A «ajuda» do ministro
No percurso da Fertagus, comprova-se que a política dominante prefere o capital privado. Com governos do PSD ou do PS, decisões políticas conduziram à actual situação, em que os utentes pagam os bilhetes mais caros, o Estado paga indemnizações compensatórias mais elevadas e os trabalhadores recebem menos e têm menos direitos.
Os preços podem aumentar até mais 5 por cento que a média
A mais recente «ajuda» política, não sendo certamente a mais importante, prolonga até ao presente o que se tem visto desde a concessão da exploração do «comboio da Ponte».
No âmbito da Concertação Social, esteve em discussão, em Maio, a hipótese de accionar a arbitragem obrigatória na Fertagus. José Manuel Oliveira lembra que o ministro do Trabalho defendeu então que não se recorresse já a esse mecanismo, porque ele próprio iria tentar sensibilizar a administração para a necessidade de acordar um instrumento de regulamentação colectiva de trabalho. O que não se vê, até agora, é qualquer resultado positivo dessa prometida diligência.
A promessa do ministro acabou por ser mais um favor do Governo à Fertagus, pois só veio retardar o processo, comenta Eduardo Vieira. Uma resposta da Fertagus foi dada ao SNTSF, há alguns dias, quando a empresa declarou não querer negociar contratação colectiva e preferir relações de trabalho individualizadas...
A CP afastada
A forma como a Fertagus conseguiu o contrato de concessão para o transporte de passageiros na travessia ferroviária do Tejo, que explora desde Julho de 1999, foi recordada pelo coordenador do SNTSF/CGTP-IN. Esta era uma concessão da CP, desde os anos 80, e foi nesse quadro que a ferroviária pública avançou com todo o concurso para a construção das infraestruturas. Por imposição política, a CP ficou impedida de concorrer à exploração comercial e foi obrigada a lançar um concurso internacional para a sub-concessão, ganho pela Fertagus. De seguida, por lei, a sub-concessão foi transformada em concessão.
«O primeiro contrato de concessão era um contrato leonino, a Fertagus estava sempre a ganhar». O dirigente sindical comunista refere, a título de exemplo, que ficou estabelecido um determinado número de passageiros e, se esse limite fosse ultrapassado, a empresa pagaria um certo montante ao Estado; mas, caso o número de passageiros não fosse alcançado, o Estado pagaria uma indemnização à Fertagus. Sucede que o número de comboios em circulação não chegava para alcançar esse limite, ou seja, era impossível a Fertagus vir a ter que pagar alguma verba ao Estado.
Em Abril de 2005, após um processo de renegociação, desencadeado ainda em 2001-2002 «com o objectivo de continuar a dar dinheiro à Fertagus», foi publicado o decreto-lei (DL 78/2005) com os novos termos da concessão.
Uma apreciação desta renegociação e do seu resultado foi feita pelo Tribunal de Contas, numa auditoria que analisou o período decorrido desde 2002. No relatório dessa auditoria, fazendo o balanço do resultado final da renegociação, entre os aspectos negativos, surge a «liberdade tarifária», ou seja, a Fertagus «pode aumentar, anualmente, as tarifas aos consumidores dentro de um intervalo de 5 por cento real, inferior ou superior, relativamente à Base Tarifária Média dos doze meses anteriores». Isto, quando já pratica os preços mais elevados.
Ficou definido um quadro de compensação pela prestação do serviço público que, entre 2005 e 2010, é de 57 milhões de euros. Isto significa que a Fertagus, por um percurso de 54 quilómetros, entre Lisboa e Setúbal, recebe do Estado uma indemnização compensatória igual ou até superior à que recebe a CP por assegurar um serviço social a nível nacional.
«Uma empresa privada, a pretexto de que presta um serviço público, pratica preços mais elevados, não se integra no sistema de passe social, fica com a liberdade de aumentar o preço dos bilhetes acima da média tarifária, e ainda recebe do erário público uma indemnização superior àquilo que muitas vezes é atribuído à CP», sintetiza José Manuel Oliveira, notando que «com este novo contrato, a Fertagus passa a receber "à cabeça", independentemente dos resultados a apresentar». Enfim, «mais uma vez, temos o Estado a favorecer e a dar dinheiro às empresas privadas».
Concorrência às urtigas
Houve uma clara violação das regras por aqueles que, no poder, as definem e defendem, acusa Eduardo Vieira. «Atacaram as empresas públicas, defendendo a livre concorrência, e defendem que o Estado deve sempre escolher a melhor oferta, mas, neste caso, com governos do PSD ou do PS, o poder político encontrou mecanismos para proibir a CP, empresa pública, de concorrer no Eixo Ferroviário Norte-Sul e oferecer aos utentes um serviço mais barato e melhor, garantindo assim a abertura do sector ferroviário aos privados», refere o dirigente comunista, apontando os resultados visíveis: «O serviço da Fertagus não tem diferenças substanciais, face àquele que é prestado pela CP nas restantes concessões, mas os trabalhadores recebem menos e têm menos direitos, os utentes pagam mais e o Estado também paga mais do que paga à CP ou ao Metropolitano».
Para idênticas distâncias, com o mesmo tipo de comboios, um utente do transporte público ferroviário paga na Fertagus, em média por quilómetro, sensivelmente o dobro do que paga na CP, na Linha de Cintura, entre Castanheira e Alcântara.
Há falta de ligação entre as estações e o local de residência, fora das horas de maior tráfego. Muitos utentes (mais de um terço, segundo estimativas da própria Fertagus) são assim forçados a levar o carro até ao parque de estacionamento, na estação, que também é pago. Toda a rede ferroviária (e suas infraestruturas) é pública. Mas a receita dos parques de estacionamento não reverte para o dono da infraestrutura, o serviço ferroviário nacional, e sim para o operador, que não tem encargos.
Os autocarros que operam na Margem Sul com a marca Sulfertagus, fazendo a ligação às estações da Fertagus, são da Transportes Sul do Tejo, empresa integrada no grupo Arriva, que tem uma participação de mais de 30 por cento no capital do grupo Barraqueiro... que é dono da Fertagus.
Passar, do grupo Barraqueiro para a Arriva, a titularidade da TST, em 2002 e 2003, poderá ter sido «apenas uma forma de contornar um problema que o PCP desde sempre vem levantando», admite Eduardo Vieira, remetendo para o facto de que a privatização dos transportes públicos na Área Metropolitana de Lisboa e, em particular, na Península de Setúbal, levou a uma concentração monopolista.
O comboio ligeiro da Margem Sul, o Metro Sul do Tejo, está igualmente concessionado ao grupo Barraqueiro - e voltam a colocar-se os mesmos problemas.
No âmbito da Concertação Social, esteve em discussão, em Maio, a hipótese de accionar a arbitragem obrigatória na Fertagus. José Manuel Oliveira lembra que o ministro do Trabalho defendeu então que não se recorresse já a esse mecanismo, porque ele próprio iria tentar sensibilizar a administração para a necessidade de acordar um instrumento de regulamentação colectiva de trabalho. O que não se vê, até agora, é qualquer resultado positivo dessa prometida diligência.
A promessa do ministro acabou por ser mais um favor do Governo à Fertagus, pois só veio retardar o processo, comenta Eduardo Vieira. Uma resposta da Fertagus foi dada ao SNTSF, há alguns dias, quando a empresa declarou não querer negociar contratação colectiva e preferir relações de trabalho individualizadas...
A CP afastada
A forma como a Fertagus conseguiu o contrato de concessão para o transporte de passageiros na travessia ferroviária do Tejo, que explora desde Julho de 1999, foi recordada pelo coordenador do SNTSF/CGTP-IN. Esta era uma concessão da CP, desde os anos 80, e foi nesse quadro que a ferroviária pública avançou com todo o concurso para a construção das infraestruturas. Por imposição política, a CP ficou impedida de concorrer à exploração comercial e foi obrigada a lançar um concurso internacional para a sub-concessão, ganho pela Fertagus. De seguida, por lei, a sub-concessão foi transformada em concessão.
«O primeiro contrato de concessão era um contrato leonino, a Fertagus estava sempre a ganhar». O dirigente sindical comunista refere, a título de exemplo, que ficou estabelecido um determinado número de passageiros e, se esse limite fosse ultrapassado, a empresa pagaria um certo montante ao Estado; mas, caso o número de passageiros não fosse alcançado, o Estado pagaria uma indemnização à Fertagus. Sucede que o número de comboios em circulação não chegava para alcançar esse limite, ou seja, era impossível a Fertagus vir a ter que pagar alguma verba ao Estado.
Em Abril de 2005, após um processo de renegociação, desencadeado ainda em 2001-2002 «com o objectivo de continuar a dar dinheiro à Fertagus», foi publicado o decreto-lei (DL 78/2005) com os novos termos da concessão.
Uma apreciação desta renegociação e do seu resultado foi feita pelo Tribunal de Contas, numa auditoria que analisou o período decorrido desde 2002. No relatório dessa auditoria, fazendo o balanço do resultado final da renegociação, entre os aspectos negativos, surge a «liberdade tarifária», ou seja, a Fertagus «pode aumentar, anualmente, as tarifas aos consumidores dentro de um intervalo de 5 por cento real, inferior ou superior, relativamente à Base Tarifária Média dos doze meses anteriores». Isto, quando já pratica os preços mais elevados.
Ficou definido um quadro de compensação pela prestação do serviço público que, entre 2005 e 2010, é de 57 milhões de euros. Isto significa que a Fertagus, por um percurso de 54 quilómetros, entre Lisboa e Setúbal, recebe do Estado uma indemnização compensatória igual ou até superior à que recebe a CP por assegurar um serviço social a nível nacional.
«Uma empresa privada, a pretexto de que presta um serviço público, pratica preços mais elevados, não se integra no sistema de passe social, fica com a liberdade de aumentar o preço dos bilhetes acima da média tarifária, e ainda recebe do erário público uma indemnização superior àquilo que muitas vezes é atribuído à CP», sintetiza José Manuel Oliveira, notando que «com este novo contrato, a Fertagus passa a receber "à cabeça", independentemente dos resultados a apresentar». Enfim, «mais uma vez, temos o Estado a favorecer e a dar dinheiro às empresas privadas».
Concorrência às urtigas
Houve uma clara violação das regras por aqueles que, no poder, as definem e defendem, acusa Eduardo Vieira. «Atacaram as empresas públicas, defendendo a livre concorrência, e defendem que o Estado deve sempre escolher a melhor oferta, mas, neste caso, com governos do PSD ou do PS, o poder político encontrou mecanismos para proibir a CP, empresa pública, de concorrer no Eixo Ferroviário Norte-Sul e oferecer aos utentes um serviço mais barato e melhor, garantindo assim a abertura do sector ferroviário aos privados», refere o dirigente comunista, apontando os resultados visíveis: «O serviço da Fertagus não tem diferenças substanciais, face àquele que é prestado pela CP nas restantes concessões, mas os trabalhadores recebem menos e têm menos direitos, os utentes pagam mais e o Estado também paga mais do que paga à CP ou ao Metropolitano».
Para idênticas distâncias, com o mesmo tipo de comboios, um utente do transporte público ferroviário paga na Fertagus, em média por quilómetro, sensivelmente o dobro do que paga na CP, na Linha de Cintura, entre Castanheira e Alcântara.
Há falta de ligação entre as estações e o local de residência, fora das horas de maior tráfego. Muitos utentes (mais de um terço, segundo estimativas da própria Fertagus) são assim forçados a levar o carro até ao parque de estacionamento, na estação, que também é pago. Toda a rede ferroviária (e suas infraestruturas) é pública. Mas a receita dos parques de estacionamento não reverte para o dono da infraestrutura, o serviço ferroviário nacional, e sim para o operador, que não tem encargos.
Os autocarros que operam na Margem Sul com a marca Sulfertagus, fazendo a ligação às estações da Fertagus, são da Transportes Sul do Tejo, empresa integrada no grupo Arriva, que tem uma participação de mais de 30 por cento no capital do grupo Barraqueiro... que é dono da Fertagus.
Passar, do grupo Barraqueiro para a Arriva, a titularidade da TST, em 2002 e 2003, poderá ter sido «apenas uma forma de contornar um problema que o PCP desde sempre vem levantando», admite Eduardo Vieira, remetendo para o facto de que a privatização dos transportes públicos na Área Metropolitana de Lisboa e, em particular, na Península de Setúbal, levou a uma concentração monopolista.
O comboio ligeiro da Margem Sul, o Metro Sul do Tejo, está igualmente concessionado ao grupo Barraqueiro - e voltam a colocar-se os mesmos problemas.