PCP assinala 80.º aniversário de António Gervásio

Um grande abraço comunista

A vida de António Gervásio confunde-se com a história do PCP nas últimas décadas. Ambas foram celebradas no domingo, em Montemor-o-Novo, num almoço comemorativo dos oitenta anos do histórico dirigente comunista.

António Gervásio fez da resistência uma opção de vida

Aproximava-se a hora marcada para o início do almoço – 13 horas – e já era claro que o refeitório da Escola Secundária de Montemor-o-Novo iria ser pequeno para tanta gente. De Montemor vieram muitos, que não poderiam faltar à homenagem àquele que, até há pouco tempo, assumia a direcção do trabalho do Partido no concelho. Do resto do País vieram largas dezenas de pessoas: velhos companheiros de luta clandestina, dirigentes e militantes do Partido, familiares, amigos. Com boa vontade, e algum aperto, ninguém ficou de fora.
António Gervásio chegou já perto da hora e foi imediatamente cercado por muitos daqueles que haviam feito dezenas ou centenas de quilómetros para o saudar. Ramos de cravos vermelhos agitavam-se no ar tentando atingir as mãos do aniversariante e braços abriam-se para o receber em fraternais saudações. Visivelmente pouco à vontade com a condição de homenageado, Gervásio retribuía as saudações que lhe eram dirigidas e perdia-se muitas vezes em conversas mais demoradas. Em seis décadas de luta há muitas histórias para contar e muitos amigos com quem as recordar… Também a sua companheira, Maria Lourença, recebia calorosos cumprimentos.
Na sua intervenção, «e com o risco de ser injusto ao deixar alguns de fora», António Gervásio destacou alguns dos presentes: Américo Leal que, juntamente com Octávio Pato, o convenceu a entrar para funcionário do Partido; Teodósia Vagarinho, que ele próprio recrutou para a clandestinidade; Domingos Abrantes, Ilídio Esteves e António Tereso, com quem fugiu de Caxias; Sofia Ferreira, que conheceu em Lisboa na clandestinidade; António Dias Lourenço e Carlos Costa, com quem trabalhou ao longo de muitos anos e que com ele partilharam os cárceres fascistas. No final, e ainda com a voz trémula da emoção, afirmou que continuará a dar tudo à luta do Partido. Ninguém se surpreendeu, mas todos aplaudiram!
Antes de António Gervásio, falou ainda a sua sobrinha, Helena Martins, que revelou alguns aspectos particulares da vida do histórico dirigente do PCP; Hortícia Menino, da Comissão Concelhia de Montemor-o-Novo do PCP; João Pauzinho, do Comité Central; José Catalino e José Casanova, da Comissão Política.
Na sua intervenção, José Catalino, responsável pela Direcção Regional do Alentejo, afirmou-se certo de que o Partido «vai continuar a contar com o saber, a experiência, a dedicação e a paixão do camarada António Gervásio». Daqui a dez anos, disse, expressou votos para que «cá estejamos com a mesma alegria e camaradagem a comemorar os seus 90 anos».

Resistente a tempo inteiro

Na sua intervenção, José Casanova destacou que a vida de António Gervásio justifica o abraço «da nossa camaradagem e da nossa amizade», materializado no almoço de aniversário. Este abraço, prosseguiu, é dado em função dessa vida. Porque, continuou José Casanova, «nós não damos abraços ao acaso, não abraçamos qualquer pessoa que nos apareça pela frente, mesmo que venha a correr para nós de braços abertos».
Pelo contrário, destacou, «abraçamos quem entendemos que devemos abraçar, e esse entendimento é feito por um conjunto vasto de exigências, exigências mais do que preenchidas pela vida do António Gervásio». Por outras palavras, neste sentido e nestas circunstâncias, «os nossos abraços têm uma marca de classe, e é esse abraço de classe, esse abraço comunista, por isso imensamente fraterno, que hoje damos aqui ao camarada António Gervásio».
Após realçar as muitas batalhas em que António Gervásio esteve envolvido, o membro da Comissão Política do Partido realçou que «não estaríamos aqui se o Gervásio tivesse desistido de resistir e de lutar». Para José Casanova, a questão da «coerência resistente está hoje na ordem do dia». É que, ao contrário do que alguns pretendem fazer crer, «a resistência não pode ser entendida como um acto do passado de cada um, mesmo quando esse passado teve momentos de grande heroísmo e coragem».
Resistir não é «um simples momento da vida de quem resiste» mas é, acima de tudo, uma opção de vida, assinalou José Casanova. Porque a vida mostra que «há os que foram e são resistentes e há os que foram mas deixaram de o ser». Os primeiros, prosseguiu, são os resistentes a tempo inteiro «e, por isso, com direito à preservação dessa memória resistente». Já os segundos, «por muito que se ponham em bicos de pés invocando momentos do seu passado, jamais conseguirão superar o fosso imenso que separa o seu passado resistente do seu presente capitulacionista».
Continuando, José Casanova questionou: «Que melhor abraço pode cada um de nós desejar na sua vida do que este de, ao fazer oitenta anos, poder ouvir dizer que, durante esses oitenta anos, esteve sempre onde devia estar?»

Sempre onde devia estar

Em seguida, o dirigente do PCP explicou que, neste caso, «estar sempre onde devia estar» significou estar «nos avanços e nas conquistas revolucionárias e, depois, na defesa desses avanços e conquistas face ao ataque da contra-revolução». Realçando as difíceis condições em que os comunistas tiveram que actuar, após a derrota da tentativa de construção do socialismo na URSS e nos restantes países da comunidade socialista do Leste da Europa, José Casanova destacou a «feroz ofensiva contra os partidos que persistiram em afirmar a sua condição de comunistas».
«O nosso Partido foi um dos alvos dessa ofensiva», lembrou o membro da Comissão Política, que falou numa ofensiva em duas frentes: «a habitual ofensiva por parte das forças da classe dominante e uma outra, interna, a partir de grupos fraccionistas que, beneficiando de todo o apoio da comunicação social dominante, propriedade dos grandes grupos económicos e financeiros, desencadearam uma operação visando a descaracterização do Partido, a sua transformação num partido igual aos que são todos iguais, a sua liquidação enquanto partido comunista e revolucionário».
Na rejeição dessa ofensiva, António Gervásio ocupou o seu posto de luta, afirmou José Casanova.

Uma vida dedicada ao Partido e à luta

António Gervásio nasceu a 25 de Fevereiro de 1927 em Montemor-o-Novo numa família pobre de operários agrícolas. Em 1945, aderiu ao PCP, tendo passado à clandestinidade no Verão de 1952. Em 1963 é eleito para o Comité Central, onde permanece até ao XVII Congresso do Partido, em finais de 2004. Faz parte da Comissão Política apresentada ao VII Congresso (Extraordinário) do PCP, que se realizou em Outubro de 1974.
Foi preso três vezes, sempre por denúncia: em 1947, em 1960 e em 1971. Desta última prisão saiu na decorrência do 25 de Abril. Esteve preso cinco anos e meio. Nas prisões de 1960 e 1971 foi brutalmente torturado, com espancamentos até à perda de sentidos. Na última prisão foi impedido de dormir durante 18 dias e 18 noites seguidos, cerca de 400 horas.
Em Maio de 1961, foi espancado em pleno tribunal por denunciar as torturas da PIDE. No final desse mesmo ano, participa na fuga de Caxias juntamente com outros militantes comunistas.
António Gervásio participou, do princípio ao fim, na direcção da vitoriosa e heróica luta do proletariado agrícola do sul do País pela jornada de oito horas, em 1962.
Depois da Revolução, é eleito deputado à Assembleia Constituinte pelo distrito de Portalegre e, em 1979, é eleito deputado à Assembleia da República pelo distrito de Évora. Participou directamente em todo o processo da Reforma Agrária e na luta pela sua defesa.
Até meados do ano passado, António Gervásio era membro da Direcção da Organização Regional de Évora do PCP e responsável pela organização concelhia de Montemor.


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