Paraguai, país estratégico

Isabel Branco
Sem costa marítima, com saída para o mar apenas por via fluvial e dependendo da passagem por território argentino, o Paraguai é considerado um país estratégico pela sua localização sobre parte das ricas jazidas de água do Sistema Aquífero Guaraní e por estar perto da região da Bolívia rica em combustíveis fósseis.
Como assinalam Ana Esther Ceceña e Carlos Ernesto Motto no seu artigo «Paraguay: eje de la dominación del Cono Sur», a posição geográfica do país permite-lhe ter influência nas grandes barragens de Itaipú (a maior do mundo) e de Yacyretá, «mantendo uma importância estratégica sobre a Argentina pela direcção do fluxo aquífero, e sobre o Brasil pela importância de Itaipú no fornecimento interno de electricidade».
Estas formações subterrâneas de água têm uma importância estratégica e económica muito grande a nível mundial, a ponto do Banco Mundial estar a impulsionar legislação especial internacional sobre recursos transfronteiriços.
Este interesse sobre o acesso e controlo dos recursos indicia a sua importância, mas igualmente o perigo que o Paraguai corre, especialmente em relação à sua soberania, utilização e usufruto dos seus próprios recursos e respectivos benefícios.
A posição geográfica paraguaia sempre interessou aos Estados Unidos, país que inclusivamente manteve estreitas relações com a sangrenta ditadura de Stroessener. Além de pretender ter acesso aos recursos naturais do país, os EUA pretendem manter as bases militares que aí instalaram, as quais servem como centro de operações na zona e como pressão contra qualquer projecto regional alternativo à ALCA que seja desenvolvido pelos dois gigantes vizinhos, a Argentina e o Brasil.
Nos últimos anos foram assinados novos acordos entre o Paraguai e os Estados Unidos e o governo de Assunção aprovou, em 2005, uma lei «antiterrorista». Ceceña e Motto recordam que «a luta antiterrorista, particularmente dura no Sul da América Latina, tem sido uma política cíclica do capitalismo que procura manter na prática o que dificilmente pode ser legitimado, e que, em épocas ainda não completamente ultrapassadas, concretizou-se no tenebroso Plano Condor».
Não será por acaso que os exercícios militares conjuntos incluem o «conhecimento do terreno e da idiossincrasia social, com códigos partilhados e normas de trabalho conjuntas bem estabelecidas», tal como «simulacros de recuperação de centrais petrolíferas tomadas por trabalhadores, de sofocamento de insurreições populares, de controlo de vias de comunicação, de controlo de passagens transfronteiriças; trabalhos de logística, de operação directa, de espionagem... Ou seja, preparação para a guerra interna, ou para «repelir um ataque de uma potência estrangeira», como comentam os autores.

A posição do novo presidente

Fernando Lugo, o presidente eleito em meados de Abril, pôs fim a seis décadas de poder único e hegemónico no Paraguai. A sua eleição tem consequências internas, mas também externas. Por um lado, torna-se mais difícil para os EUA manter as suas bases militares no país. Por outro lado, as relações energéticas com os países vizinhos estão a sofrer pressões por parte do novo governo.
Já antes do escrutínio, Fernando Lugo introduziu o tema energético. Num artigo publicado na edição de 2 de Abril da Folha de São Paulo, Lugo recorda que a acta da Foz de Iguaçú (de 1966), ratificada por Brasília, prevê que o Paraguai deve receber um «preço justo» pela energia que exporta.
«Quando foi assinado o Tratado de Itaipú (em 1973), o petróleo custava pouco mais de 2 dólares por barril. Hoje, o seu preço está em torno de 100 dólares por barril. O Paraguai recebe hoje pela sua energia muito menos, em termos reais, que em 1973. Hoje podemos comprar muito menos petróleo que há 35 anos. E consta que, naquele ano, toda a opinião pública paraguaia viu como irrisórios os lucros fixados no Tratado. Não pretendemos cobrar o que não nos pertence», sublinhou Lugo.
Como afirmava o então candidato, dias depois na Brasil de Fato, «os Tratados de Itaipú e Yacyretá são Tratados leoninos, injustos, que quase não beneficiam o Paraguai. Vamos exigir uma renegociação para dispor livremente dos nossos excedentes hidroeléctricos e receber um preço justo por eles».
Já depois da eleição, em declarações à Lusa, Fernando Lugo acusou a Argentina e o Brasil de explorar o seu país: «Somos um dos maiores produtores de energia eléctrica do mundo e por isso mesmo vamos renegociar os contratos. Não podemos continuar a ser explorados economicamente por países que têm governos de esquerda e que dizem estar a lutar por uma América Latina mais próspera e democrática».


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