O apostolado social da Igreja
A Igreja confronta-se com um verdadeiro quebra-cabeças. As sociedades do conhecimento mudaram e continuarão a mudar a ritmo acelerado. O mundo católico - monolítico e ancorado no tempo e no espaço – também tem de mudar. Mas como conciliar o imobilismo e a modernidade, as velhas alianças de interesses e a justiça social, a teologia, a tradição, o dogma e a dialéctica? Como mudar conservando a identidade antiga, como é essencial na religião política? Que fazer perante as gravíssimas situações de injustiça causadas pela exploração do homem por parte das forças que se amparam na própria Igreja?
Os teólogos deparam assim com os mesmos becos sem saída por onde vagueiam os tecnocratas em busca de soluções para as crises financeiras. Vencer a crise e salvar o sistema capitalista. Apagar o dogma mas manter a autoridade da doutrina. É por isso que os bispos procuram agora surgir como anjos dos pobres. A doutrina da Igreja passa a ser modelo para a acção filantrópica dos milionários. Darwin já não é herético e o evolucionismo transforma-se num atalho possível para a fé. A Igreja é grande senhora da reconciliação mas mantém posições rígidas quanto ao aborto e ao controlo da natalidade, ao modelo de família, à homossexualidade, à autoridade do papa, ao carácter sobrenatural do milagre, etc., etc.
Como é evidente, nada no fundo mudou. A exclusão social dos trabalhadores é cada vez maior assim como a injusta distribuição da riqueza. Ainda há pucos dias, um dos sobas do grande patronato – Belmiro de Azevedo – fornecia uma receita para o País sair da crise financeira. Primeiro, exportando para África os desempregados portugueses (o argumento era: África precisa de muita mão-de-obra não especializada) em nome do princípio capitalista da mobilidade e da deslocalização do trabalho; depois, desmontando a «heresia» dos horários de trabalho que apenas servem para impedir a competividade das empresas. O trabalhador com um posto de trabalho tem de provar ser digno desse privilégio. Não importa quantas horas diárias trabalha. Serão tantas quanto as necessárias para cumprir a tarefa.
A Igreja ouviu e calou.
O «Fórum» de Belém do Pará
Em Belém do Pará realizou-se, entretanto, um aparatoso «Fórum Social Mundial». Num grandioso cenário que teve a presença não só de cinco chefes de Estado da América Latina mas também de políticos, banqueiros, sociólogos, teólogos da libertação, ONGS e IPSS, economistas, organizações de desenvolvimento e de defesa da vida, etc. O objectivo central do conclave terá consistido nesta ambição: reinventar a sociedade e salvar a utopia. Ou, tal como disse um dos delegados presente no Fórum – Boaventura de Sousa Santos - «há uma necessidade urgente de actuar hoje, porque amanhã pode ser tarde demais ... as utopias constroem-se no concreto». Sendo que «sociedade em construção» será a que liga o homem, a economia e o dinheiro. «Utopia» é necessariamente sonho, engodo e religião.
Ao certo, não se sabe se o fórum terá produzido resultados palpáveis. Houve festas, missas, arraiais e procissões mas à volta, por toda a Terra, o mundo continuou a desabar. O capitalismo prevê, para o ano em curso, 230 milhões de desempregados.
Não cessam de cair os níveis de produção. A fome ameaça multidões. Os bancos e as bolsas continuam com os seus jogos de destruição. As fortunas esmagadoras concentram-se em cada vez menos mãos. Aumentam de número e de montante os grandes escândalos financeiros.
São estes os cenários reais. Por muito que se tente ignorá-los, eles hão-de forçosamente impor-se aos homens e às igrejas. Sem margem para as utopias. Sem que haja colete de salvação que sirva ao capitalismo. Pois que se afunde!...
Os católicos bem poderiam tomar à letra uma regra básica do seu «Compêndio da Doutrina Social» que pela sua importância se transcreve: «Princípio do destino universal dos bens da criação contra a absolutização da propriedade privada e a acumulação da riqueza nas mãos de uma minoria... do direito ao trabalho contra toda a absolutização do capital, do lucro e do triunfo selvagem da tecnologia que torna supérflua a mão do homem.»
Se a acção da Igreja fosse coerente com a sua teoria, todos poderíamos, em conjunto, mudar a face da Terra.
Os teólogos deparam assim com os mesmos becos sem saída por onde vagueiam os tecnocratas em busca de soluções para as crises financeiras. Vencer a crise e salvar o sistema capitalista. Apagar o dogma mas manter a autoridade da doutrina. É por isso que os bispos procuram agora surgir como anjos dos pobres. A doutrina da Igreja passa a ser modelo para a acção filantrópica dos milionários. Darwin já não é herético e o evolucionismo transforma-se num atalho possível para a fé. A Igreja é grande senhora da reconciliação mas mantém posições rígidas quanto ao aborto e ao controlo da natalidade, ao modelo de família, à homossexualidade, à autoridade do papa, ao carácter sobrenatural do milagre, etc., etc.
Como é evidente, nada no fundo mudou. A exclusão social dos trabalhadores é cada vez maior assim como a injusta distribuição da riqueza. Ainda há pucos dias, um dos sobas do grande patronato – Belmiro de Azevedo – fornecia uma receita para o País sair da crise financeira. Primeiro, exportando para África os desempregados portugueses (o argumento era: África precisa de muita mão-de-obra não especializada) em nome do princípio capitalista da mobilidade e da deslocalização do trabalho; depois, desmontando a «heresia» dos horários de trabalho que apenas servem para impedir a competividade das empresas. O trabalhador com um posto de trabalho tem de provar ser digno desse privilégio. Não importa quantas horas diárias trabalha. Serão tantas quanto as necessárias para cumprir a tarefa.
A Igreja ouviu e calou.
O «Fórum» de Belém do Pará
Em Belém do Pará realizou-se, entretanto, um aparatoso «Fórum Social Mundial». Num grandioso cenário que teve a presença não só de cinco chefes de Estado da América Latina mas também de políticos, banqueiros, sociólogos, teólogos da libertação, ONGS e IPSS, economistas, organizações de desenvolvimento e de defesa da vida, etc. O objectivo central do conclave terá consistido nesta ambição: reinventar a sociedade e salvar a utopia. Ou, tal como disse um dos delegados presente no Fórum – Boaventura de Sousa Santos - «há uma necessidade urgente de actuar hoje, porque amanhã pode ser tarde demais ... as utopias constroem-se no concreto». Sendo que «sociedade em construção» será a que liga o homem, a economia e o dinheiro. «Utopia» é necessariamente sonho, engodo e religião.
Ao certo, não se sabe se o fórum terá produzido resultados palpáveis. Houve festas, missas, arraiais e procissões mas à volta, por toda a Terra, o mundo continuou a desabar. O capitalismo prevê, para o ano em curso, 230 milhões de desempregados.
Não cessam de cair os níveis de produção. A fome ameaça multidões. Os bancos e as bolsas continuam com os seus jogos de destruição. As fortunas esmagadoras concentram-se em cada vez menos mãos. Aumentam de número e de montante os grandes escândalos financeiros.
São estes os cenários reais. Por muito que se tente ignorá-los, eles hão-de forçosamente impor-se aos homens e às igrejas. Sem margem para as utopias. Sem que haja colete de salvação que sirva ao capitalismo. Pois que se afunde!...
Os católicos bem poderiam tomar à letra uma regra básica do seu «Compêndio da Doutrina Social» que pela sua importância se transcreve: «Princípio do destino universal dos bens da criação contra a absolutização da propriedade privada e a acumulação da riqueza nas mãos de uma minoria... do direito ao trabalho contra toda a absolutização do capital, do lucro e do triunfo selvagem da tecnologia que torna supérflua a mão do homem.»
Se a acção da Igreja fosse coerente com a sua teoria, todos poderíamos, em conjunto, mudar a face da Terra.