Um papel indispensável do Estado

Controlo do sector energético

Rui Namorado Rosa
A energia constitui um factor de produção insubstituível e de solicitação permanente, com valor determinante dos pontos de vista económico, social e ambiental. Todas as actividades humanas dependem da sua disponibilidade oportuna e suficiente.
Uma questão maior que se coloca ao desenvolvimento do nosso País é a sua acentuada dependência energética, que significa uma preocupante vulnerabilidade, em termos de i) segurança do abastecimento, ii) impacto sobre a balança de transacções correntes, iii) impactos do seu custo como factor de produção na economia e no funcionamento da sociedade. Mais grave ainda é esta dependência estar focalizada no petróleo, cujos derivados representam 60 % do consumo final de energia em Portugal, quando o mundo entrou já numa crise energética estrutural que constrange a sua acessibilidade.
O País tem de gerir criteriosamente o difícil quadro de aprovisionamento externo, bem como reconhecer de facto os recursos energéticos endógenos, dominar as tecnologias para a sua valorização, e optimizar os diversos tipos de consumos, com vista a propiciar uma dependência nacional significativamente menor nesta área tão estratégica quanto essencial para o desenvolvimento.
Relativamente às fontes de energia primária, quanto ao carvão, petróleo e gás natural, há que continuar os esforços da sua prospecção, sobretudo de hidrocarbonetos no offshore, sem esquecer também as significativas reservas de urânio ainda existentes, que poderão constituir uma base para o desenvolvimento de um futuro programa nuclear.
No entretanto, teremos de assumir uma política activa de aprovisionamento externo de combustíveis fósseis, procurando contratações de aprovisionamento a prazo e estáveis, em condições mutuamente vantajosas, incorporando oportunidades de participação de capital e tecnologia nacionais em tais contractos.
Mas será também nos fluxos endógenos de energias renováveis que poderemos encontrar mais abundantes mananciais de energia primária, com destaque para a hídrica, a solar, a biomassa, a eólica, a oceânica e a geotérmica. As energias renováveis oferecem oportunidades de produção centralizada em grande escala, que podem contribuir para alimentar a rede energética nacional, mas também, e sobretudo, de produção em pequena escala e descentralizada, para muitos pequenos consumidores potencialmente autónomos.
Se os recursos são escassos, devemos optimizar a sua utilização. Assim, outra opção fundamental é a efectiva orientação no sentido da poupança do que é dispensável ou inútil, e da utilização muito mais eficiente de energia.

É necessária outra política

Nos transportes, há que inverter a dominância suicida do uso de transporte individual rodoviário, face ao transporte colectivo, o que implica privilegiar decididamente os transportes colectivos, mormente sobre carris, visando mais elevada eficiência energética e menor dependência face aos combustíveis fósseis, a par das exigências de ordenamento urbanístico e territorial que se colocam.
No sector edificado, incluindo o habitacional mas também de comércio e serviços, existe ampla margem para redução dos consumos de energia associados ao conforto térmico, à iluminação e outras funcionalidades, visando a adopção generalizada de conceitos e de técnicas tendencialmente conducentes a edifícios energeticamente autónomos. Conceitos de arquitectura bioclimática e técnicas de microgeração permitem caminhar nesse sentido.
Na indústria, a análise energética e a integração de processos, a cogeração e a trigeração, entre outras soluções técnicas, oferecem oportunidades para melhoramento da eficiência energética e a redução dos consumos.
Porém, para que as transformações necessárias nos vários sectores de utilização final de energia se concretizem, são necessárias políticas claras em diversas vertentes:
– Na qualificação de técnicos a todos os níveis, capacitados para a concepção de projecto e a planificação, a construção e a instalação, e a operação das infraestruturas, das redes de transporte, dos edifícios, dos equipamentos, das linhas de fabrico, etc..
– Nos incentivos técnicos, administrativos ou financeiros que promovam e viabilizem a implementação das soluções técnicas necessárias.
– Nos tarifários de energia que promovam a selecção da forma de energia mais eficiente, e a sua utilização final mais eficaz.
No próprio sector energético, é urgente programar os investimentos prioritários em novos centros electroprodutores i) retomando a construção dos grandes e médios aproveitamentos hidroeléctricos que estão por realizar, salvaguardando os respectivos impactos, ii) travando a concessão de mais centrais a gás natural, porquanto delapidam um importante recurso de energia primária, iii) sendo absolutamente necessário instalar novas centrais termoeléctricas de base com combustíveis fósseis, optar por carvão em detrimento do gás natural, adoptando as necessárias medidas de redução de emissões atmosféricas.
Dado o peso económico e a complexidade das políticas energéticas, no quadro das profundas interdependências em que vivemos, constitui um imperativo nacional planear a produção e o consumo de energia no nosso País, relançando e actualizando o Plano Energético Nacional. Requer-se uma orientação central, quanto a nós a única que permitirá um desenvolvimento determinante e sustentado, face ao carácter absolutamente estratégico do factor de produção energia, e dadas as iniludíveis condições adversas de crise mundial.
É fundamental que o Estado reassuma claramente o comando do sector energético, seja como definidor e controlador de políticas, mas também como gestor de activos económicos na esfera do aprovisionamento, produção, transporte, distribuição e mesmo nalgumas circunstâncias na comercialização das formas de energia dominantes. Sem prejuízo da necessidade de o Estado também assegurar a função de Autoridade reguladora, nos domínios em que no terreno actuem actores privados.
O «jogo de mercado» está a revelar-se e será cada vez mais insustentável para o povo e desastroso para o futuro do País.
Um outro rumo, uma nova política, é possível.


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