O regresso dos OGM
A discussão sobre os OGM está de volta à União Europeia (UE). A resistência e as contradições no seio das forças que sustentam o capitalismo da UE levaram a que fossem colocados de lado durante algum tempo. Agora, ei-los de volta, utilizando um caldo de cultura ideológica que entretanto foi sendo criado, nomeadamente em torno das alterações climáticas e da crise dos produtos alimentares. Os OGM são sementes modificadas geneticamente por grandes multinacionais do «agronegócio», com a justificação de serem mais resistentes a intempéries, pragas e para reduzir o consumo de água e de produtos químicos (pesticidas, herbicidas...). Já passaram alguns anos desde que estas tecnologias foram criadas e até agora nunca foram apresentadas provas cabais de não provocarem danos tanto ao ambiente como à saúde dos animais e dos humanos.
Um presente envenenado
A Comissão Europeia acaba de propor a transferência para cada país da responsabilidade de decidir sobre a introdução de novos tipos de plantas geneticamente modificadas. De acordo com esta proposta, os países da UE «podem restringir ou proibir o cultivo de OGM no seu território, dentro do quadro de autorização de espécies determinado pela UE». Recebendo a «competência» de poder decidir sobre o cultivo, os estados-membros, «não estão autorizados a adoptar medidas proibindo a importação e/ou a colocação no mercado de OGM autorizados pela UE». Recorde-se que até agora o processo de autorização estava bloqueado, pela falta de uma requerida maioria qualificada de países. Esta foi a solução encontrada para dirimir contradições que tinham sido geradas dentro das forças que defendem o capitalismo, bem aproveitadas pelas organizações agrícolas, ecologistas e outras, que desenvolveram uma campanha contra a sua introdução, levando ao impasse da decisão. Os países que não autorizarem o seu cultivo, por uma resistência interna forte, não poderão impedir a comercialização no seu território de produtos que os contenham, já que esse impedimento contrariaria a livre circulação de mercadorias na UE. A concorrência entre países tenderá a aumentar ainda mais e nenhum poderá impedir o seu cultivo do lado de lá das suas fronteiras. Como está demonstrado, a natureza não as conhece, nem paga direitos alfandegários e os ventos, os animais ou outras formas permitirão a contaminação do outro lado da fronteira. O organismo da UE que faz a avaliação dos pedidos de autorização do cultivo dos OGM, a Autoridade de Segurança Alimentar Europeia, elabora as suas propostas tendo por base estudos financiados e realizados pelas mesmas multinacionais que os produzem e pretendem comercializar. Neste domínio, como noutros, a investigação por organismos públicos é pouca ou inexistente.
O interesse do capital transnacional
Há uma campanha muito forte que tem por base as alterações climáticas, apresentando os OGM como uma das soluções tecnológicas para diminuir o consumo de água, a poluição pelo uso de produtos químicos e aumentar a produtividade agrícola, para fazer face à carência de alimentos no mundo e até para garantir uma maior regularidade na produção. Tudo isto está por provar. O que está provado, isso sim, são os milhões de euros que empresas como a Monsanto, a Syngenta ou a Pioneer, detentores dos direitos de patente destas tecnologias, irão ganhar com a generalização progressiva do seu uso. Os agricultores e toda a alimentação, tanto de animais como de humanos, tenderá a ficar nas mãos de uma meia dúzia de multinacionais, cujo monopólio pretende sobrepassar fronteiras e soberanias e estender-se à nossa mesa. A solução para a produção agrícola e para a alimentação não passa por soluções políticas e técnicas que apenas vão ao encontro dos interesses do grande capital da UE e dos interesses que este negoceia na OMC. Há que reconhecer, com carácter de urgência, o carácter complexo, sensível e único da actividade agrícola, cuja principal função continua a ser a alimentação humana. A sustentabilidade da relação entre o homem e o meio só será possível com a prioridade à soberania e segurança alimentares, respeitando o ambiente, o conhecimento adquirido e transmitido pelos agricultores de geração em geração, uma política de uso e posse da terra que lhe dê resposta. Os OGM não se ajustam aqui e por isso devem ser rejeitados.