A «anomalia» cipriota

Albano Nunes

Quando há dignidade nacional e vontade política, um Governo ouve o povo trabalhador e procura o seu apoio

Em Nicósia, de 25 a 28 de Novembro, realizou-se o 21.º Congresso do AKEL, Partido Progressista do Povo Trabalhador de Chipre. Tratou-se de um importante acontecimento na vida de Chipre e de toda a região. O AKEL, partido comunista com que o PCP mantém há longos anos estreitas relações de cooperação e solidariedade internacionalista, é há muitos anos a principal força política do seu país, obteve 31,1% da votação nas últimas eleições legislativas e Demetris Christofias, à data seu Secretário-geral, venceu em 2008 as eleições para a Presidência da República e chefia o governo de Chipre.

O Congresso reflectiu o papel insubstituível do AKEL na sociedade cipriota e o grande apoio e prestígio de que disfruta junto dos trabalhadores, da juventude e do povo. Mostrou um partido orgulhoso do seu património de luta ao serviço do povo cipriota, pela libertação do país do longo domínio colonial britânico, contra o fascismo e a liberdade. Mostrou que o AKEL é realmente a vanguarda da classe operária e dos trabalhadores e a grande força da causa nacional do povo cipriota, da luta incansável pela libertação da parte Norte da Ilha da ocupação turca, ocupação que dura desde Julho de 1974 e abrange 37% do território.

 

Mostrou também algo de muito importante para a luta que travamos em Portugal. No momento em que está em desenvolvimento a mais violenta ofensiva antipopular desde a Revolução de Abril, e quando em coro, PS, PSD/CDS, Presidente da República e toda a corte de beneficiários da contra-revolução pretendem que não resta aos portugueses outra saída que não seja a de ajoalhar diante das exigências do grande capital, em Chipre caminha-se em sentido contrário. Aí, um governo patriótico e progressista apoiado por um forte movimento sindical de classe - mesmo estando longe de ser um governo revolucionário em condições de aplicar o programa do AKEL – recusa as políticas neoliberais, defende as funções sociais do Estado, combate o desemprego e a pobreza, promove a dinamização da economia e Chipre, sem que esteja imune à crise capitalista e à ofensiva global do capital, apresenta resultados e índíces macroeconómicos invejáveis para um país da União Europeia. Quando há dignidade nacional e vontade política, quando os problemas são enfrentados em sintonia com os interesses populares, quando, mesmo com uma correlação de forças internacional desfavorável, um governo ouve o povo trabalhador e procura o seu apoio

 

Entretanto o grande capital autóctone e o imperialismo não se conformam com um governo que procurar escapar à sua sanha exploradora e opressora. A existência num país da UE de um Presidente da República comunista e de um governo progressista é uma «anomalia» e um exemplo intolerável. Uma comunicação social completamente controlada pelos grupos e conómicos e pela direita declarou guerra ao presidente Christofias. Os próprios aliados do AKEL no governo rompem compromissos assumidos e comportam-se como oposição. Forças de extrema-direita nacionalista, fomentam o chauvinismo, fazem como em 1974 o jogo do ocupante turco, fomentam a consumação da divisão do país.

A situação em Chipre é muito complexa, e muito complexas e exigentes as tarefas dos comunistas cipriotas que lutam em todas as frentes, e agora também no governo, pelos interesses dos trabalhadores e pela soberania e integridade territorial do seu belo país. Mas continuando a considerar como tarefa central, como o Congresso sublinhou, a acção independente do partido e o seu enraízamento nas massas trabalhadoras, o AKEL continuará, aconteça o que acontecer, a desempenhar um papel decisivo e insubstituível na vida do seu país. E a contar, como afirmamos na saudação fraternal do PCP lida na tribuna do 21.º Congresso, com a solidariedade de sempre dos comunistas portuguesas.



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