Destacado construtor do Partido
O PCP não seria o mesmo se não tivesse sido capaz de gerar, no seu exaltante e heróico percurso, militantes e dirigentes como Manuel Rodrigues da Silva. Nascido há cem anos – a 10 de Abril de 1909 – detém um recorde que ele e o seu Partido certamente dispensariam: foi o preso político português com mais anos de cativeiro, vinte e três.
Mas a sua vida e o seu contributo para a construção do Partido e para o derrubamento do fascismo, que não teria a felicidade de ver mas que tem também o seu cunho, vão muito para além dos longos anos passados atrás das grades.
A história é por vezes injusta. Mesmo quando se trata da nossa. Por aversão à mistificação ou ao culto ou pela própria época em que viveram e pela natureza das suas tarefas – diárias, persistentes, discretas –, permanece sobre o percurso de vida de alguns camaradas uma certa penumbra.
Com isto, perdem as novas gerações, tão necessitadas de exemplos exaltantes, corajosos e coerentes de construção e defesa deste Partido com as suas características fundamentais; e perdem também as menos novas, pois recordar é um exercício louvável e aconselhável, sobretudo em tempos de revisão da história como aquele em que vivemos. Mas sobretudo perde a História – aquela com agá grande, e não a outra, pequena, achincalhada e maltratada, escrita ao sabor de inconfessados interesses saudosistas e revivalistas...
Manuel Rodrigues da Silva é um destes nomes que a história não tratou com o carinho merecido. Nascido em São Luís do Maranhão, no Brasil, a 10 de Abril de 1909, fruto da relação de um emigrante português com uma índia brasileira, Manuel Rodrigues da Silva Júnior rumou a Portugal com apenas 4 anos. Aos 13, começou a trabalhar, como aprendiz de serralheiro mecânico na Manutenção Militar, no Beato, em Lisboa.
As duras condições de vida e de trabalho e a relação com os seus colegas operários e com as lutas que se travavam despertam nele uma sólida consciência social e de classe. A adesão ao PCP, em 1932, foi a evolução lógica disso mesmo.
Nesses anos, após a Conferência de 1929, o Partido empenha-se na frente sindical. São criados ou reorganizados vários sindicatos, que dirigem importantes lutas reivindicativas da classe operária. A Comissão Inter-Sindical, em cuja criação Manuel Rodrigues da Silva se empenhou, passando a integrar, a partir de 1934, a sua Comissão Executiva, cedo retirará à Confederação Geral do Trabalho (CGT), de orientação anarco-sindicalista, a proeminência no movimento sindical.
No mesmo ano, Manuel Rodrigues da Silva torna-se membro do Comité Regional de Lisboa do PCP.
Um constante fazer e refazer
Em Dezembro de 1935, o Partido sofre um duro golpe: pouco depois de regressar de Moscovo, onde participara no VII Congresso da Internacional Comunista, o Secretário-geral do Partido, Bento Gonçalves, é preso. A mesma sorte teriam os restantes membros do Secretariado do Partido, José de Sousa e Júlio Fogaça. Na altura não existia um Comité Central e toda a direcção do Partido se encontrava centralizada no Secretariado, o que fez deste um golpe muito difícil de superar.
Nos primeiros anos da década persistiam enormes debilidades, mas o Partido conseguira afirmar-se junto da classe operária, tendo já organização em várias empresas importantes e dispondo de considerável influência nos sindicatos. O mesmo se passava em sectores do campesinato, dos intelectuais e dos estudantes. O Avante!, publicado desde 1931, saía com regularidade.
Este crescimento não passa despercebido ao fascismo, que apontava então os seus instrumentos repressivos contra os comunistas.
Entretanto, cria-se um «Secretariado provisório» para prosseguir com a actividade do Partido, que duraria até Março de 1936. Um dos seus membros é Manuel Rodrigues da Silva, que fica responsável pela área sindical.
Em Abril, realiza-se uma reunião de quadros onde é constituído um Comité Central. Integram-no, entre outros, Manuel Rodrigues da Silva, Alberto Araújo, Francisco Paula de Oliveira (Pável), Álvaro Cunhal e Joaquim Pires Jorge. Os três primeiros passam a constituir o Secretariado.
Apesar da bravura demonstrada e dos passos efectivamente dados, o Partido não se encontrava ainda preparado para resistir à repressão e vários secretariados caem sucessivamente nas garras da temível polícia política de Salazar, a PVDE. Em 23 de Setembro, Manuel Rodrigues da Silva é capturado e mandado para o Aljube. A 17 de Outubro integra a primeira vaga de presos enviados para o Campo de Concentração do Tarrafal, ao qual chega no dia 29. «Quem vem para o Tarrafal vem para morrer», terá ouvido da boca do director Manuel dos Reis...
Persistir na luta
Manuel Rodrigues da Silva não passou incólume pelo Campo de Concentração do Tarrafal. Os quase dez anos que ali passou deixaram-lhe marcas provocadas pelas torturas, maus-tratos, trabalhos forçados, doenças, privações... Mas, ao contrário de outros camaradas que ali perderam a vida ou, irremediavelmente, a saúde, resistiu!
Com a derrota do nazi-fascismo na II Guerra Mundial, a existência do Tarrafal, concebido à luz dos campos hitlerianos e com os mesmos sinistros objectivos, tornou-se incómoda para a ditadura, que se lançava agora nos braços de ingleses e norte-americanos. No próprio dia da Vitória, em Maio de 1945, milhares de pessoas saem às ruas em Lisboa e exigem, entre outras coisas, o encerramento do Tarrafal. Para aliviar a pressão, Salazar liberta alguns presos, entre os quais Manuel Rodrigues da Silva, que chega a Portugal a 1 de Fevereiro de 1946.
Regressado ao País, retoma o seu lugar na luta clandestina. Em Julho desse ano participa no IV Congresso do Partido (II Ilegal), realizado na Lousã, onde se definiram as linhas fundamentais do Caminho para o Derrubamento do Fascismo e os princípios orgânicos, baseados no centralismo democrático.
O Partido que Manuel Rodrigues da Silva encontrara no seu regresso a Portugal era muito diferente daquele que deixara dez anos antes, aquando da sua prisão. A reorganização do início dos anos 40 fizera do PCP um grande partido nacional, capaz de liderar pujantes lutas da classe operária que abalaram o regime fascista e de resistir à repressão. Entre o III e o IV congressos, ou seja, num espaço de menos de três anos, o número de militante aumentou seis vezes, o número de organizações cinco e a tiragem do Avante! quadruplicou...
Eleito para o Comité Central, Almeida (porventura o mais conhecido dos pseudónimos de Manuel Rodrigues da Silva) retoma responsabilidades na frente sindical. Na reunião do Comité Central de Junho de 1947 apresenta um informe onde revela os avanços alcançados nos sindicatos. Em algumas importantes indústrias, dizia então, os sindicatos «estão debaixo da nossa influência numa percentagem que se aproxima bastante dos 100 por cento». Noutras, acrescentava, procurava-se constituir «comissões organizadoras de novos sindicatos e secções sindicais onde se procura garantir, desde o início, uma orientação justa e a eleição de direcções honestas conforme se aconselha nas decisões do 2.º Congresso ilegal do nosso Partido».
Esta preciosa intervenção de Manuel Rodrigues da Silva seria interrompida em 1950, quando voltou a ser capturado pela já denominada PIDE.
De acusado a acusador
A segunda prisão leva Manuel Rodrigues da Silva para o Aljube, onde permanece por três anos, sem recreio e sem visitas. É julgado em Abril de 1951, sendo condenado a quatro anos de prisão maior. O Ministério Público recorre da sentença e a pena seria agravada oito anos e «medidas se segurança» que, na prática, significava prisão por tempo indeterminado.
No seu julgamento, passa de acusado a acusador. «Nesta minha segunda prisão pude verificar que a situação dos que são presos em nada se modificou e que novos métodos mais refinados, além dos usados anteriormente, são postos em prática pela polícia política para que os presos “falem”. As longas incomunicabilidades (eu estive rigorosamente incomunicável durante 99 dias), a tortura conhecida pelo nome de “estátua”, que consiste em manter de pé os presos durante dias sem os deixar dormir, os espancamentos e as torturas morais continuam a existir.» Além disso, acrescentou, «criaram esse monstro conhecido por “medidas de segurança”, destinado a cobrir a ilegalidade das prisões depois de terminada a pena».
No final da sua acusação, avisou os esbirros: «hoje sois vós os julgadores, mas não vem longe o dia em que será o povo de um Portugal livre quem os julgará...»
À medida que os anos de prisão se sucediam, a sua saúde ia-se degradando. Em 1954, é transferido para o Forte de Peniche, onde, anos mais tarde, sofre um acidente vascular cerebral. No Avante! da segunda quinzena de Outubro de 1961 escreve-se que ficou «completamente paralisado de um dos lados» e que «neste gravíssimo estado, em perigo de vida, não foi internado, nem tem assistência médica; são os companheiros que tratam dele e o vestem».
Em Portugal e um pouco por todo o mundo, de França à União Soviética e ao Brasil, surgem campanhas pela sua libertação. Pressionado, o fascismo português concede-lhe a liberdade condicional por cinco anos e, a 8 de Janeiro de 1964, Manuel Rodrigues da Silva sai de Peniche. Esteve preso cerca de 14 anos...
Uma vez em liberdade, regressa à clandestinidade e ruma para a União Soviética para recuperar do debilitado estado de saúde em que se encontrava. Em Setembro de 1965, em Kiev, faz a intervenção de abertura do VI Congresso do Partido. É então que apela a que «saibamos fazer deste Congresso um grande passo para o reforço de todo o trabalho partidário, para o reforço da unidade de pensamento e de acção de todo o Partido, para forjarmos a arma que levará o povo português à vitória sobre o fascismo, à conquista da democracia, da independência nacional, da paz e do socialismo». Na ocasião, é eleito para o Comité Central e para o seu Secretariado, neste último com Álvaro Cunhal e Sérgio Vilarigues.
Faleceu na União Soviética, a 22 de Junho de 1968. O seu corpo esteve em câmara ardente no Instituto do Marxismo-Leninismo, em Moscovo. Numerosos partidos comunistas e forças progressistas fizeram chegar o seu pesar por esta irremediável perda. Os seus restos mortais foram depositados no cemitério de Moscovo ao lado de muitos heróis da Revolução de Outubro. Em 1969, o Conselho Mundial da Paz concedeu-lhe uma medalha a título póstumo.
Sempre solidário
Nos últimos anos da sua vida, Manuel Rodrigues da Silva dedicou-se, com o mesmo empenho de sempre, a tarefas internacionais. A 23 de Abril de 1967, a partir de Moscovo, envia, em nome do PCP, um telegrama à Conferência Internacional de Solidariedade com os Povos sob Dominação Colonial, que se realizava em Conakry. Na missiva, o Partido reafirmava a sua solidariedade e apoio incondicional à luta dos povos sob dominação colonial portuguesa. Sua libertação corresponde aos interesses dos nossos povos em luta contra opressores comuns».
A 8 de Fevereiro de 1968, a Rádio Moscovo, na sua edição para África, transmite uma mensagem gravada pelo dirigente comunista português, onde este saúda os patriotas das colónias portuguesas pela sua luta contra o colonialismo. «Que as nossas vitórias comuns sobre o salazarismo colonialista tornem rápido o advento de uma vida mais digna e mais feliz para os nossos povos irmãos, são os nossos votos mais ardentes no dia de hoje.»
No boletim O Militante de Maio de 1968, um mês antes de falecer, publica-se a sua intervenção no encontro preparatório da conferência de partidos comunistas e operários em Budapeste.
Com isto, perdem as novas gerações, tão necessitadas de exemplos exaltantes, corajosos e coerentes de construção e defesa deste Partido com as suas características fundamentais; e perdem também as menos novas, pois recordar é um exercício louvável e aconselhável, sobretudo em tempos de revisão da história como aquele em que vivemos. Mas sobretudo perde a História – aquela com agá grande, e não a outra, pequena, achincalhada e maltratada, escrita ao sabor de inconfessados interesses saudosistas e revivalistas...
Manuel Rodrigues da Silva é um destes nomes que a história não tratou com o carinho merecido. Nascido em São Luís do Maranhão, no Brasil, a 10 de Abril de 1909, fruto da relação de um emigrante português com uma índia brasileira, Manuel Rodrigues da Silva Júnior rumou a Portugal com apenas 4 anos. Aos 13, começou a trabalhar, como aprendiz de serralheiro mecânico na Manutenção Militar, no Beato, em Lisboa.
As duras condições de vida e de trabalho e a relação com os seus colegas operários e com as lutas que se travavam despertam nele uma sólida consciência social e de classe. A adesão ao PCP, em 1932, foi a evolução lógica disso mesmo.
Nesses anos, após a Conferência de 1929, o Partido empenha-se na frente sindical. São criados ou reorganizados vários sindicatos, que dirigem importantes lutas reivindicativas da classe operária. A Comissão Inter-Sindical, em cuja criação Manuel Rodrigues da Silva se empenhou, passando a integrar, a partir de 1934, a sua Comissão Executiva, cedo retirará à Confederação Geral do Trabalho (CGT), de orientação anarco-sindicalista, a proeminência no movimento sindical.
No mesmo ano, Manuel Rodrigues da Silva torna-se membro do Comité Regional de Lisboa do PCP.
Um constante fazer e refazer
Em Dezembro de 1935, o Partido sofre um duro golpe: pouco depois de regressar de Moscovo, onde participara no VII Congresso da Internacional Comunista, o Secretário-geral do Partido, Bento Gonçalves, é preso. A mesma sorte teriam os restantes membros do Secretariado do Partido, José de Sousa e Júlio Fogaça. Na altura não existia um Comité Central e toda a direcção do Partido se encontrava centralizada no Secretariado, o que fez deste um golpe muito difícil de superar.
Nos primeiros anos da década persistiam enormes debilidades, mas o Partido conseguira afirmar-se junto da classe operária, tendo já organização em várias empresas importantes e dispondo de considerável influência nos sindicatos. O mesmo se passava em sectores do campesinato, dos intelectuais e dos estudantes. O Avante!, publicado desde 1931, saía com regularidade.
Este crescimento não passa despercebido ao fascismo, que apontava então os seus instrumentos repressivos contra os comunistas.
Entretanto, cria-se um «Secretariado provisório» para prosseguir com a actividade do Partido, que duraria até Março de 1936. Um dos seus membros é Manuel Rodrigues da Silva, que fica responsável pela área sindical.
Em Abril, realiza-se uma reunião de quadros onde é constituído um Comité Central. Integram-no, entre outros, Manuel Rodrigues da Silva, Alberto Araújo, Francisco Paula de Oliveira (Pável), Álvaro Cunhal e Joaquim Pires Jorge. Os três primeiros passam a constituir o Secretariado.
Apesar da bravura demonstrada e dos passos efectivamente dados, o Partido não se encontrava ainda preparado para resistir à repressão e vários secretariados caem sucessivamente nas garras da temível polícia política de Salazar, a PVDE. Em 23 de Setembro, Manuel Rodrigues da Silva é capturado e mandado para o Aljube. A 17 de Outubro integra a primeira vaga de presos enviados para o Campo de Concentração do Tarrafal, ao qual chega no dia 29. «Quem vem para o Tarrafal vem para morrer», terá ouvido da boca do director Manuel dos Reis...
Persistir na luta
Manuel Rodrigues da Silva não passou incólume pelo Campo de Concentração do Tarrafal. Os quase dez anos que ali passou deixaram-lhe marcas provocadas pelas torturas, maus-tratos, trabalhos forçados, doenças, privações... Mas, ao contrário de outros camaradas que ali perderam a vida ou, irremediavelmente, a saúde, resistiu!
Com a derrota do nazi-fascismo na II Guerra Mundial, a existência do Tarrafal, concebido à luz dos campos hitlerianos e com os mesmos sinistros objectivos, tornou-se incómoda para a ditadura, que se lançava agora nos braços de ingleses e norte-americanos. No próprio dia da Vitória, em Maio de 1945, milhares de pessoas saem às ruas em Lisboa e exigem, entre outras coisas, o encerramento do Tarrafal. Para aliviar a pressão, Salazar liberta alguns presos, entre os quais Manuel Rodrigues da Silva, que chega a Portugal a 1 de Fevereiro de 1946.
Regressado ao País, retoma o seu lugar na luta clandestina. Em Julho desse ano participa no IV Congresso do Partido (II Ilegal), realizado na Lousã, onde se definiram as linhas fundamentais do Caminho para o Derrubamento do Fascismo e os princípios orgânicos, baseados no centralismo democrático.
O Partido que Manuel Rodrigues da Silva encontrara no seu regresso a Portugal era muito diferente daquele que deixara dez anos antes, aquando da sua prisão. A reorganização do início dos anos 40 fizera do PCP um grande partido nacional, capaz de liderar pujantes lutas da classe operária que abalaram o regime fascista e de resistir à repressão. Entre o III e o IV congressos, ou seja, num espaço de menos de três anos, o número de militante aumentou seis vezes, o número de organizações cinco e a tiragem do Avante! quadruplicou...
Eleito para o Comité Central, Almeida (porventura o mais conhecido dos pseudónimos de Manuel Rodrigues da Silva) retoma responsabilidades na frente sindical. Na reunião do Comité Central de Junho de 1947 apresenta um informe onde revela os avanços alcançados nos sindicatos. Em algumas importantes indústrias, dizia então, os sindicatos «estão debaixo da nossa influência numa percentagem que se aproxima bastante dos 100 por cento». Noutras, acrescentava, procurava-se constituir «comissões organizadoras de novos sindicatos e secções sindicais onde se procura garantir, desde o início, uma orientação justa e a eleição de direcções honestas conforme se aconselha nas decisões do 2.º Congresso ilegal do nosso Partido».
Esta preciosa intervenção de Manuel Rodrigues da Silva seria interrompida em 1950, quando voltou a ser capturado pela já denominada PIDE.
De acusado a acusador
A segunda prisão leva Manuel Rodrigues da Silva para o Aljube, onde permanece por três anos, sem recreio e sem visitas. É julgado em Abril de 1951, sendo condenado a quatro anos de prisão maior. O Ministério Público recorre da sentença e a pena seria agravada oito anos e «medidas se segurança» que, na prática, significava prisão por tempo indeterminado.
No seu julgamento, passa de acusado a acusador. «Nesta minha segunda prisão pude verificar que a situação dos que são presos em nada se modificou e que novos métodos mais refinados, além dos usados anteriormente, são postos em prática pela polícia política para que os presos “falem”. As longas incomunicabilidades (eu estive rigorosamente incomunicável durante 99 dias), a tortura conhecida pelo nome de “estátua”, que consiste em manter de pé os presos durante dias sem os deixar dormir, os espancamentos e as torturas morais continuam a existir.» Além disso, acrescentou, «criaram esse monstro conhecido por “medidas de segurança”, destinado a cobrir a ilegalidade das prisões depois de terminada a pena».
No final da sua acusação, avisou os esbirros: «hoje sois vós os julgadores, mas não vem longe o dia em que será o povo de um Portugal livre quem os julgará...»
À medida que os anos de prisão se sucediam, a sua saúde ia-se degradando. Em 1954, é transferido para o Forte de Peniche, onde, anos mais tarde, sofre um acidente vascular cerebral. No Avante! da segunda quinzena de Outubro de 1961 escreve-se que ficou «completamente paralisado de um dos lados» e que «neste gravíssimo estado, em perigo de vida, não foi internado, nem tem assistência médica; são os companheiros que tratam dele e o vestem».
Em Portugal e um pouco por todo o mundo, de França à União Soviética e ao Brasil, surgem campanhas pela sua libertação. Pressionado, o fascismo português concede-lhe a liberdade condicional por cinco anos e, a 8 de Janeiro de 1964, Manuel Rodrigues da Silva sai de Peniche. Esteve preso cerca de 14 anos...
Uma vez em liberdade, regressa à clandestinidade e ruma para a União Soviética para recuperar do debilitado estado de saúde em que se encontrava. Em Setembro de 1965, em Kiev, faz a intervenção de abertura do VI Congresso do Partido. É então que apela a que «saibamos fazer deste Congresso um grande passo para o reforço de todo o trabalho partidário, para o reforço da unidade de pensamento e de acção de todo o Partido, para forjarmos a arma que levará o povo português à vitória sobre o fascismo, à conquista da democracia, da independência nacional, da paz e do socialismo». Na ocasião, é eleito para o Comité Central e para o seu Secretariado, neste último com Álvaro Cunhal e Sérgio Vilarigues.
Faleceu na União Soviética, a 22 de Junho de 1968. O seu corpo esteve em câmara ardente no Instituto do Marxismo-Leninismo, em Moscovo. Numerosos partidos comunistas e forças progressistas fizeram chegar o seu pesar por esta irremediável perda. Os seus restos mortais foram depositados no cemitério de Moscovo ao lado de muitos heróis da Revolução de Outubro. Em 1969, o Conselho Mundial da Paz concedeu-lhe uma medalha a título póstumo.
Sempre solidário
Nos últimos anos da sua vida, Manuel Rodrigues da Silva dedicou-se, com o mesmo empenho de sempre, a tarefas internacionais. A 23 de Abril de 1967, a partir de Moscovo, envia, em nome do PCP, um telegrama à Conferência Internacional de Solidariedade com os Povos sob Dominação Colonial, que se realizava em Conakry. Na missiva, o Partido reafirmava a sua solidariedade e apoio incondicional à luta dos povos sob dominação colonial portuguesa. Sua libertação corresponde aos interesses dos nossos povos em luta contra opressores comuns».
A 8 de Fevereiro de 1968, a Rádio Moscovo, na sua edição para África, transmite uma mensagem gravada pelo dirigente comunista português, onde este saúda os patriotas das colónias portuguesas pela sua luta contra o colonialismo. «Que as nossas vitórias comuns sobre o salazarismo colonialista tornem rápido o advento de uma vida mais digna e mais feliz para os nossos povos irmãos, são os nossos votos mais ardentes no dia de hoje.»
No boletim O Militante de Maio de 1968, um mês antes de falecer, publica-se a sua intervenção no encontro preparatório da conferência de partidos comunistas e operários em Budapeste.