Uma candidatura com um projecto patriótico e de esquerda
Falemos agora dos objectivos da candidatura. Impedir a reeleição de Cavaco Silva é um deles?
Esta candidatura é pelo povo português, pelos trabalhadores, por Portugal. Assenta na esperança, confiança e determinação de que é possível construir um País de progresso. Para que isto se concretize não é suficiente mas é necessário que Cavaco Silva não seja reeleito.
Pelo seu passado como primeiro-ministro?
Em primeiro lugar, pelo seu passado. Não nos podemos esquecer que o actual Presidente da República é dos responsáveis políticos mais comprometidos com este rumo de afundamento do País pois teve, em 25 anos, as mais altas responsabilidades políticas ao longo de 15: dez como primeiro-ministro e cinco como Presidente da República.
Mas também pelo que representa para o futuro. A reeleição de Cavaco Silva significaria não apenas a continuação dos problemas mas o seu agravamento. Olhando para a sua consonância com os interesses da alta finança, dos grupos económicos e financeiros, da especulação, perguntamos: que poderá Cavaco Silva adiantar, nos próximos cinco anos, para responder aos problemas nacionais? Será a manutenção e agravamento desses problemas. Não passa por ele o contributo para a resolução dos problemas nacionais. Passa, sim, por um projecto alternativo – o projecto da nossa candidatura.
E os restantes candidatos, não poderão constituir essa alternativa?
O candidato Manuel Alegre, por exemplo, o que representa? Qual foi o seu percurso ao longo das últimas décadas? Intervenções e palavras temos ouvido muitas, mas nos momentos cruciais em que se decidiu o futuro do País, esteve com a prática política de sucessivos governos do PS. Que, juntamente com os governos do PSD e CDS, estão na base da situação que o País atravessa.
E hoje vemos o candidato Manuel Alegre, candidato do PS apoiado pelo BE, com a preocupação de salvar a política do actual Governo e a sua continuidade. É com este projecto político que Manuel Alegre se identifica, pelo que não vejo que seja alternativa a Cavaco Silva. Em aspectos essenciais, e independentemente das palavras, há uma grande identificação…
A minha candidatura, pelo seu projecto próprio, assume-se como a única capaz de responder às necessidades actuais do País e por isso se diferencia tanto das candidaturas de Cavaco Silva e de Manuel Alegre.
O que seria um bom resultado eleitoral?
Essa questão tem sido muitas vezes colocada, mas tem uma base desfocada. Face a um País dependente e à abdicação da soberania nacional e ataque ao regime democrático, esta candidatura apresenta uma alternativa e diz: «Basta! Não é possível aceitar mais este rumo!»
E isto é muito mais do que esta ou aquela percentagem eleitoral, é a apresentação de uma alternativa, de um novo rumo para o País. Cada voto nesta candidatura conta e decide para a eleição do Presidente da República e para abrir caminho à mudança que é necessária.
É, então, um processo que vai muito para lá do dia 23 de Janeiro?
De 23 de Janeiro ou da segunda volta... Mas tem uma expressão muito concreta nas eleições presidenciais. O objectivo que temos é o de responder às necessidades do País e o povo português determinará a expressão dos votos. A situação a que se chegou justifica um largo apoio a esta candidatura de alternativa para Presidente da República. Um apoio que quanto mais forte for mais contará para abrir o caminho que é necessário e urgente abrir no nosso País.
Uma das críticas que temos ouvido de vários comentadores é a de que uma alegada dispersão de votos à esquerda de Cavaco Silva seria favorável à reeleição do actual Presidente...
A nossa candidatura não divide nada, não diminui nada. Só acrescenta, só mobiliza, só potencia. Em primeiro lugar porque cada voto na minha candidatura contribui para impedir que Cavaco Silva seja eleito à primeira volta. Mas também porque cada voto nesta candidatura corresponde à afirmação do projecto político patriótico e de esquerda indispensável ao País.
A questão não é classificar, por palpite ou inércia, se estas candidaturas são de «esquerda» e aquelas são de «direita». Mas ver quem está comprometido com o rumo que afundou o País e o conduziu ao grau de injustiças sociais em que está e quem de facto se opõe a esse rumo. É saber quem corporiza um rumo novo para o País e quem se apresenta, mesmo com este ou aquele adorno de linguagem, para prosseguir esse rumo de afundamento. E a resposta é inequívoca: olhando para o quadro actual das candidaturas, a minha é a única que não está comprometida com este rumo e a única que comporta um projecto claro de mudança para o desenvolvimento e a justiça social em Portugal.
Que balanço se pode fazer destas primeiras semanas da candidatura?
Estamos ainda na fase de arranque, mas há um sentimento crescente de compreensão da importância da candidatura, de apoio e de entusiasmo. À medida que se desenvolve a intervenção eleitoral e se tornam conhecidos os seus objectivos, esse movimento está a crescer.
Estamos numa fase muito difícil da vida do País e as Presidenciais não estão desligadas de todo o processo mais amplo de discussão, de acção política, de mobilização popular que existe na sociedade portuguesa. A nossa candidatura é, nas eleições presidenciais, a expressão de um movimento de luta, transformação e construção do futuro. E é também neste quadro que esta candidatura se desenvolve e cresce.
O essencial é que a Constituição se cumpra
Numa ocasião, afirmaste que o «programa» da tua candidatura se poderia resumir no conteúdo do juramento feito pelo Presidente da República ao tomar posse, de defender, cumprir e fazer cumprir a Constituição. Achas que a Constituição, com todas as revisões que já sofreu, é suficiente como programa?
O conteúdo da minha candidatura é o que está firmado na declaração de candidatura, e que está a ser desenvolvido na sua intervenção quotidiana. Mas disse, e reafirmo-o, que nas linhas essenciais aquilo que o País precisa – e que esta candidatura afirma – está consagrado na Constituição da República Portuguesa. Defender, cumprir e fazer cumprir a Constituição assegura, indo aos seus elementos essenciais, um processo de mudança profunda do País.
As revisões introduziram profundos golpes e abcessos na Constituição, que a limitam e condicionam. Mas olhando para a Constituição que temos, para a sua matriz e preceitos essenciais, vemos que está ali o cerne do projecto de mudança que é necessário. Defender, cumprir e fazer cumprir a Constituição é não apenas um juramento solene do Presidente da República mas também, nas circunstâncias actuais, um compromisso com a mudança que é necessário operar no nosso País.
Não deixa de ser curioso que os que desejam manter este rumo pretendam alterar a Constituição e os que querem uma mudança em Portugal a defendam...
É uma questão interessante. Mas o que digo é que a mudança não passa apenas por manter a Constituição nos seus traços essenciais, passa por cumpri-la e por fazê-la cumprir. Porque esse é o grande problema. Nós temos a Constituição, mas a prática política prosseguida tem sido contrária à Constituição.
Quando se coloca a questão de alguns quererem subverter o texto constitucional é preciso lembrar que há outra forma de subverter a Constituição, através de uma prática política de desrespeito pelos seus princípios essenciais. E isto é visível em questões basilares, como a afirmação da independência nacional e da soberania do povo; a base económica assente numa economia mista; a consagração de importantes direitos, não apenas políticos mas também económicos, sociais e culturais...
Estes são aspectos essenciais na afirmação da Constituição da República que têm sido desrespeitados pela prática política de sucessivos governos e que estão neste momento no cerne não só dos objectivos da subversão do texto constitucional que o PSD apresenta (e vamos ver como o PS se pronuncia em relação a eles) como de um conjunto de medidas do actual Governo, com os seus «pacotes» contra os trabalhadores e o povo.