Usos e costumes da Madeira
Perdoar-se-me-á que não recorde o nome do deputado à Assembleia Regional da Madeira que protagonizou O Caso da Bandeira Nazi, mas asseguro desde já que o esquecimento decorre de insuficiência da memória, não de menor respeito e consideração pelo senhor deputado. Felizmente, de resto, não há que enganar: o deputado é aquele, o do PND, Partido da Nova Democracia, que não tem outro nem na Madeira nem em qualquer outro recanto do território nacional, pelo que bem se pode dizer que se trata de uma especificidade regional. Posto isto, passemos ao caso que decerto quase todos conhecem embora, receio-o, não apenas muito pela rama, o que sempre envolve alguns perigos, mas porventura também de forma distorcida, o que é pior. Recapitulemos, pois, até ao momento em que o senhor deputado, provavelmente farto das abundantes e multifacetadas arbitrariedades impostas pela vontade soberana do presidente Jardim e pela gente do PSD, decidiu compará-los ao velho poder nazi e consubstanciar essa alegada similitude na entrega ao presidente da Mesa da Assembleia de uma bandeira nazi. Foi, manifestamente, um grande exagero e portanto uma injustiça: é bem sabido que na Madeira não existe ainda um campo de concentração onde sejam recolhidos os opositores ao dr. Alberto João e que mesmo em matéria de vias de facto há já vários anos que não é ultrapassada a fase das ameaças. Mas não parece que seja impossível compreender a excessiva iniciativa do deputado do PND, salientando-se que compreender não equivale aqui a aprovar: a sucessão de muitas situações indignantes leva por vezes a que se perca a cabeça e o PND madeirense já durante a última campanha eleitoral deu claros sinais de querer usar a originalidade como factor compensatório de uma fraca implantação. Aliás, como tristemente se sabe, a originalidade é a imagem de marca da vida democrática na Madeira.
A retaguarda
De facto, no momento em que escrevo, passado já o fim-de-semana, é presumível que o Parlamento local continue suspenso, isto é, que a legalidade democrática continue entre as urtigas para onde foi lançada pelo numericamente esmagador grupo parlamentar social-democrata.
Já terá passado a fase em que o deputado PND era impedido de entrar no edifício da Assembleia Regional pela força física de «gorilas» privados ou de agentes da PSP, aspecto que não está bem apurado mas que para o deputado resultava de qualquer modo na violação dos seus direitos básicos. Entretanto, uma curta e discreta comunicação da Presidência da República informou o País de que o presidente Cavaco estava «a acompanhar o assunto», mas quanto a isso terá havido um qualquer equívoco: é que os funerais é que costumam ser «acompanhados», ao passo que a brutalização dos direitos democráticos fundamentais são para ser rapidamente punidos. Aqui, porém, interessa muito especialmente referir o que perante o caso fez a televisão, isto é, como informou os cidadãos portugueses do que se passara no Funchal. E é forçoso registar que não fez muito e sobretudo que fez mal. Numa fase inicial que se foi repetindo ao longo de diversos telenoticiários, a tónica da notícia situou-se no facto de uma bandeira nazi ter sido mostrada no Parlamento regional, chegando-se a dizer que ela foi «desfraldada» ou «exibida» pelo deputado PND e remetendo-se para um segundo plano informativo o significado acusatório que o gesto tivera para com o PSD. Sabendo-se bem que uma grande parte dos telespectadores, se não a sua maioria, é distraída, e sabendo-se também que as estações sabem disso, percebe-se que muitos telespectadores tenham ficado convencidos de que no Funchal ocorrera um acto de propaganda nazi da responsabilidade do PND e percebe-se também que, no mínimo, os telenoticiários pouco ou nada fizeram para que assim não fosse. Posteriormente, aconteceu que vários comentadores, politólogos ou equiparados, repartiram igualmente pelo deputado do PND e pelo poder PSD a responsabilidade pelo ocorrido, isto é, igualizaram um excesso argumentativo de gosto duvidoso com a frontal violação da legalidade, a paralisia do funcionamento das instituições democráticas e a óbvia arrogância no desprezo pelas leis da República. Isto é: uns e outros, TV e opinion makers, quiseram dividir ao meio o que não podia ser dividido assim. Com uma retaguarda destas, os peculiares usos e costumes da vida política madeirense podem prosseguir sem sobressaltos.
A retaguarda
De facto, no momento em que escrevo, passado já o fim-de-semana, é presumível que o Parlamento local continue suspenso, isto é, que a legalidade democrática continue entre as urtigas para onde foi lançada pelo numericamente esmagador grupo parlamentar social-democrata.
Já terá passado a fase em que o deputado PND era impedido de entrar no edifício da Assembleia Regional pela força física de «gorilas» privados ou de agentes da PSP, aspecto que não está bem apurado mas que para o deputado resultava de qualquer modo na violação dos seus direitos básicos. Entretanto, uma curta e discreta comunicação da Presidência da República informou o País de que o presidente Cavaco estava «a acompanhar o assunto», mas quanto a isso terá havido um qualquer equívoco: é que os funerais é que costumam ser «acompanhados», ao passo que a brutalização dos direitos democráticos fundamentais são para ser rapidamente punidos. Aqui, porém, interessa muito especialmente referir o que perante o caso fez a televisão, isto é, como informou os cidadãos portugueses do que se passara no Funchal. E é forçoso registar que não fez muito e sobretudo que fez mal. Numa fase inicial que se foi repetindo ao longo de diversos telenoticiários, a tónica da notícia situou-se no facto de uma bandeira nazi ter sido mostrada no Parlamento regional, chegando-se a dizer que ela foi «desfraldada» ou «exibida» pelo deputado PND e remetendo-se para um segundo plano informativo o significado acusatório que o gesto tivera para com o PSD. Sabendo-se bem que uma grande parte dos telespectadores, se não a sua maioria, é distraída, e sabendo-se também que as estações sabem disso, percebe-se que muitos telespectadores tenham ficado convencidos de que no Funchal ocorrera um acto de propaganda nazi da responsabilidade do PND e percebe-se também que, no mínimo, os telenoticiários pouco ou nada fizeram para que assim não fosse. Posteriormente, aconteceu que vários comentadores, politólogos ou equiparados, repartiram igualmente pelo deputado do PND e pelo poder PSD a responsabilidade pelo ocorrido, isto é, igualizaram um excesso argumentativo de gosto duvidoso com a frontal violação da legalidade, a paralisia do funcionamento das instituições democráticas e a óbvia arrogância no desprezo pelas leis da República. Isto é: uns e outros, TV e opinion makers, quiseram dividir ao meio o que não podia ser dividido assim. Com uma retaguarda destas, os peculiares usos e costumes da vida política madeirense podem prosseguir sem sobressaltos.