Persistir num erro fatal
PS e PSD têm em marcha um plano visando conter e reduzir os salários, alerta o PCP, que acusa os seus autores de agirem em obediência à «burocracia europeia e à voz da senhora Merkel».
Não são os salários que afectam a competitividade
Baixar os custos directos e indirectos da força de trabalho continua a ser assim para os apóstolos do capitalismo o único caminho admissível para resolver um problema estrutural da nossa economia como é o da competitividade.
Só que essa é uma velha receita que já provou ser «uma falsa solução», uma vez que as remunerações (com as contribuições para a segurança social) representam em média apenas 15 por cento dos custos totais das empresas portugueses. No caso das exportadoras, o peso dos salários ronda os 30 por cento, sendo que uma redução dos mesmos na ordem dos 30 por cento significaria uma melhoria de nove por cento na competitividade, valor esse «rapidamente engolido» por qualquer pequena revalorização do euro».
Foi com estes números e com estes fundamentos que o deputado comunista Agostinho Lopes desmontou o argumento sobre esse alegado obstáculo à competitividade que seria o custo do factor trabalho.
Num debate suscitado pelo PSD tendo em pano de fundo exactamente a questão da competitividade da economia e o QREN (Quadro de Referência Estratégica Nacional), realizado faz amanhã oito dias, a bancada do PCP rejeitou assim de forma categórica o que não passa afinal de mais uma tentativa de desferir novo e rude golpe sobre as classes laboriosas.
Em nome da competitividade, o que o PS e o PSD fazem, afinal, é uma opção clara: atacar a força de trabalho, mantendo intocáveis os rendimentos do capital.
Dito de outro modo, segundo o deputado do PCP, o que o Governo PS e o PSD não querem, de todo, é mexer em factores e elementos - esses sim, com um peso forte na competitividade - que implicariam beliscar os poderosos interesses dos grandes grupos económicos e financeiros.
«Não querem tocar nos elementos estruturais da economia portuguesa, responsáveis pelas enormes dificuldades que as pequenas empresas enfrentam, nem alterar algumas das causas profundas, responsáveis pela perda de competitividade da economia nacional», acusou Agostinho Lopes, exemplificando com os custos do crédito, da energia, o esmagamento dos preços à produção, transportes, a injusta tributação fiscal.
Não querendo mexer em nenhuma destas «vacas sagradas», por clara opção de classe, «viram-se para o que resta», ou seja, para a redução do preço da força de trabalho, como fez notar o parlamentar comunista.
E por isso PS e PSD são tão expeditos na adopção de medidas destinadas a conter salários (num contexto em que estes já estão sujeitos a uma forte pressão devido aos históricos níveis do desemprego), agravar a precariedade, atacar a contratação colectiva, falando já em mexer na legislação laboral por forma a facilitar os despedimentos e alargar o período dos contratos a prazo.
Para além de criticar o PSD por não tocar nas questões centrais da competitividade do tecido económico, Agostinho Lopes pôs ainda em causa o seu «declarado amor» pelas PME, dizendo que «não é muito de fiar», como testemunham episódios vários, uns mais antigos outros recentes, como o prometido «Programa Específico de Apoio» dos tempos de Durão Barroso que nunca viu a luz do dia até à manutenção do Programa Especial por Conta (depois de uma campanha eleitoral pela sua extinção) ou ao seu declarado apoio à liberalização dos horários do comércio e do licenciamento comercial.
Não partilhando do optimismo do ministro Vieira da Silva - que se deu por satisfeito com os níveis de execução do QREN e adiantou mesmo que o Governo prevê uma taxa de execução superior a 20 por cento no final de 2010 - , Agostinho Lopes considerou que também neste capítulo a actuação do Governo tem sido «desastrosa».
Os intocáveis
Há, em larga medida, uma relação directa entre os sobrelucros dos nossos «gigantes» económicos e os resultados negativos das PME. Isso é claro, para o PCP, que desafia quem tenha outra explicação que a dê e diga se é ou não verdade que os lucros obscenos da banca – a mesma banca que paga menos de IRC do que qualquer outra empresa - são a outra face dessa realidade constituída por cidadãos e PME espartilhados e asfixiados por juros, comissões, spreads, garantias pessoais e por aí fora.
«Não pode haver dúvidas de que os lucros obscenos da EDP, GALP, PT, Brisa, etc., são em grande parte os custos elevadíssimos em energia, comunicações, transportes, pagos pelas PME, e perdas de competitividade das exportações», exemplificou Agostinho Lopes, que lembrou ainda como os elevados lucros da SONAE ou da Jerónimo Martins têm como contrapartida «o esmagamento dos preços e as gravosas condições, incluindo a imposição de baixas de preços “retroactivos” aos seus fornecedores, em geral PME, e o sacrifício da produção nacional».