Não é a preços módicos que se provocam guerras, se compram consciências, se desorganizam economias sociais e se tece o submundo do crime. Estatísticas financeiras credíveis quantificam em 18 triliões de dólares os gastos destas operações, só em valores financeiros e em pouco mais de vinte anos. Foi a partir de 1975 que aceleraram subitamente os ritmos da sabotagem dos sistemas socialistas europeus e mais se agudizaram as divisões entre os movimentos de libertação, a liberalização dos mercados, a promoção bolsista dos capitais especulativos e a farsa dos apelos à paz lançados aos quatro ventos pelos senhores da guerra. Cresceu esmagadoramente o peso financeiro dos mercados internacionais das drogas, o comércio clandestino das armas, a adulteração da moeda, o contrabando de seres humanos e, indistintamente, todas as operações legais e ilegais que pudessem dar lucros imediatos com taxas elevadas. Não se encontrando nestas condições, o pequeno e médio comércios, a agricultura, as pescas e grande parte das actividades económicas reprodutivas foram friamente abandonadas.
Como sucede nas esquizofrenias, as sociedades humanas passaram a aceitar ser normal a coexistência entre o real e o mais doentio imaginário. As novas comunidades dizem-se independentes e «democráticas» mas, na realidade, obedecem a ordens imperativas de organismos estranhos e invisíveis, tais como bolsas, mercados, «offshores», G-7 e G-8, Opus Dei, fundações, fundos monetários, sistemas de segurança mundiais ou mesmo aparelhos dotados de poderes majestáticos, como os da Mafia, do Vaticano ou da Al-Qaeda. Ninguém os vê mas toda a poderosa alta burguesia lhes obedece como se fossem deuses.
Porém, é cada vez mais evidente que as cartas que os banqueiros lançaram sobre a mesa nada e ninguém as poderá voltar a recolher. Foram longe, de mais. Embriagaram-se com o seu poder. Puseram a terra que é dos homens de pernas para o ar.
Não estamos em presença de cenários puramente nacionais. E é evidente que a realidade do processo histórico avança autonomamente, como sempre. Agora, só ao povo compete desfazer essa cambalhota. Voltar a devolver ao homem a posição normal: cabeça levantada e corpo assente sobre os pés.
Custe o que custar, assim se fará. E a Igreja deve repensar-se, fazer acto de contrição. Deixar de ser uma pedra encravada nos tempos.