Mudança credível

Jorge Cadima

A guerra do Afeganistão é uma guerra de ocupação e dominação imperialista

Pela calada, sem destaque na comunicação social de regime, mais um país e o seu povo estão a ser vítimas da infernal máquina de guerra do imperialismo norte-americano e seus serventuários. A guerra desencadeada pelos EUA no Afeganistão já alastrou ao vizinho Paquistão, aliás, como Obama deixou entender durante a sua campanha eleitoral. «As Nações Unidas afirmam que quase um milhão de pessoas fugiram [das suas casas no vale de Swat] nas últimas duas semanas. O número total de desalojados internos no Paquistão nos últimos 12 meses cresceu para 1,4 milhões» (BBC, 15.5.09). Nas poucas notícias sobre este desastre humanitário repetem-se as habituais desculpas superficiais, baseadas na fraseologia e propaganda da bushiana “Guerra ao Terrorismo”. Fala-se em talibãs e fundamentalismos. Mas não se explica como é que após oito anos de guerra e ocupação dos EUA/NATO no Afeganistão, fundamentalistas medievais estariam, não apenas a colocar as mais sofisticadas e bem-equipadas forças armadas do planeta na defensiva, como a alastrar para um país vizinho. Como é hábito, a história está mal contada.

A guerra do Afeganistão é uma guerra de ocupação e dominação imperialista, acompanhada dos habituais crimes. Longe das manchetes, no mês cinco da presidência Obama, ocorreu uma das maiores chacinas de civis cometidas pelas tropas de ocupação norte-americanas: «uma incursão aérea dos EUA no Afeganistão terá morto até 100 civis, incluíndo muitas mulheres e crianças» (Al Jazeera, 7.5.09). O Comité Internacional da Cruz Vermelha foi investigar e confirmou: «dezenas de pessoas foram mortas incluíndo mulheres e crianças. Podemos confirmar com certeza que houve mortos civis», incluindo «um voluntário do Crescente Vermelho Afegão que foi morto com outros 13 membros da sua família» (AFP, 8.5.09). A reacção popular foi violenta: «Gritando “Morte à América” e “Morte ao Governo”, milhares de aldeões afegãos atiraram ontem pedras à polícia, exprimindo a sua cólera pelos ataques aéreos americanos que responsáveis locais afirmam ter morto 147 civis. Os distúrbios começaram quando pessoas de três aldeias atingidas pelos bombardeiros dos EUA [...] trouxeram num camião 15 corpos recém-descobertos para a casa do governador provincial. [...] Está a tornar-se claro, com base nos relatos dos sobreviventes, que não se tratou dum ataque curto por parte de alguns aviões [...], mas de um bombardeamento contínuo em que três aldeias foram arrasadas. [...] isso explica que haja tantos mortos, mas apenas 14 feridos» (The Independent, 8.5.09). Não estamos perante um incidente isolado. Aliás, «aviões da Força Aérea, Marinha e de outros [países] da coligação lançaram um número recorde de bombas sobre o Afeganistão em Abril» (Navy Times, 4.5.09). E bombardeiam também no Paquistão. É para esta guerra dos EUA/NATO que José Sócrates quer enviar mais soldados portugueses (Público, 4.4.09). A poucos dias das eleições europeias, convém não esquecer que o “Tratado de Lisboa” institucionaliza a ligação União Europeia-NATO.

O reavivar do militarismo é, como não podia deixar de ser, acompanhado por um maior enfeudamento de Obama aos crimes de guerra. Depois de enviar mais 17 mil soldados para o Afeganistão, depois de declarar que não vai castigar os agentes da CIA responsáveis por torturas, nem divulgar mais (e mais terríveis) fotografias dos horrores praticados pela “mãe de todas as democracias ocidentais e economias de mercado” (para “não afectar o moral dos militares e agentes da CIA”), agora «Obama vai reavivar julgamentos militares de alguns presos na Baía de Guantanamo» (BBC, 15.5.09). Os mesmos que tinha mandado parar logo após tomar posse, afirmando que «os EUA estavam a entrar numa nova era de respeito pelos direitos humanos». Pelos vistos, foi respeito com a duração de um sound byte.

É cada vez mais evidente que a «mudança em que podemos acreditar» prometida durante a campanha de Obama, só surgirá através da resistência protagonizada pelos povos do mundo (incluíndo o dos EUA), e da sua luta para pôr fim ao mais poderoso, criminoso e maquiavélico sistema de dominação imperialista, fonte primeira de guerra, crise e miséria.


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