A culpa de quem sabia
Mais de mil voos da CIA transportando suspeitos de terrorismo para centros de tortura transitaram pelo espaço europeu com total impunidade, concluiu a comissão de inquérito do Parlamento Europeu.
O transporte de prisioneiros para centros de tortura transitou pela Europa
O relatório, apresentado na passada semana, dia 27, considera «inverosímil» que «determinados governos» europeus não estivessem ao corrente das operações clandestinas dos serviços secretos norte-americanos «no seu território, seu espaço aéreo e seus aeroportos».
Depois de três meses de trabalho, a comissão de inquérito do Parlamento Europeu divulgou um documento preliminar redigido com base em mais de 50 horas de audição, ao longo das quais testemunharam activistas dos direitos humanos, responsáveis europeus e vítimas de sequestros e torturas efectuados por agentes da CIA.
A Comissão, que confrontou as informações recolhidas com os dados fornecidos pelo Eurocontrol (agência europeia responsável pela navegação aérea), concluiu que, após os ataques às torres gémeas de Nova Iorque e a coberto da luta contra o terrorismo, «as violações dos direitos do homem e dos direitos fundamentais não foram actos isolados, nem o resultado de medidas excessivas limitadas no tempo, mas antes uma vasta prática generalizada, na qual a maioria dos países europeus estava implicada».
Entre as testemunhas ouvidas, estavam Khaled Al-Masri, cidadão alemão de origem libanesa, que foi sequestrado na Macedónia e interrogado sob tortura no Afeganistão, ou Maher Arar, um sírio residente no Canadá, submetido a sevícias pelos serviços de Damasco.
O autor do relatório, Giovanni Fava, deu como provado que a CIA é «claramente responsável pelo sequestro e detenção ilegal de suspeitos de terrorismo» em Estados-membros da UE.
Envolvimento directo
Por outro lado, o deputado socialista italiano reuniu provas que incriminam três países europeus, por «envolvimento directo» na prática das chamadas «restituições extraordinárias», («extraordinary renditions» segundo a terminologia americana).
Os governos da Suécia, Itália e Bósnia são para já únicos os acusados de terem colaborado com a CIA, entregando cidadãos residentes no seu território com plena consciência de que seriam expostos a interrogatórios sob tortura em prisões do Médio Oriente, Ásia ou Norte de África.
A Suécia entregou dois egípcios, Mohamed Al-Zary e Ahmed Agiza, levados para um centro de detenção no Egipto; a Bósnia «restituiu» seis cidadãos de origem argelina que foram transferidos para a base de Gantánamo, em Cuba; enquanto o governo de Itália é implicado no rapto do íman Abou Omar, em Milão, organizado por 22 agentes da CIA, em 2003. Segundo o deputado Fava, é impossível que as autoridades italianas não tenham sido avisadas da operação.
O relator considera que existem elementos suficientes que justificam a continuação da investigação até ao final do mandato da comissão, em Janeiro de 2007, o que permitirá apurar novos factos e responsabilidades, designadamente de outros países como a Alemanha.
De igual modo, os eurodeputados pretendem confirmar as denúncias da organização Human Rights Watch sobre a existência de prisões da CIA na Roménia e Polónia. «No que respeita a essas prisões, temos mais perguntas do que respostas» explicou Fava que prevê para Setembro uma deslocação a estes países.
Perguntas com resposta óbvia
Na apresentação do seu relatório à imprensa, Cláudio Fava lamentou a falta de curiosidade e de interesse revelada pelas autoridades europeias no que toca aos voos secretos da CIA através do seu espaço aéreo.
Estranhamente, ninguém achou necessário proceder à verificação do objectivo desses voos ou sequer da identidade dos seus passageiros. Todavia, não faltavam motivos de para suspeitas.
Como refere o relator italiano, «se um avião parte de Kabul com destino a Guatánamo, passando pela Polónia, Roménia e Marrocos, trajecto que não é o mais curto, certamente que não faz escala apenas para reabastecimento de carburante».
Por exemplo, Fava interroga-se para que terão servido os 300 quilos de gelo encomendados por um avião da CIA que aterrou no aeroporto de Palma de Maiorca. Terão sido utilizados apenas para refrescar bebidas?...
Ao consentimento cúmplice dos governos, o eurodeputado acrescenta o deplorável «silêncio das embaixadas». Com uma única excepção, a do embaixador britânico Craig Murray (ver edição anterior do Avante!) que foi afastado de funções após ter protestado contra a utilização pela CIA e pelo MI6 de informações obtidas sob tortura no Uzbequistão.
Depois de três meses de trabalho, a comissão de inquérito do Parlamento Europeu divulgou um documento preliminar redigido com base em mais de 50 horas de audição, ao longo das quais testemunharam activistas dos direitos humanos, responsáveis europeus e vítimas de sequestros e torturas efectuados por agentes da CIA.
A Comissão, que confrontou as informações recolhidas com os dados fornecidos pelo Eurocontrol (agência europeia responsável pela navegação aérea), concluiu que, após os ataques às torres gémeas de Nova Iorque e a coberto da luta contra o terrorismo, «as violações dos direitos do homem e dos direitos fundamentais não foram actos isolados, nem o resultado de medidas excessivas limitadas no tempo, mas antes uma vasta prática generalizada, na qual a maioria dos países europeus estava implicada».
Entre as testemunhas ouvidas, estavam Khaled Al-Masri, cidadão alemão de origem libanesa, que foi sequestrado na Macedónia e interrogado sob tortura no Afeganistão, ou Maher Arar, um sírio residente no Canadá, submetido a sevícias pelos serviços de Damasco.
O autor do relatório, Giovanni Fava, deu como provado que a CIA é «claramente responsável pelo sequestro e detenção ilegal de suspeitos de terrorismo» em Estados-membros da UE.
Envolvimento directo
Por outro lado, o deputado socialista italiano reuniu provas que incriminam três países europeus, por «envolvimento directo» na prática das chamadas «restituições extraordinárias», («extraordinary renditions» segundo a terminologia americana).
Os governos da Suécia, Itália e Bósnia são para já únicos os acusados de terem colaborado com a CIA, entregando cidadãos residentes no seu território com plena consciência de que seriam expostos a interrogatórios sob tortura em prisões do Médio Oriente, Ásia ou Norte de África.
A Suécia entregou dois egípcios, Mohamed Al-Zary e Ahmed Agiza, levados para um centro de detenção no Egipto; a Bósnia «restituiu» seis cidadãos de origem argelina que foram transferidos para a base de Gantánamo, em Cuba; enquanto o governo de Itália é implicado no rapto do íman Abou Omar, em Milão, organizado por 22 agentes da CIA, em 2003. Segundo o deputado Fava, é impossível que as autoridades italianas não tenham sido avisadas da operação.
O relator considera que existem elementos suficientes que justificam a continuação da investigação até ao final do mandato da comissão, em Janeiro de 2007, o que permitirá apurar novos factos e responsabilidades, designadamente de outros países como a Alemanha.
De igual modo, os eurodeputados pretendem confirmar as denúncias da organização Human Rights Watch sobre a existência de prisões da CIA na Roménia e Polónia. «No que respeita a essas prisões, temos mais perguntas do que respostas» explicou Fava que prevê para Setembro uma deslocação a estes países.
Perguntas com resposta óbvia
Na apresentação do seu relatório à imprensa, Cláudio Fava lamentou a falta de curiosidade e de interesse revelada pelas autoridades europeias no que toca aos voos secretos da CIA através do seu espaço aéreo.
Estranhamente, ninguém achou necessário proceder à verificação do objectivo desses voos ou sequer da identidade dos seus passageiros. Todavia, não faltavam motivos de para suspeitas.
Como refere o relator italiano, «se um avião parte de Kabul com destino a Guatánamo, passando pela Polónia, Roménia e Marrocos, trajecto que não é o mais curto, certamente que não faz escala apenas para reabastecimento de carburante».
Por exemplo, Fava interroga-se para que terão servido os 300 quilos de gelo encomendados por um avião da CIA que aterrou no aeroporto de Palma de Maiorca. Terão sido utilizados apenas para refrescar bebidas?...
Ao consentimento cúmplice dos governos, o eurodeputado acrescenta o deplorável «silêncio das embaixadas». Com uma única excepção, a do embaixador britânico Craig Murray (ver edição anterior do Avante!) que foi afastado de funções após ter protestado contra a utilização pela CIA e pelo MI6 de informações obtidas sob tortura no Uzbequistão.