Milhares de desempregados continuam a ser eliminados dos ficheiros do IEFP

Cresce o desemprego e o número de desempregados sem subsídio

Eugénio Rosa
O desemprego é o problema mais grave que o País enfrenta. Falar dele, com dados actualizados, nunca é demais pois só assim se tornará visível a gravidade de uma situação que já atinge centenas de milhares de famílias portuguesas, gravidade essa que não pára de crescer, embora alguns teimem em a ocultar ou em fazer passar a mensagem de que a situação está a melhorar.
O objectivo deste estudo é contribuir para esse aumento de visibilidade utilizando os últimos dados divulgados pelo Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social e fazendo uma análise desses dados diferente daquela que é normalmente feita pela propaganda governamental.
Um facto que temos vindo a denunciar é o de milhares de desempregados que se inscrevem nos Centros de Emprego continuarem a ser eliminados todos os meses, criando a muitos desempregados problemas graves. Mas é dessa forma que o IEFP consegue conter ou mesmo reduzir, pelo menos em determinados meses, os números do desemprego registado que divulga mensalmente. O gráfico I, construído com dados constantes do Boletim Estatístico de Agosto de 2009 publicado pelo Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, mostra de uma forma clara o número de desempregados eliminados mensalmente dos ficheiros dos Centros de Emprego no período que vai de Setembro de 2008 a Agosto de 2009.
O número de desempregados inscritos nos Centros de Emprego era, no fim de Agosto de 2008, de 389 944 e, no fim de Agosto de 2009, de 501 663, ou seja, num ano registou-se um aumento de 111 719 desempregados. Mas para que o número não fosse ainda maior, foram eliminados dos ficheiros dos Centros de Emprego 646 936 desempregados no período que vai de Agosto/2008 a Agosto/2009 (em média, 44 601 desempregados por mês), por razões que continuam a não constar dos Boletins Estatísticos publicados pelo Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social.

Apenas 46% dos desempregados inscritos recebem subsídio de desemprego

Apesar da redução significativa do número de desempregados inscritos nos Centros de Emprego através da eliminação de ficheiros, mesmo assim, em relação aos que restam, apenas menos de metade recebe subsídio de desemprego como mostra o gráfico II, construído também com dados divulgados pelo Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social.
Entre Agosto de 2008 e Agosto de 2009, o número de desempregados inscritos nos Centros de Emprego (não inclui os que foram eliminados dos ficheiros) passou de 389 944 para 501 663 desempregados, ou seja, registou um aumento de 111 719, enquanto o número de desempregados a receberem subsídio de desemprego passou de 168 591 para 230 608, ou seja, cresceu apenas em 62 017. Esta evolução determinou que, em Agosto de 2009, apenas 46% dos desempregados que continuavam inscritos nos Centros de Emprego estivessem a receber subsídio de desemprego. Por outro lado, o número de desempregados a receber subsídio social de desemprego devido ao facto ou de nunca terem tido direito a receber o subsídio de desemprego ou de terem perdido o direito a ele e de não possuírem recursos para sobreviver, cresceu, entre Agosto de 2008 e Agosto de 2009, de 75 544 para 107 412, ou seja, aumentou em 42,2% . Mas como se mostrará seguidamente, o valor do subsídio social de desemprego é muito inferior ao valor do subsídio de desemprego e tem uma duração muito limitada.

Subsídio social de desemprego entre 56% e 66% do subsídio de desemprego

O gráfico III, construído também com dados divulgados pelo Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, mostra que o valor do subsídio social de desemprego – inicial, subsequente e prolongamento – é significativamente inferior ao valor do subsídio de desemprego.
O subsídio social de desemprego é um subsídio que o desempregado recebe quando não tem direito ao subsídio de desemprego ou quando perde o direito ao subsídio de desemprego, mas só no caso de não ter recursos e durante um período limitado de tempo.
Um desempregado para ter direito ao subsídio de desemprego terá de ter descontado para a Segurança Social 450 dias nos dois anos anteriores à data em que ficou desempregado (prazo de garantia), ou seja, terá de ter descontado durante 21 meses num período de dois anos para a Segurança Social (n.º 1, art.º 22.º do Decreto-Lei 220/2006), o que obriga a que o contrato de trabalho, sendo mesmo temporário ou a prazo, tem que ter pelo menos aquela duração. Se tiver menos dias de descontos nos 24 meses anteriores ao despedimento não tem direito ao subsídio de desemprego.
No entanto, terá direito ao subsídio social de desemprego se tiver descontado para a Segurança Social pelo menos durante 180 dias nos 12 meses anteriores ao desemprego (n.º 2, art º 22 º do DL 220/2006). Mas para ter direito a este subsídio terá de possuir um rendimento per capita familiar inferior a 80% de 110% do valor do IAS (Indexante de Apoios Sociais) segundo o art.º 24.º do Decreto-Lei 220/2006 alterado pelo art.º 2.º do Decreto-Lei 68/2009, o que corresponde, em 2009, a 358,52 euros. Se tiver um rendimento familiar per capita superior já não tem direito a qualquer subsídio. O valor do subsídio social de desemprego corresponde a 100% do IAS (407,41 € em 2009) para beneficiários com agregado familiar, ou a 80% do IAS (325,93€ em 2009) para beneficiários isolados. No caso do subsídio social de desemprego inicial a sua duração é igual ao tempo que um trabalhador, nas mesmas condições (excepto o prazo de garantia), recebe o subsídio de desemprego, e no caso do subsídio social de desemprego subsequente é metade do tempo que o trabalhador recebeu subsídio de desemprego (art.º 37 e art.º 38 do Decreto-Lei 220/2006). O Decreto-Lei 68/2009 prorroga a atribuição do subsídio social de desemprego por mais 6 meses, mas reduz o seu valor para apenas 60% do IAS, o que corresponde, em 2009, a somente 244,20 euros (art.º 2.º).
Em 2009, segundo os dados divulgados pelo Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social no seu site, o valor médio do subsídio de desemprego é de 519,55 euros, enquanto o do subsídio social de desemprego inicial é de 322,41 euros, o do subsídio social de desemprego subsequente é de 344,45 euros, e o do subsídio social de desemprego-prolongamento (Decreto-Lei 68/2009) é apenas de 290,75 euros, portanto valores significativamente inferiores ao valor do subsídio de desemprego e mesmo inferior ao limiar de pobreza.

É urgente alterar lei que exclui desempregados do direito ao subsídio

O governo de «Sócrates I» aprovou o Decreto-Lei 220/2006 que, por um lado, restringiu fortemente o direito ao subsídio de desemprego, introduzindo mais condições restritivas e, por outro lado, reduziu o período de tempo a que o desempregado tem direito a receber subsídio de desemprego. Até à entrada em vigor desta lei a duração do tempo em que o trabalhador tinha direito a receber o subsídio de desemprego dependia apenas da idade do trabalhador; a partir da publicação do Decreto-Lei 220/2006 ficou também dependente do período de tempo de descontos para a Segurança Social (art.º 37 do DL 220/2006). Por outro lado, o período de tempo em que o trabalhador tem direito a receber o subsídio de desemprego foi reduzido pelo governo de «Sócrates I» entre três meses e seis meses (art.º 37.º do Decreto-Lei 220/2006). Para além disso, e como consta do n.º 2 do art.º 23.º do mesmo Decreto-Lei, «os períodos de registo de remunerações relevantes para o preenchimento de um prazo de garantia com atribuição de prestações de desemprego não são considerados para efeitos de prazo de garantia em nova situação de desemprego», o que determina que, mesmo que o trabalhador tenha muitos anos de descontos para a Segurança Social, desde que caia no desemprego e utilize o subsídio de desemprego, se arranjar novo emprego só tem direito a receber novamente subsídio de desemprego após ter descontado para a Segurança Social 450 dias no período de dois anos anterior à data em que perdeu novamente o emprego. E como se já tudo isso não fosse suficiente, o governo de «Sócrates I» introduziu na lei o chamado «emprego conveniente» que, no caso do desempregado recusar, constitui motivo suficiente para retirar ao trabalhador o subsídio de desemprego (art.º 49.º do Decreto-Lei 220/2006).
Face à situação social grave que o país enfrenta, em que o desemprego vai continuar a crescer de uma forma rápida e, consequentemente, também a pobreza (segundo o INE, em 2008, já 35% dos desempregados tinham um rendimento inferior ao limiar da pobreza), é urgente alterar a actual lei do subsídio de desemprego reduzindo, pelo menos temporariamente durante a crise, o período de garantia, para que mais desempregados tenham acesso ao subsídio de desemprego, nomeadamente os trabalhadores atingidos pela precariedade crescente, sendo também necessário aumentar o período de tempo em que o desempregado tem direito a receber o subsídio de desemprego, nomeadamente os trabalhadores mais velhos e os com família. Os jovens, cuja pobreza está aumentar (23% em 2008, segundo o INE), não deveriam ser esquecidos e mereceriam também um tratamento adequado.


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