Desemprego atingiu 569 mil portugueses no 3.º trimestre 2008

Perspectivas para 2009 são preocupantes

Eugénio Rosa
Uma das promessas de Sócrates na campanha eleitoral foi a criação líquida de 150 mil empregos. Mas essa promessa também não será cumprida. É o que se conclui analisando a forma como o emprego, o desemprego, o apoio aos desempregados evoluiu em Portugal no período 2005-2009, utilizando os dados oficiais do INE até 2008 e, para 2009, a previsão da OCDE de Novembro 2008.
O Quadro I, construído com dados oficiais do INE, do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, e com as previsões da OCDE, mostra de uma forma quantificada como o emprego, o desemprego, e o apoio aos desempregados evoluiu em Portugal no período 2005-2009.
Um dos aspectos mais utilizados na propaganda governamental é a criação líquida de 100 mil empregos que já se teria registado no período de Governo de Sócrates. A análise dos dados do INE constantes do Quadro mostra que esse número resulta de uma manipulação feita pelo Governo, que compara trimestres não homólogos. Efectivamente, se se comparar o 3.º trimestre de 2005 com o 3.º trimestre de 2008 – portanto dois trimestres homólogos e, por isso, a comparação tecnicamente mais correcta, pois reduz o efeito da sazonalidade –, o crescimento do emprego liquido é já apenas de 65,8 mil. Por outro lado, e como mostram também os dados do quadro, entre o 2.º trimestre de 2008 e o 3.º trimestre de 2008, verifica-se uma destruição líquida de emprego, pois o emprego neste período diminuiu em 32,3 mil. A continuar esta destruição nos trimestres seguintes, o emprego em 2009 poderá ser mesmo inferior ao emprego em 2005.
No 3.º trimestre de 2008 o desemprego oficial atingiu 433,2 mil, mas o desemprego efectivo ou corrigido, que inclui os «inactivos disponíveis» (desempregados efectivos que por não terem procurado emprego no período em que foi feito o inquérito não foram incluídos no número oficial de desemprego) e o «subemprego visível» (desempregados que fazem pequenos biscates para sobreviver, mas que por esse facto também não são considerados no número oficial de desemprego); repetindo, se adicionarmos ao desemprego oficial os «inactivos disponíveis» e o «subemprego visível» já se obtém 569,1 mil, que é o numero efectivo de desempregados; e a taxa desemprego oficial de 7,7% aumenta para 10,1%, que é a taxa de desemprego efectiva ou corrigida.
Para 2009, tomando como base a previsão da OCDE de Novembro de 2008, o desemprego e a taxa oficial de desemprego devem atingir 477,5 mil e 8,5% respectivamente; enquanto o desemprego e taxa de desemprego efectiva devem alcançar, respectivamente, 617,5 mil e 11%. Uma situação grave sob o ponto de vista social e mesmo económico, pois é riqueza que podia ser criada e pelo facto dos trabalhadores estarem no desemprego não é criada.

É urgente alterar a lei do subsidio de desemprego

Como revelam os dados do Quadro I (coluna 9), enquanto o desemprego aumenta, o número de desempregados a receber subsídio de desemprego tem diminuído. Entre Março de 2005 e Setembro de 2008, o número de desempregados a receber subsídio de desemprego baixou de 317,5 mil para apenas 254,6 mil (-59,9 mil), o que significa que a taxa de cobertura do subsídio de desemprego desceu de 76,9% para 58,7% (-18,2 p.p.) em relação ao desemprego oficial, e de 57,8% para 44,7% (-13,1 p.p.) tomando como base o desemprego efectivo. Esta redução da taxa de cobertura do subsídio de desemprego é uma consequência da aprovação, pelo Governo de Sócrates, do Decreto-Lei 220/2006. Existem, pelo menos, duas disposições nesta lei, que não existiam na lei anterior, que estão a determinar esta situação e que, por isso, devem ser rapidamente alteradas. A primeira, é a que consta no n.º 2 do art.º 23 que dispõe que um trabalhador, no caso de ter sucessivos empregos com duração, cada um deles, inferior a «450 dias de trabalho com o correspondente registo de remunerações num período de 24 meses anteriores à data de desemprego», nunca tem direito ao subsídio de desemprego, mesmo que tenha descontado, nos vários empregos, para a Segurança Social muitos mais dias do que o prazo de garantia (450 dias). A segunda disposição ( o art.º 37.º) reduziu, para milhares de desempregados, entre três e seis meses o período de tempo a que têm direito a receber subsídio de desemprego, porque faz depender a duração do subsídio não só da idade do desempregado (o que existia na lei anterior), mas também do período de descontos para a Segurança Social a contar desde o último período de desemprego em que recebeu subsídio (que não existia na lei anterior).

Desemprego de licenciados aumentou 44%

Durante o Governo de Sócrates, o desemprego tem aumentado mais nos grupos populacionais com níveis de escolaridade mais elevada, como revelam os dados do INE constantes do Quadro II.
Entre o 2.º trimestre de 2005 e o 2.º trimestre de 2008, o desemprego oficial aumentou 2,6%, o desemprego com nível de escolaridade até ao ensino básico ou menos diminuiu -4%, mas o desemprego com ensino secundário cresceu em 10,7%, e o desemprego com ensino superior aumentou em 53,1%. No 3.º trimestre de 2008, relativamente ao trimestre anterior, o desemprego oficial cresceu 5,6%, mas o desemprego de licenciados aumentou em 44,3%. Esta evolução verificada no período 2005-2008 revela que o emprego criado pela economia portuguesa é fundamentalmente o da baixa escolaridade, pois o desemprego de escolaridade mais elevada tem aumentado fortemente enquanto o de baixa escolaridade tem descido, o que põe em causa uma das «verdades» da propaganda oficial sobre a alteração do perfil produtivo.

Menos 200 milhões de euros no apoio aos desempregados

Apesar de todas as previsões apontarem para um aumento significativo do desemprego em Portugal em 2009, o valor orçamentado para pagamento de subsídios de desemprego é inferior ao do orçamentado em 2008, como revelam os dados da Segurança Social, constantes do Quadro III.
A partir da publicação do Decreto-Lei 220/2006 pelo Governo de Sócrates, que alterou a legislação sobre o subsídio de desemprego, tem-se verificado uma redução significativa quer do orçamentado quer do gasto com o subsídio de desemprego. Assim, em relação ao orçamentado, a despesa prevista com o subsídio de desemprego para 2008 é inferior à prevista para 2007 em quase 200 milhões de euros. E o efectivamente gasto é inferior ao previsto e tem diminuído de uma forma continua. Por ex., o valor do gasto em 2008 corresponde a cerca de 85,6% do orçamentado para este ano.
E para 2009, apesar de se prever um aumento do desemprego, o orçamentado para pagar subsídios de desemprego é inferior ao valor de 2008 em cerca de 200 milhões de euros, pois baixa de 1779 milhões de euros em 2008 para 1578 milhões euros em 2009. Como consequência, se esta situação não for alterada, com o aumento do desemprego, a miséria entre os desempregados ainda vai aumentar mais.

Emprego criado em 2005-2008 foi fundamentalmente precário

O emprego criado no período 2005-2008, por um lado, é emprego volátil pois é facilmente destruído como aconteceu no 3.º trimestre de 2008, e, por outro lado, é fundamentalmente emprego precário como mostra os dados do INE constantes do Quadro IV.
No período 2005 a 2008, o que aumentou mais foram os trabalhadores contratados a prazo. Entre o 1.º trimestre de 2005 e o 1.º trimestre de 2008, o emprego aumentou 1,9% (+96,6 mil), mas o número de trabalhadores contratados a termo cresceu 27,2% (+153,4 mil), portanto muito mais. Se a comparação for feita entre o 3.º trimestre de 2005 e o 3.º trimestre de 2008, o crescimento do emprego é de 1,2% (+65,8 mil), enquanto o aumento dos trabalhadores contratados a prazo é de 23,1% (+137 mil).
Se definirmos como precários os trabalhadores contratados a prazo, mais os que estão inscritos na rubrica «outros», mais os «trabalhadores por conta própria como isolados» (muitos deles «falsos recibos verdes»), obtém-se, para 1.º trimestre de 2005, 1662 mil; para o 1.º trimestre de 2008, 1811,8 mil; e para o 3.º trimestre de 2008, 1818,3 mil. Em percentagem da população empregada, o grupo de trabalhadores precários tem tido um crescimento rápido nos 4 anos de Governo de Sócrates: 31,8% no 1.º trimestre de 2005; 34,9% no 1.º trimestre de 2008; e 35% da população empregada no 3.º trimestre de 2008. Em resumo, o pouco emprego que se criou neste período foi fundamentalmente emprego precário.
As alterações ao Código do Trabalho propostas pelo Governo de Sócrates e aprovadas em Novembro de 2008 pelo PS na Assembleia da República vão ainda agravar mais esta situação. Para concluir isso, basta recordar o seguinte. De acordo com essas alterações, o período experimental é alargado para 6 meses, o que vai levar à substituição de todos os contratos a prazo até 6 meses pela colocação dos trabalhadores em «período experimental», o que permite à entidade patronal despedir o trabalhador quando quiser, sem qualquer justificação, e sem ter de pagar qualquer indemnização (actualmente paga o corresponde a 3 dias de remuneração por cada mês de trabalho); são criados os chamados «contratos intermitentes» em que a entidade patronal é obrigada apenas a garantir trabalho ao trabalhador 6 meses por ano; vão ser legalizados os «falsos recibos verdes» através do pagamento de 5% para a Segurança Social pelas entidades patronais; etc., etc.. E a fiscalização mesmo do Código do Trabalho desta natureza, que é sistematicamente violado pelas entidades patronais, não vai melhorar, pois o número de inspectores de trabalho que existe actualmente é o mesmo que existia quando este Governo entrou em funções em 2005 (260 segundo declarações do ministro de Trabalho na Assembleia da República em 17.11.2008), o que é metade do que precisa a Inspecção Geral do Trabalho, agora chamada «Alta Autoridade para as Condições do Trabalho», para poder fiscalizar o cumprimento das leis.


Mais artigos de: Temas

Os dois lados da eleição de Barack Obama como presidente dos EUA

A eleição de Barack Obama como presidente dos Estados Unidos significa a continuação das políticas pro-imperialista e pro-capitalista a nível externo e doméstico. A eleição de um afro-americano como presidente dos EUA representa um progresso nos Estados Unidos e uma oportunidade para o avanço das lutas dos trabalhadores e dos pobres. Ambas as afirmações são verdadeiras. As duas asserções contradizem-se, mas não se anulam. Coexistem. São contraditórias porque a campanha de Obama e a sua eleição são acontecimentos contraditórios.

A cortina de fumo do regime*

As perdas demográficas na Ucrânia dos nossos dias ultrapassam várias vezes a mortalidade causada pela fome de 1932-1933, mas sobre isto o governo cala-se. Porquê? A resposta a esta pergunta foi-nos dada por reputados cientistas ucranianos no decorrer de uma «mesa redonda» promovida pelo Partido Comunista da Ucrânia.

Pirataria e imperialismo

A ONU autorizou as missões que EUA e a UE enviaram para o Golfo do Aden. A cobertura é o combate à pirataria na costa marítima da Somália, mas os objectivos de fundo vão bem mais longe.