Por um novo modelo de desenvolvimento
No passado dia 25 de Novembro, no termo da Conferência Nacional sobres as questões económicas e sociais, entre muitas e importantes conclusões, foi salientado que todo o trabalho realizado no decurso da preparação da Conferência permite concluir que o Estado deve recuperar as «suas responsabilidades económicas e sociais e o pleno exercício das funções e instrumentos de soberania, no quadro de uma economia mista e de uma democracia avançada, liberta dos interesses e orientações do capital monopolista e de uma decisiva valorização do trabalho e dos trabalhadores», pelo que, nós, comunistas, exigimos que o Estado retome a sua presença maioritária nos sectores estratégicos da actividade económica.
Que sectores são esses? São todos aqueles que, conjugadamente, não só exploram os trabalhadores, como, através do seu poder económico, determinam as acções das instituições, sobretudo do Governo e da comunicação social, pelo que, (e passamos a citar o programa do PCP) «a subordinação do poder económico ao poder político democrático e o controlo das alavancas fundamentais da vida económica nacional, libertas do domínio do grande capital e de imposições externas, exige:
um Sector Empresarial do Estado implicando a nacionalização de empresas básicas e estratégicas e em que a gestão das respectivas empresas, com a participação dos trabalhadores, seja coordenada e assegurada por gestores competentes ao serviço efectivo de um Estado democrático e do bem público».
Que empresas são essas? São todas aquelas que condicionam a democracia assente em quatro pilares (política, económica, social e cultural) e que detêm, pelo dinheiro e pelo poder, uma importância estratégica na banca, nos seguros, na energia, na indústria, nos transportes, nas comunicações, bem como aquelas que não estando incluídas nos sectores atrás referidos desempenham um papel determinante no desenvolvimento das forças produtivas.
Estes princípios programáticos inseridos no Programa do PCP e salientados na Conferência atrás referida implica o conhecimento da nossa estrutura empresarial. Este nosso artigo tem, pois, esse objectivo: o de contribuir, embora em pequena escala, para uma caracterização das grandes empresas estratégicas, tendo em conta, apenas, parâmetros quantitativos. Quanto a critérios selectivos sobre a sua inclusão no Sector Empresarial do Estado o povo português não deixará de, em momento oportuno, pronunciar-se, como se pronunciou, em 1975, no processo revolucionário que se seguiu ao 25 de Abril.
Vejamos, então. De acordo com as Estatísticas das Empresas, do INE, reportadas a 2005, existiam em Portugal 1 057 158 empresas, das quais 95,4% tinham, ao seu serviço, menos de 10 trabalhadores remunerados (não confundir trabalhadores remunerados com trabalhadores por conta de outrem).
Se correlacionarmos o n.º de habitantes com o n.º de empresas chegaremos à conclusão que, em Portugal, há uma empresa por cada dez habitantes!
Mas se correlacionarmos o n.º de empresas com o pessoal ao seu serviço a conclusão é a de que por cada empresa há 3,48 empregados!
Estamos perante um tecido empresarial dominado, numericamente, pelas micro, pequeníssimas e pequenas empresas, sem esquecer o vultuoso núcleo de unidades familiares e de empresários individuais.
Para se ter uma ideia do que estamos a falar basta dizer que, em 2004, apenas 312 939 empresas entregaram ao Ministério do Trabalho os respectivos Quadros de Pessoal havendo, por isso, uma diferença de cerca de 744 219 unidades a não divulgarem, oficialmente, a existência de trabalhadores por conta de outrem. Este número não pode, naturalmente, ser tomado à letra, dado haver um numeroso grupo de empresas desactivadas a que acresce um número desconhecido (desconhecido para nós mas perfeitamente identificáveis pelo patronato) de empresas fantasmas destinadas a suportar não só a chamada «engenharia financeira» como a emissão de facturas falsas, em nome, obviamente, da fuga aos impostos.
Segundo dados do INE, portanto em termos oficiais, o quadro geral é bem ilustrativo: até 9 empregados, há 1.007.701 (95,3%) empresas com 1.657.948 (45%) trabalhadores; entre 10 e 49, há 42.625 empresas (4%), com 800.218 (21,7%) trabalhadores; entre 50 e 249, há 5.965 empresas (0,6%), com 566.964 (15,4%) trabalhadores; e com 250 ou mais empregados, o número de empresas é de 867 (0,1%), nelas laborando 655.458 pessoas (17,8%). O número total de empresas é, pois, de 1.057.158, com um número total de 3.680.588 empregados.
Como se vê, o tecido empresarial é muito assimétrico, explicado pelo facto de menos de 0,1% (mais concretamente 0,08%!) das empresas representarem 17,8% do volume de emprego, assimetria que se torna ainda maior se tomarmos em consideração as empresas com 500 ou mais trabalhadores. Pois bem, perante tudo isto, das mil e uma questões que podíamos colocar, vejamos apenas, e só, uma questão: a taxa de rentabilidade dos capitais próprios ou seja: o retorno do capital investido e, reflexamente, a velocidade da acumulação de capital.
As elevadas taxas de rentabilidade
O INE (Empresas em Portugal – 2005) refere que o universo das empresas atrás referidas tiveram um volume de negócios de 318 mil milhões de euros, o que perfaz uma média de 300 864 euros por empresa não financeira e que, nesse ano, a taxa de rentabilidade dos capitais próprios, para o conjunto da economia, com excepção das sociedades financeiras, foi de 10,67%, ou seja: o retorno foi de, a título de exemplo, 106,70 euros por cada 1000 euros de investimento.
Estes são os valores médios para a generalidade do tecido produtivo, valores que não são uniformes e variam em função da actividade económica e da dimensão das empresas, pelo que, em nome do conhecimento, há que desagregar a informação disponível. A este propósito vejamos dois exemplos:
1º. Tendo em conta os dados fornecidos pela revista «Exame» relativos às mil melhores pequenas e médias empresas (com menos de 250 empregados e com vendas iguais ou inferiores a 50 milhões de euros), constata-se que a rentabilidade do capital próprio foi, em 2006, na ordem dos 14,62 euros, ou seja, por cada 1000 euros de investimento houve um retorno de 146,20 euros, valor significativamente superior à média do país.
2º. O valor atrás referido, já de si elevado, é largamente ultrapassado por um vasto conjunto de grandes empresas, todas elas com mais de 500 trabalhadores que, em 2006, tiveram um retorno dos capitais próprios superiores a 30%. Estão neste caso, segundo a publicação do Jornal de Notícias relativa às mil empresas mais rentáveis, as seguintes empresas, cujo nome convém fixar pelos trabalhadores, sobretudo aquando da respectiva revisão da convenção colectiva de trabalho:
Berska Portugal-Confecções; Pull & Bear-Confecções; Nutrinveste, SGPS; Zara Portugal; REN- Rede Eléctrica Nacional; Nestlé Portugal; Galpgeste-Gestão de Áreas de Serviço; Pingo Doce; CIN-Corporação Industrial do Norte; TAP; Otis Elevadores; Randstad-Empresa de Trabalho Temporário; Tabaqueira; Somincor-Sociedade Mineira de Neves Corvo; Caetanobus-Fabricação de Carroçarias; Lidosol-Distribuição de Produtos Alimentares; Martifer-Construções Metalomecânicas; IBM; Legrand Eléctrica; Eurest Portugal-Soc.Europeia de Restaurantes; BA-Fábrica de Vidros; CTT-Correios de Portugal; Cttexpresso-Serviço Postais e Logística; Mestre Maco-Materiais de Construção; Adecco Recursos Humanos; Cimpor-Industria de Cimentos.
Para além destas empresas acrescem muitas outras que, provavelmente, por razões fundadas no princípio de que o «segredo é a alma do negócio», não forneceram os dados que permitiram calcular a taxa de rentabilidade dos capitais próprios, de que são exemplo, entre outros, os casos da Autoeuropa, PT Multimédia, FNAC, etc..
A caracterização das empresas com as mais elevadas taxas de rentabilidade dos capitais próprios é importante, circunstância que não deve minimizar a nossa visão sobre um «outro lado» da economia: o lado do capital monopolista e a sua posição determinante na estrutura e funcionamento da economia portuguesa.
Que lado é esse? É o lado onde pontificam os interesses de cerca de 50 grupos económicos, cada um deles com um volume de negócios superior a 400 milhões de euros, grupos que, de acordo com o suplemento do Diário de Notícias relativo às mil maiores empresas, chamaram a si, em 2006, os seguintes resultados globais:
nível de negócios: 97 133 mil milhões de euros, ou seja, cerca de 30% dos negócios das já referidas 1 057 158 empresas não financeiras;
lucros: 16 600 mil milhões de euros (é caso para parafrasear um combatente na batalha de Alfarrobeira ao referir: «é fartar vilanagem!»);
rentabilidade dos capitais próprios: 33,5%, ou seja, por cada 1000 euros houve um retorno de 335 euros;
número de trabalhadores: 275 000 (estimativa do Diário de Notícias);
produtividade: 353 000 euros por trabalhador.
Como se vê, este pequeno núcleo de empresas tem, relativamente ao conjunto do tecido empresarial português, o triplo da rentabilidade dos capitais próprios o que lhe permite, num curto espaço de tempo, acumular vultuosos lucros. Há, para além deste valor médio, situações de perfeita agiotagem, como são os casos, a título de exemplo, da Nutrinveste, da Portugal Telecom, da Tranquilidade, da REN, da Nestlé que, em 2006, tiveram, respectivamente, uma taxa de rentabilidade de 92,05%, 63,27%, 61,72% 53,35% e 50,71%!!!
Rápida e vultuosa acumulação de capital
Numa perspectiva mais abrangente, de acordo um estudo da responsabilidade de «Inteli- Inteligência em Inovação», publicado em 3 de Dezembro, no jornal Público, o volume dos lucros acumulados por sector entre 2000 e 2004 foram de: construção e imobiliário, 27 900 mil milhões de euros; banca e seguros, 19 300 mil milhões de euros; comércio, 14 300 mil milhões de euros; telecomunicações, 8400 mil milhões de euros; electricidade e gás, 5800 mil milhões de euros. Tais lucros, nos comentários subservientes feitos pela generalidade da comunicação social, são o resultado da boa gestão e do regular funcionamento do mercado.
O que não se diz é que tais lucros são devidos, em grande parte à forma como são fixados os preços ao consumidor (preço da gasolina, do gasóleo, da electricidade, do gás, das comunicações, das taxas e serviços bancários, do custo dos seguros e dos produtos fornecidos pelas grandes superfícies comerciais. Estes últimos não só esmagam os preços na indústria como são uma espécie de banco por via de um esquema muito simples: recebem dos clientes a pronto pagamento e pagam aos fornecedores a 30, 60 dias e, não raramente, até prazos mais dilatados. Para se ter uma ideia da dimensão deste negócio basta dizer que, em 2006, só o Modelo Continente, à sua custa, recebeu a pronto pagamento, por parte dos seus clientes, qualquer coisa como cerca de 9 milhões de euros por dia. Multipliquemos este valor por 365 dias e por todas as grandes superfícies espalhadas pelo País e não deixaremos de concluir que os senhores Belmiro, Jerónimo Martins e seus confrades têm, por esta via, acesso a dinheiro de borla, verbas tanto maiores quanto maior for a diferença temporal entre aquilo que recebem do cliente e aquilo que pagam ao fornecedor. Os comentadores que enxameiam a comunicação social acham isto extremamente natural. Nós, pela nossa parte, achamos isto extremamente penalizador para o sector produtivo (agricultura, pescas e indústria transformadora), cujo poder negocial é muito menor do que o das grandes superfícies.
Mas também não se diz que a acumulação de capital nas mãos de umas escassas centenas de pessoas resultou (e resulta) daquilo que nós, fundamentadamente, designamos por «economia de casino». Para se perceber um dos múltiplos e engenhosos esquemas desta forma de economia, direccionada para a rápida e vultuosa acumulação capitalista, vejamos um caso concreto. Na primeira quinzena de Julho de 2007 teve lugar a privatização parcial da REN-Rede Eléctrica Nacional através da qual o Estado alienou 19% do capital da referida empresa, tendo o Governo fixado em 2,75 euros o valor de venda de cada acção. Pois bem, passado poucos dias as acções transaccionadas em bolsa superaram os 4 euros, tendo estabilizado nos 3,74 euros, em 11 de Dezembro. Moral da história: em cerca de 5 meses as acções valorizaram-se em cerca de 36%.
Porquê esta rápida e significativa valorização das acções?
Ela explica-se porque a empresa, em termos produtivos, também cresceu, em cinco meses, 36%? A explicação não tem nada a ver com a função produtiva da empresa (entre 2005 e 2006 teve apenas um crescimento, no volume de vendas, de uns modestos 2,19%...) mas sim com a opção do Governo (deste e de todos os anteriores) de minimizarem a avaliação do sector empresarial do Estado calculando, por baixo, os seus activos, por forma a oligarquia instalada entre nós obter uma elevada mais-valia de um dia para o outro, sem que tal mais-valia esteja correlacionada com o desempenho da economia real. Foi agora com a REN e foi assim, praticamente, com todas as empresas que foram nacionalizadas após o 25 de Abril. No caso da REN, tendo em consideração a última cotação (11/12/2007), o Estado (todos nós) foi defraudado em cerca de 100 milhões de euros, tanto quanto ganharam todos aqueles que compraram acções em 9/7/2007.
Este crime lesa-sector empresarial do Estado vai ao ponto de muitas dessas aquisições não envolverem dinheiro da referida oligarquia, a qual recorre ao capital alheio, incluindo a Caixa Geral de Depósitos e, no passado, à própria banca nacionalizada, ou seja, os oligarcas portugueses compraram o património do Estado a fiado (por vezes, como aconteceu no sistema financeiro, com o próprio capital das empresas compradas) e com lucro garantido, sob a benção do bloco central de interesses, essa espécie de irmãos siameses, não ligados pelas costas, mas antes ligados pela barriga.
A história da acumulação capitalista, nos últimos 30 anos, passa forçosamente pelo atrás referido, sem esquecer, naturalmente, outros mecanismos, como sejam, como já sublinhámos, a formação dos preços, a transformação dos terrenos agrícolas em zonas urbanas, a adjudicação das obras públicas e as respectivas derrapagens de custos face ao orçamento inicial, as facturas falsas, a fuga aos impostos e o imenso iceberg (leia-se: parte não visível) dos negócios entre o Estado, as empresas de consultoria e os grandes escritórios de advogados. É caso para dizer tudo isto gira à volta da política. É verdade, tudo isto é política. Mas é também, para além da política, um caso de polícia.
um Sector Empresarial do Estado implicando a nacionalização de empresas básicas e estratégicas e em que a gestão das respectivas empresas, com a participação dos trabalhadores, seja coordenada e assegurada por gestores competentes ao serviço efectivo de um Estado democrático e do bem público».
Que empresas são essas? São todas aquelas que condicionam a democracia assente em quatro pilares (política, económica, social e cultural) e que detêm, pelo dinheiro e pelo poder, uma importância estratégica na banca, nos seguros, na energia, na indústria, nos transportes, nas comunicações, bem como aquelas que não estando incluídas nos sectores atrás referidos desempenham um papel determinante no desenvolvimento das forças produtivas.
Estes princípios programáticos inseridos no Programa do PCP e salientados na Conferência atrás referida implica o conhecimento da nossa estrutura empresarial. Este nosso artigo tem, pois, esse objectivo: o de contribuir, embora em pequena escala, para uma caracterização das grandes empresas estratégicas, tendo em conta, apenas, parâmetros quantitativos. Quanto a critérios selectivos sobre a sua inclusão no Sector Empresarial do Estado o povo português não deixará de, em momento oportuno, pronunciar-se, como se pronunciou, em 1975, no processo revolucionário que se seguiu ao 25 de Abril.
Vejamos, então. De acordo com as Estatísticas das Empresas, do INE, reportadas a 2005, existiam em Portugal 1 057 158 empresas, das quais 95,4% tinham, ao seu serviço, menos de 10 trabalhadores remunerados (não confundir trabalhadores remunerados com trabalhadores por conta de outrem).
Se correlacionarmos o n.º de habitantes com o n.º de empresas chegaremos à conclusão que, em Portugal, há uma empresa por cada dez habitantes!
Mas se correlacionarmos o n.º de empresas com o pessoal ao seu serviço a conclusão é a de que por cada empresa há 3,48 empregados!
Estamos perante um tecido empresarial dominado, numericamente, pelas micro, pequeníssimas e pequenas empresas, sem esquecer o vultuoso núcleo de unidades familiares e de empresários individuais.
Para se ter uma ideia do que estamos a falar basta dizer que, em 2004, apenas 312 939 empresas entregaram ao Ministério do Trabalho os respectivos Quadros de Pessoal havendo, por isso, uma diferença de cerca de 744 219 unidades a não divulgarem, oficialmente, a existência de trabalhadores por conta de outrem. Este número não pode, naturalmente, ser tomado à letra, dado haver um numeroso grupo de empresas desactivadas a que acresce um número desconhecido (desconhecido para nós mas perfeitamente identificáveis pelo patronato) de empresas fantasmas destinadas a suportar não só a chamada «engenharia financeira» como a emissão de facturas falsas, em nome, obviamente, da fuga aos impostos.
Segundo dados do INE, portanto em termos oficiais, o quadro geral é bem ilustrativo: até 9 empregados, há 1.007.701 (95,3%) empresas com 1.657.948 (45%) trabalhadores; entre 10 e 49, há 42.625 empresas (4%), com 800.218 (21,7%) trabalhadores; entre 50 e 249, há 5.965 empresas (0,6%), com 566.964 (15,4%) trabalhadores; e com 250 ou mais empregados, o número de empresas é de 867 (0,1%), nelas laborando 655.458 pessoas (17,8%). O número total de empresas é, pois, de 1.057.158, com um número total de 3.680.588 empregados.
Como se vê, o tecido empresarial é muito assimétrico, explicado pelo facto de menos de 0,1% (mais concretamente 0,08%!) das empresas representarem 17,8% do volume de emprego, assimetria que se torna ainda maior se tomarmos em consideração as empresas com 500 ou mais trabalhadores. Pois bem, perante tudo isto, das mil e uma questões que podíamos colocar, vejamos apenas, e só, uma questão: a taxa de rentabilidade dos capitais próprios ou seja: o retorno do capital investido e, reflexamente, a velocidade da acumulação de capital.
As elevadas taxas de rentabilidade
O INE (Empresas em Portugal – 2005) refere que o universo das empresas atrás referidas tiveram um volume de negócios de 318 mil milhões de euros, o que perfaz uma média de 300 864 euros por empresa não financeira e que, nesse ano, a taxa de rentabilidade dos capitais próprios, para o conjunto da economia, com excepção das sociedades financeiras, foi de 10,67%, ou seja: o retorno foi de, a título de exemplo, 106,70 euros por cada 1000 euros de investimento.
Estes são os valores médios para a generalidade do tecido produtivo, valores que não são uniformes e variam em função da actividade económica e da dimensão das empresas, pelo que, em nome do conhecimento, há que desagregar a informação disponível. A este propósito vejamos dois exemplos:
1º. Tendo em conta os dados fornecidos pela revista «Exame» relativos às mil melhores pequenas e médias empresas (com menos de 250 empregados e com vendas iguais ou inferiores a 50 milhões de euros), constata-se que a rentabilidade do capital próprio foi, em 2006, na ordem dos 14,62 euros, ou seja, por cada 1000 euros de investimento houve um retorno de 146,20 euros, valor significativamente superior à média do país.
2º. O valor atrás referido, já de si elevado, é largamente ultrapassado por um vasto conjunto de grandes empresas, todas elas com mais de 500 trabalhadores que, em 2006, tiveram um retorno dos capitais próprios superiores a 30%. Estão neste caso, segundo a publicação do Jornal de Notícias relativa às mil empresas mais rentáveis, as seguintes empresas, cujo nome convém fixar pelos trabalhadores, sobretudo aquando da respectiva revisão da convenção colectiva de trabalho:
Berska Portugal-Confecções; Pull & Bear-Confecções; Nutrinveste, SGPS; Zara Portugal; REN- Rede Eléctrica Nacional; Nestlé Portugal; Galpgeste-Gestão de Áreas de Serviço; Pingo Doce; CIN-Corporação Industrial do Norte; TAP; Otis Elevadores; Randstad-Empresa de Trabalho Temporário; Tabaqueira; Somincor-Sociedade Mineira de Neves Corvo; Caetanobus-Fabricação de Carroçarias; Lidosol-Distribuição de Produtos Alimentares; Martifer-Construções Metalomecânicas; IBM; Legrand Eléctrica; Eurest Portugal-Soc.Europeia de Restaurantes; BA-Fábrica de Vidros; CTT-Correios de Portugal; Cttexpresso-Serviço Postais e Logística; Mestre Maco-Materiais de Construção; Adecco Recursos Humanos; Cimpor-Industria de Cimentos.
Para além destas empresas acrescem muitas outras que, provavelmente, por razões fundadas no princípio de que o «segredo é a alma do negócio», não forneceram os dados que permitiram calcular a taxa de rentabilidade dos capitais próprios, de que são exemplo, entre outros, os casos da Autoeuropa, PT Multimédia, FNAC, etc..
A caracterização das empresas com as mais elevadas taxas de rentabilidade dos capitais próprios é importante, circunstância que não deve minimizar a nossa visão sobre um «outro lado» da economia: o lado do capital monopolista e a sua posição determinante na estrutura e funcionamento da economia portuguesa.
Que lado é esse? É o lado onde pontificam os interesses de cerca de 50 grupos económicos, cada um deles com um volume de negócios superior a 400 milhões de euros, grupos que, de acordo com o suplemento do Diário de Notícias relativo às mil maiores empresas, chamaram a si, em 2006, os seguintes resultados globais:
nível de negócios: 97 133 mil milhões de euros, ou seja, cerca de 30% dos negócios das já referidas 1 057 158 empresas não financeiras;
lucros: 16 600 mil milhões de euros (é caso para parafrasear um combatente na batalha de Alfarrobeira ao referir: «é fartar vilanagem!»);
rentabilidade dos capitais próprios: 33,5%, ou seja, por cada 1000 euros houve um retorno de 335 euros;
número de trabalhadores: 275 000 (estimativa do Diário de Notícias);
produtividade: 353 000 euros por trabalhador.
Como se vê, este pequeno núcleo de empresas tem, relativamente ao conjunto do tecido empresarial português, o triplo da rentabilidade dos capitais próprios o que lhe permite, num curto espaço de tempo, acumular vultuosos lucros. Há, para além deste valor médio, situações de perfeita agiotagem, como são os casos, a título de exemplo, da Nutrinveste, da Portugal Telecom, da Tranquilidade, da REN, da Nestlé que, em 2006, tiveram, respectivamente, uma taxa de rentabilidade de 92,05%, 63,27%, 61,72% 53,35% e 50,71%!!!
Rápida e vultuosa acumulação de capital
Numa perspectiva mais abrangente, de acordo um estudo da responsabilidade de «Inteli- Inteligência em Inovação», publicado em 3 de Dezembro, no jornal Público, o volume dos lucros acumulados por sector entre 2000 e 2004 foram de: construção e imobiliário, 27 900 mil milhões de euros; banca e seguros, 19 300 mil milhões de euros; comércio, 14 300 mil milhões de euros; telecomunicações, 8400 mil milhões de euros; electricidade e gás, 5800 mil milhões de euros. Tais lucros, nos comentários subservientes feitos pela generalidade da comunicação social, são o resultado da boa gestão e do regular funcionamento do mercado.
O que não se diz é que tais lucros são devidos, em grande parte à forma como são fixados os preços ao consumidor (preço da gasolina, do gasóleo, da electricidade, do gás, das comunicações, das taxas e serviços bancários, do custo dos seguros e dos produtos fornecidos pelas grandes superfícies comerciais. Estes últimos não só esmagam os preços na indústria como são uma espécie de banco por via de um esquema muito simples: recebem dos clientes a pronto pagamento e pagam aos fornecedores a 30, 60 dias e, não raramente, até prazos mais dilatados. Para se ter uma ideia da dimensão deste negócio basta dizer que, em 2006, só o Modelo Continente, à sua custa, recebeu a pronto pagamento, por parte dos seus clientes, qualquer coisa como cerca de 9 milhões de euros por dia. Multipliquemos este valor por 365 dias e por todas as grandes superfícies espalhadas pelo País e não deixaremos de concluir que os senhores Belmiro, Jerónimo Martins e seus confrades têm, por esta via, acesso a dinheiro de borla, verbas tanto maiores quanto maior for a diferença temporal entre aquilo que recebem do cliente e aquilo que pagam ao fornecedor. Os comentadores que enxameiam a comunicação social acham isto extremamente natural. Nós, pela nossa parte, achamos isto extremamente penalizador para o sector produtivo (agricultura, pescas e indústria transformadora), cujo poder negocial é muito menor do que o das grandes superfícies.
Mas também não se diz que a acumulação de capital nas mãos de umas escassas centenas de pessoas resultou (e resulta) daquilo que nós, fundamentadamente, designamos por «economia de casino». Para se perceber um dos múltiplos e engenhosos esquemas desta forma de economia, direccionada para a rápida e vultuosa acumulação capitalista, vejamos um caso concreto. Na primeira quinzena de Julho de 2007 teve lugar a privatização parcial da REN-Rede Eléctrica Nacional através da qual o Estado alienou 19% do capital da referida empresa, tendo o Governo fixado em 2,75 euros o valor de venda de cada acção. Pois bem, passado poucos dias as acções transaccionadas em bolsa superaram os 4 euros, tendo estabilizado nos 3,74 euros, em 11 de Dezembro. Moral da história: em cerca de 5 meses as acções valorizaram-se em cerca de 36%.
Porquê esta rápida e significativa valorização das acções?
Ela explica-se porque a empresa, em termos produtivos, também cresceu, em cinco meses, 36%? A explicação não tem nada a ver com a função produtiva da empresa (entre 2005 e 2006 teve apenas um crescimento, no volume de vendas, de uns modestos 2,19%...) mas sim com a opção do Governo (deste e de todos os anteriores) de minimizarem a avaliação do sector empresarial do Estado calculando, por baixo, os seus activos, por forma a oligarquia instalada entre nós obter uma elevada mais-valia de um dia para o outro, sem que tal mais-valia esteja correlacionada com o desempenho da economia real. Foi agora com a REN e foi assim, praticamente, com todas as empresas que foram nacionalizadas após o 25 de Abril. No caso da REN, tendo em consideração a última cotação (11/12/2007), o Estado (todos nós) foi defraudado em cerca de 100 milhões de euros, tanto quanto ganharam todos aqueles que compraram acções em 9/7/2007.
Este crime lesa-sector empresarial do Estado vai ao ponto de muitas dessas aquisições não envolverem dinheiro da referida oligarquia, a qual recorre ao capital alheio, incluindo a Caixa Geral de Depósitos e, no passado, à própria banca nacionalizada, ou seja, os oligarcas portugueses compraram o património do Estado a fiado (por vezes, como aconteceu no sistema financeiro, com o próprio capital das empresas compradas) e com lucro garantido, sob a benção do bloco central de interesses, essa espécie de irmãos siameses, não ligados pelas costas, mas antes ligados pela barriga.
A história da acumulação capitalista, nos últimos 30 anos, passa forçosamente pelo atrás referido, sem esquecer, naturalmente, outros mecanismos, como sejam, como já sublinhámos, a formação dos preços, a transformação dos terrenos agrícolas em zonas urbanas, a adjudicação das obras públicas e as respectivas derrapagens de custos face ao orçamento inicial, as facturas falsas, a fuga aos impostos e o imenso iceberg (leia-se: parte não visível) dos negócios entre o Estado, as empresas de consultoria e os grandes escritórios de advogados. É caso para dizer tudo isto gira à volta da política. É verdade, tudo isto é política. Mas é também, para além da política, um caso de polícia.