Eurocrise
A introdução do euro, há cinco anos, coincidiu com o início da drástica redução do poder de compra da generalidade dos portugueses, com o surto de falências e deslocalizações de empresas multinacionais e o consequente disparo do desemprego. Entretanto, o afundamento da economia e o agravamento das contas públicas têm servido de pretexto aos últimos governos para justificar o vasto programa de contra-reformas na área dos direitos laborais e dos sistemas públicos de segurança social, saúde, educação, entre outros.
Debate: EURO CINCO ANOS DEPOIS
Mas em que medida se pode relacionar a adesão à moeda única com a profunda crise económica e social em que o País está mergulhado? Tratar-se-á de uma mera coincidência ou, pelo contrário, da confirmação dos alertas, então insistentemente feitos pelo PCP, e boçalmente ignorados pelo PS e PSD, de que a perda da soberania monetária iria ter consequências desastrosas para Portugal?
A avaliação dos impactos socioeconómicos da introdução da moeda única em Portugal e noutros países da União Europeia foi o tema que reuniu, na passada sexta-feira, 17, em Lisboa, mais de meia centena de pessoas num debate promovido pelos deputados do PCP no Parlamento Europeu.
A iniciativa foi aberta por Agostinho Lopes, membro do Secretariado e da Comissão Política e contou com presença do secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, a quem coube a intervenção final.
Na mesa dos trabalhos, dirigidos por Maurício Miguel, do secretariado do grupo parlamentar do PCP no PE, estiveram igualmente Jorge Humberto, membro do CC e da DORL do PCP, e as eurodeputadas Ilda Figueiredo, membro do CC do PCP, Diamanto Manolaku, do Partido Comunista Grego, e Sahra Wagenknecht, do Partido Socialista Democrático da Alemanha.
Consequências previsíveis
O PCP, recordou Agostinho Lopes, «foi o único partido que fez uma análise prévia aprofundada dos impactos da adesão de Portugal à moeda única» e exigiu a realização de um debate sério e amplo na sociedade que culminasse na realização de um referendo. Estas propostas foi bloqueadas pelo PS, então no governo, e pelo PSD, ambos activamente empenhados na intensa campanha de propaganda mistificadora, que alardeou alegadas vantagens e semeou ilusórias promessas de progresso social e crescimento económico.
Para o PCP, como sublinhou Agostinho Lopes, era claro que, perdendo a soberania monetária (isto é a possibilidade de emitir moeda e influenciar a taxa de câmbio), Portugal abdicava de um instrumento fundamental para responder às alterações da conjuntura económica. Sem a margem de manobra que o escudo oferecia, as perdas de competitividade da economia custariam caro aos portugueses através de aumentos de impostos, diminuição das despesas sociais e dos investimentos públicos, escalada do desemprego.
Mas o governo de António Guterres recusou-se a ouvir os que colocavam as «virtudes» do euro em dúvida. Como lembrou Agostinho Lopes, o então ministro das Finanças foi peremptório ao afirmar que «a moeda única é uma decisão política e que nenhum estudo poderia pôr em causa essa decisão».
A propaganda da altura afirmava que «Portugal tinha de integrar o pelotão da frente». Todavia, hoje, notou Ilda Figueiredo, o nosso País continua na cauda da Europa segundo todos os indicadores, à excepção das taxas de lucro.
Irracionalidade económica
Mesmo dentro da lógica da economia capitalista, segundo afirmou Octávio Teixeira, a existência de uma moeda única para países com necessidades e prioridades tão diferentes «é uma irracionalidade completa». «As taxas de juro», explicou, «devem estar próximas das taxas potenciais de crescimento». Ora, a política rígida do Banco Central Europeu para assegurar a todo o custo a estabilidade dos preços tem como resultado «o nivelamento artificial das taxas potenciais de crescimento».
Por outro lado, a evolução cambial do euro face ao dólar tem tido sérias consequências sobre competitividade da economia portuguesa. Como se não bastasse a sobrevalorização inicial da paridade do escudo face ao euro (apontada mais adiante por José Alberto Lourenço), a moeda única tem vindo a acumular um ganho médio de 2,6 por cento ao ano em relação à divisa norte-americana que continua a dominar as trocas internacionais.
O desfasamento entre a economia real portuguesa e o valor cambial do euro torna-se ainda mais evidente se atentarmos ao diferencial da inflação desde sempre superior à média da zona euro. José Alberto Lourenço, membro da Comissão de Assuntos Económicos junto do Comité Central, afirmou que essa diferença, nos últimos dez anos, implicaria «uma desvalorização cambial de cerca de 20 por cento», a qual, apesar de não ter sido compensada por correspondente aumento da produtividade nacional, não teve qualquer expressão na paridade estabelecida entre o escudo e a moeda única.
Este fortalecimento artificial da moeda faz com que os produtos portugueses fiquem mais caros nos mercados internacionais ou tenham de ser vendidos com prejuízo ou margens reduzidas. Em contrapartida, os produtos importados (livres de taxas aduaneiras por imposição das regras liberalizadoras do comércio) ficam mais baratos no mercado nacional.
Para compensar esta «irracionalidade», o capital e os seus representantes no governo atacam-se aos salários dos trabalhadores e aos seus direitos laborais e sociais, agravando a exploração e a vida de milhões de portugueses. «Prometeram o aumento da coesão social, mas o resultado é o contrário», assinalou Octávio Teixeira.
Uma posição coerente
Notando que os deputados do PCP no Parlamento Europeu foram os únicos portugueses a votar contra no momento da criação da moeda única, em Maio de 1998, Sérgio Ribeiro lembrou as razões então invocadas na declaração do grupo parlamentar: «Não é um voto contra a estabilidade de preços, o equilíbrio orçamental, ou o controlo de dívidas, mecanismos e instrumentos. É, sim, um voto contra a sua utilização para impor estratégias que concentram riqueza, agravam desemprego, agudizam assimetrias e desigualdades, criam maior e nova pobreza e exclusão social, diminuem a soberania nacional e aumentam défices democráticos».
Estes sempre foram os verdadeiros objectivos da moeda única que, salientou Sérgio Ribeiro, se inseriu num processo desencadeado pelo grande capital a partir do final dos anos 80, aproveitando «as novas condições político-sociais resultantes do novo contexto internacional», no qual foi dada «prioridade absoluta à livre circulação de capitais (…) e à imposição universal de uma ideológica economia de mercado».
A avaliação dos impactos socioeconómicos da introdução da moeda única em Portugal e noutros países da União Europeia foi o tema que reuniu, na passada sexta-feira, 17, em Lisboa, mais de meia centena de pessoas num debate promovido pelos deputados do PCP no Parlamento Europeu.
A iniciativa foi aberta por Agostinho Lopes, membro do Secretariado e da Comissão Política e contou com presença do secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, a quem coube a intervenção final.
Na mesa dos trabalhos, dirigidos por Maurício Miguel, do secretariado do grupo parlamentar do PCP no PE, estiveram igualmente Jorge Humberto, membro do CC e da DORL do PCP, e as eurodeputadas Ilda Figueiredo, membro do CC do PCP, Diamanto Manolaku, do Partido Comunista Grego, e Sahra Wagenknecht, do Partido Socialista Democrático da Alemanha.
Consequências previsíveis
O PCP, recordou Agostinho Lopes, «foi o único partido que fez uma análise prévia aprofundada dos impactos da adesão de Portugal à moeda única» e exigiu a realização de um debate sério e amplo na sociedade que culminasse na realização de um referendo. Estas propostas foi bloqueadas pelo PS, então no governo, e pelo PSD, ambos activamente empenhados na intensa campanha de propaganda mistificadora, que alardeou alegadas vantagens e semeou ilusórias promessas de progresso social e crescimento económico.
Para o PCP, como sublinhou Agostinho Lopes, era claro que, perdendo a soberania monetária (isto é a possibilidade de emitir moeda e influenciar a taxa de câmbio), Portugal abdicava de um instrumento fundamental para responder às alterações da conjuntura económica. Sem a margem de manobra que o escudo oferecia, as perdas de competitividade da economia custariam caro aos portugueses através de aumentos de impostos, diminuição das despesas sociais e dos investimentos públicos, escalada do desemprego.
Mas o governo de António Guterres recusou-se a ouvir os que colocavam as «virtudes» do euro em dúvida. Como lembrou Agostinho Lopes, o então ministro das Finanças foi peremptório ao afirmar que «a moeda única é uma decisão política e que nenhum estudo poderia pôr em causa essa decisão».
A propaganda da altura afirmava que «Portugal tinha de integrar o pelotão da frente». Todavia, hoje, notou Ilda Figueiredo, o nosso País continua na cauda da Europa segundo todos os indicadores, à excepção das taxas de lucro.
Irracionalidade económica
Mesmo dentro da lógica da economia capitalista, segundo afirmou Octávio Teixeira, a existência de uma moeda única para países com necessidades e prioridades tão diferentes «é uma irracionalidade completa». «As taxas de juro», explicou, «devem estar próximas das taxas potenciais de crescimento». Ora, a política rígida do Banco Central Europeu para assegurar a todo o custo a estabilidade dos preços tem como resultado «o nivelamento artificial das taxas potenciais de crescimento».
Por outro lado, a evolução cambial do euro face ao dólar tem tido sérias consequências sobre competitividade da economia portuguesa. Como se não bastasse a sobrevalorização inicial da paridade do escudo face ao euro (apontada mais adiante por José Alberto Lourenço), a moeda única tem vindo a acumular um ganho médio de 2,6 por cento ao ano em relação à divisa norte-americana que continua a dominar as trocas internacionais.
O desfasamento entre a economia real portuguesa e o valor cambial do euro torna-se ainda mais evidente se atentarmos ao diferencial da inflação desde sempre superior à média da zona euro. José Alberto Lourenço, membro da Comissão de Assuntos Económicos junto do Comité Central, afirmou que essa diferença, nos últimos dez anos, implicaria «uma desvalorização cambial de cerca de 20 por cento», a qual, apesar de não ter sido compensada por correspondente aumento da produtividade nacional, não teve qualquer expressão na paridade estabelecida entre o escudo e a moeda única.
Este fortalecimento artificial da moeda faz com que os produtos portugueses fiquem mais caros nos mercados internacionais ou tenham de ser vendidos com prejuízo ou margens reduzidas. Em contrapartida, os produtos importados (livres de taxas aduaneiras por imposição das regras liberalizadoras do comércio) ficam mais baratos no mercado nacional.
Para compensar esta «irracionalidade», o capital e os seus representantes no governo atacam-se aos salários dos trabalhadores e aos seus direitos laborais e sociais, agravando a exploração e a vida de milhões de portugueses. «Prometeram o aumento da coesão social, mas o resultado é o contrário», assinalou Octávio Teixeira.
Uma posição coerente
Notando que os deputados do PCP no Parlamento Europeu foram os únicos portugueses a votar contra no momento da criação da moeda única, em Maio de 1998, Sérgio Ribeiro lembrou as razões então invocadas na declaração do grupo parlamentar: «Não é um voto contra a estabilidade de preços, o equilíbrio orçamental, ou o controlo de dívidas, mecanismos e instrumentos. É, sim, um voto contra a sua utilização para impor estratégias que concentram riqueza, agravam desemprego, agudizam assimetrias e desigualdades, criam maior e nova pobreza e exclusão social, diminuem a soberania nacional e aumentam défices democráticos».
Estes sempre foram os verdadeiros objectivos da moeda única que, salientou Sérgio Ribeiro, se inseriu num processo desencadeado pelo grande capital a partir do final dos anos 80, aproveitando «as novas condições político-sociais resultantes do novo contexto internacional», no qual foi dada «prioridade absoluta à livre circulação de capitais (…) e à imposição universal de uma ideológica economia de mercado».