Construtores do Novo Reino

Jorge Messias
O falado Banco Português de Negócios, nacionalizado pelo Estado, vai ser vendido ao Montepio Geral e aos espanhóis do Sabadell, grupos financeiros de há muito ligados aos capitais da Igreja.
Sócrates, por entre a baralhada da sua incomensurável demagogia, informou que o Estado ia lançar uma rede de camas destinadas aos cuidados continuados a idosos, num montante de 860 milhões de euros (pagos pelo Orçamento do Estado) mas em parceria com as ONGS e IPSS todos elas pertencentes à sociedade civil isto é, à Igreja.
Em Espanha, a «Caja de Madrid», também presente em Portugal e considerada uma extensão das ordens religiosas mais ricas, comprou por 149 milhões de euros o Grupo Alimentar SOS. Como a SOS tinha anteriormente adquirido os azeites da UNILEVER e vendido, por 215 milhões à NUTREXPA a conhecida marca «Cuetera», este império das Cajas de Ahorro aumentou enormemente os seus domínios no sector do crédito e do aforro em áreas muito ligadas ao excelente negócio do «combate à pobreza».
Entretanto a crise económica e financeira continua a alastrar e serve de pretexto à extinção de centenas de milhares de postos de trabalho. No entanto o Banesto, outro dos grupos financeiros ligados aos capitais religiosos, registava este ano uma subida de 2% nos seus lucros astronómicos. O Banesto está ligado ao Totta Santander, ao Eng. José Roquete, a Mário Conde e à rede financeira mundial do Vaticano. O crescimento do Banesto em plena crise financeira não é caso único entre as empresas eclesiásticas.
Remando contra a maré, o próprio Vaticano, numa sociedade global em plena crise, revela dispor de uma influência entre as massas cada vez mais fraca e de um peso cada vez maior no mundo dos negócios. A Santa Sé é o principal elo de ligação entre as fortunas cotadas na Bolsa, o Estado e o universo das instituições católicas caritativas. O império do Vaticano tem dimensões impressionantes.
A rede católica mundial é impressionante: 2545 dioceses, 220 000 paróquias, 2300 centros pastorais, 4100 bispos, 255 240 padres diocesanos e 146 139 padres das ordens religiosas, perto de 1 milhão de professores e professoras, 365 000 catequistas e milhares de Ongs, fundações, instituições de desenvolvimento local, hospitais, creches, colégios e universidades, centros assistenciais, etc., controlados ou directamente dirigidos pela hierarquia católica.
A Igreja Católica atribui a si própria três missões principais: ensinar, governar, santificar. Dispõe de recursos financeiros esmagadores. Tem uma presença determinante no mundo político e diplomático. Vemos como todos estes traços coincidem com a imagem do capitalismo. Nos jogos do lucro e do poder, o Vaticano é parceiro insubstituível do grande capital.

De braço dado

Vem a propósito recordar que está em curso uma grande manobra que tem um objectivo ambicioso: aproveitar a crise do capitalismo para o reforçar e fazer crescer.
Os homens da globalização dizem assim: «As crises têm aspectos positivos. São terapêuticas, isto é, permitem localizar os focos de infecção e desenhar uma nova economia e um novo mundo.» E se assim pensam, assim agem. Precisam de encontrar maneira de dar à exploração capitalista um rosto humano que convença as multidões de que alguma coisa mudou para melhor. Como? Jogando, na área social, três trunfos: o Estado desiste de qualquer intervenção no plano dos direitos e deveres sociais e transfere-os para os privados e para a «sociedade civil». Continua a pagar toda a acção social mas a gestão efectiva das instituições é cedida a organizações da Igreja e ao patronato. Um capitalismo novo que ocupe um espaço social vazio. Um novo patronato que figure como condutor dos trabalhadores e dos pobres na defesa dos seus interesses e dos seus direitos. Só assim, pensam os capitalistas, será possível contornar a crise e afastar os riscos de uma agudização da luta de classes. Entretanto, à sombra desta imagem do «bom capitalista», os grupos económicos, tal como agora, continuariam a desenvolver as suas práticas de exploração do homem. Ainda há poucos dias referia um professor universitário católico (Luís Imaginário), a propósito da crise, da educação e do desemprego: «Hoje, a economia não precisa que todos trabalhem, precisa é que todos consumam...».
Não tem limites o cinismo dos capitalistas ditos confessionais mas permanentemente emboscados à espera de novas presas.


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