Joel Serrão, um bom antifascistas

Morais e Castro
Verão de 1955. Tinha acabado os exames do 5.º ano (hoje o 9.º) e queria matricular-me nas disciplinas da alínea e) do 6.º ano (hoje o 10.º) que davam acesso ao curso de Direito. Mas tive logo um desgosto e fiquei danado, no Liceu Pedro Nunes, onde eu cursava do 1.º ao 5.º ano, não tinha alinea e) no 6.º ano. Tive então que matricular-me no 6.º ano de Letras, alínea e) no Liceu Passos Manuel que, para além de ficar mais longe, obrigava-me a abandonar a maioria dos colegas e amigos de cinco anos de escola.
Mas estava enganado. No Liceu Passos Manuel o regime, sob a reitoria do Dr. Guerreiro Murta, era muito mais democrático que o do Liceu Pedro Nunes, sob reitoria de João Xavier Lobo (o homem, a mulher, o santo e a fera) que nas marchas e paradas de Instrução da Mocidade Portuguesa nos fazia a saudação fascista.
No Passos Manuel podíamos jogar à bola quando faltavam os professores ou nos intervalos das aulas. No Pedro Nunes não. No Passos Manuel os alunos do 3.º ciclo podiam fumar no hall de entrada sem virem para a rua. No Pedro Nunes não. Até parece que já tinha saído a porcaria da actual Lei do Tabaco.
Mas vamos ao que interessa sobre a minha ida para o Liceu Passos Manuel. Faleceu, recentemente, Joel Serrão, homem que tive a honra e a felicidade de ter como professor de filosofia no 6.º e no 7.º ano (hoje 9.º e 10.º) no Liceu Passos Manuel, tendo ficado amigos para o resto da vida. Só tive conhecimento do seu falecimento após o seu funeral pelo que não pude, como devia, associar-me às respectivas cerimónias. Para lá de excelente professor, era um belo conversador e muito me ensinou durante as viagens de eléctrico entre a Rua da Conceição aos Prazeres, transporte que tomava para ir e vir para o Liceu Passos Manuel.
Ali, tive ainda a honra de conhecer o nosso camarada Orlando Costa, vizinho e amigo de Joel Serrão. Muito aprendi com eles. No início do 7.º ano (hoje 10.º) Joel Serrão anunciou à minha turma que fora publicado, em português, um manual de filosofia, do ilustre camarada José Magalhães Vilhena - nessa época professor e residente em França, que só tive ocasião de conhecer depois do 25 de Abril – e que o íamos adoptar.
Passados poucos dias o Padre Queiroz, o nosso professor de Religião e Moral, que passava a vida a dar-nos cabo da cabeça para que casássemos virgens, jesuíta, conservador, direi mesmo reaccionário, director espiritual de altas figuras da sociedade, veio na aula fazer um discurso tenebroso contra Joel Serrão por ter adoptado, segundo ele, um manual de fisosofia escrito por um comunista. E, dizia ele, tanto era assim, que o dito manual tinha muitas páginas sobre a metedologia ciêntifica e só quatro páginas sobre a teodisseia. Era verdade sim senhor, e ainda bem.
Passado pouco tempo, o reitor Dr. Guerreiro Murta veio à nossa sala dizer-nos que o Padre Queiroz não tinha nada que se pronunciar sobre a adopção daquele manual por Joel Serrão, que era dono e senhor de o fazer como entendesse e que para a manual pelo qual devíamos estudar.
Havia fascismo, mas também havia muitos e bons antifascistas e Joel Serrão era um deles.


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