O compasso de espera...

Jorge Messias
Anunciadas que foram oficiosamente as alterações ao texto da Concordata, um novo manto de silêncio voltou a recair sobre o assunto. Sabe-se, entretanto, que os poderes reconhecidos à Igreja Católica foram muito ampliados e que ficou aberta uma janela por onde hão-de passar novas e contínuas reivindicações do Patriarcado.
Por ora, para a Igreja, convém silenciar. O texto revisto e alterado vai ao Vaticano, o Papa assina-o, volta a Lisboa para ratificação do Conselho de Ministros e só depois é publicamente divulgado. Este compasso de espera convém aos interesses da Igreja. O alto clero não alimenta ilusões quanto às intenções dos «socialistas» no poder. Conhece os riscos que a Igreja corre de ver não passarem do papel os novos privilégios alcançados. Este tempo de espera é-lhe precioso para a tomada da decisão final acerca das estratégias da intervenção eclesiástica nas próximas eleições. Ou o Governo cumpre à risca o prometido e cede um pouco mais na área dos novos privilégios; ou o Governo não cumpre, empata e pretende enganar cardeais e bispos. No primeiro caso, muito bem: os «socialistas» terão o precioso apoio da Igreja. Se assim não acontecer, o PS arrisca-se a pagar com língua de palmo a aventura e os apoios políticos da Igreja procurarão outros horizontes...
Nos compromissos eleitorais entrou-se em fase de contagem decrescente.

Um «compasso» que não espera!

A nível da «Sociedade Civil», os responsáveis católicos gostam muito de se apresentar como agentes da «Revolução Solidária e da Inovação Social». Esta fórmula serve de bandeira à Igreja Católica que dispõe já de uma rede instalada de instituições sociais (as IPSS, as Misericórdias, as ONGS, etc.); que dirige um corpo organizado de agentes de intervenção na sociedade (o voluntariado católico); que tem diferentes fontes de financiamento (por exemplo, o empresariado privado, o Estado, a banca, as verbas comunitárias, as fundações não lucrativas e outras fontes que tacticamente são omitidas; e, finalmente, que dispõe de uma intensa articulação (parcerias) com organizações paralelas do Estado e do mercado, justamente nas áreas onde a pobreza é maior e as pessoas são mais vulneráveis. Por aqui se vê como, em Portugal, a Igreja é mais forte do que o Estado. E como convém aos seus interesses que o poder político se atole cada vez mais nos pântanos da incompetência, da corrupção, e se fragilize. Sem rei nem roque, o Estado afunda-se e conduz os pobres à miséria declarada. A Igreja refugia-se, então, no silêncio e proclama-se como salvadora dos pobres.
Na área social, a máquina da Igreja caracteriza-se pela procura constante da proximidade com as populações, pela inovação nas relações com as comunidades e pela descentralização aparente dos seus projectos de acção. A catequização desenvolve-se pouco a pouco, quase sempre de forma indirecta, através da influência alcançada com a solução de pequenos problemas práticos locais. Para consolidarem esta estratégia, as IPSS progridem no terreno a partir da aplicação de cinco regras de ouro: inovação, integração, flexibilidade, participação e auto-sustentabilidade. Sectorialmente, o seu trabalho baseia-se em projectos multidisciplinares, cruzando propostas de acção e camadas pré-determinadas das populações Tudo permanentemente coordenado pela organização central das IPSS e pelos «Centros do Tempo» cuja função é coordenar, avaliar, testar e validar a qualidade dos serviços da rede. Por exemplo, projectos como os EQUAL ou COMpasso podem dizer respeito, simultaneamente, a factores díspares mas associados, tais como os da família e da profissão, da inovação «Take-Awad» (que envolve os problemas do indivíduo, da família e da comunidade), os serviços de apoio a idosos, as organizações da área do desporto e da juventude, etc.
Que este esquema em pirâmide existe, é uma certeza. Que funcione, nunca se sabe. Mas também é certo que deve merecer a nossa atenção.


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