Telenovela
Paixões! Intrigas! Rivalidades! Segredos! Inconfidências! Mentiras! Parecem as palavras-chave da promoção publicitária de uma das muitas telenovelas que nos entram em casa, em avalanche se não tomarmos cuidado. Mas não são. Ou melhor: poderiam talvez sê-lo de uma outra novela um pouco diferente, um tanto semelhante, que está agora em antena todos os dias nos quatro canais abertos da televisão portuguesa: a Pré-Campanha. Em certos dias teve como momento central os debates bilaterais cuja realização acabou por ser aceite por Cavaco, incomodadíssimo por ter de descer do seu já construído trono e decerto tranquilizado, ao menos parcialmente, quando lhe tiverem dito que os acordados debates, de debates iriam ter pouco se não nada. Aí se terá arredado do crânio de Cavaco o desagrado, talvez o horror, de se ver obrigado a trocar ideias com outros acerca de temas que ultrapassassem a estreiteza de uma espécie de tachterismo sem mestre, disciplina que, tanto quanto se sabe e se adivinha, ocupa toda a massa cinzenta de que o senhor professor dispõe. Aliás, como bem se sabe, Cavaco não gosta de ser contrariado, risco a que seria exposto no decurso de debates porventura à maneira da «velha Europa», antes da importação do modelo americano. Mas não se pense que os tais debates bilaterais corresponderam a toda a telenovela de que falo. Para lá deles, tem havido reportagens diárias acerca dos movimentos e palavras dos candidatos, quase sempre temperadas pelas nem sempre muito dissimuladas preferências dos jornalistas; opiniões expostas em entrevistas por figuras relevantes da vida pública; e aos domingos, mais ou menos quando no País começam as digestões dos que continuam a jantar e ainda serão a maioria, tem havido o Momento Marcelo, a cargo de Marcelo Rebelo de Sousa, superstar do audiovisual português. É justo dizer que a generosidade de Marcelo relativamente ao seu partido, penso que ainda muito mais que quanto ao professor Cavaco, foi a ponto de voluntariamente destruir a sua reputação de comentador inteligente e credível. De facto, de há uns tempos a esta parte as suas «escolhas» resumiram-se no fundamental a uma: rasurar e ajeitar a realidade de tal modo que tudo quanto de importante saiu da sua boca acerca do actual momento político cabe perfeitamente numa fórmula sintética: tudo por Cavaco, nada contra Cavaco. E se nesta frase ressoa o eco de uma outra, antiga de várias décadas, a culpa não é minha.
Acção e mistério
Entretanto, o mais apaixonante «clou» desta telenovela ocorreu não em qualquer dos confrontos bilaterais ou no decurso de alguma reportagem, mas sim no «Quadratura do Círculo», o democratíssimo programa de debate onde sempre o PCP foi impedido de entrar: foi quando Jorge Coelho lançou o espantoso apelo para que três candidatos desistissem a favor de Soares, o que toda a gente percebe que resultaria no aumento de abstenções à primeira volta e a consequente eleição triunfal de Cavaco logo no primeiro escrutínio. Mas, como se sabe, não foi tudo: dois dirigentes socialistas, precisamente de entre os que não são nada burros, apressaram-se a secundar Coelho. Logo a notícia apanhou ventos de feição na TV e o triunfalismo cavaquista enfunou velas. Perante este autêntico «golpe de teatro» em contexto de telenovela, fica a gente a matutar no que terá sido o móbil dos autores do desatino, palavra aqui usada como cortês eufemismo. Eles bem sabem, decerto, que eleitores comunistas, bloquistas e mesmo alegristas, só se resignarão a votar Soares numa segunda volta, de modo a mandar Cavaco brincar com os netinhos, depois de numa primeira volta terem votado como o coração lhes pede. Sendo assim, o que os move? Darem um alegrão aos senhores grandes empresários, grandes financeiros, grandes gestores, reunidos em torno da candidatura do «independente» Cavaco? Se for assim, bem se pode dizer que são muito amigos de praticar o bem, de pelo Natal verem felizes não apenas as crianças mas também os grandalhões. Ou terá sido com a preocupação de poupar os patacos que vão ser gastos na segunda volta? Nesse caso, são poupadíssimos, mas mais valia sugerir o corte de certas benesses fiscais à banca. Há uma terceira hipótese, a de lhes ter deslizado pé para o impudor, mas essa é improvável, até informulável. Uma coisa é certa: Soares, que não é parvo, apressou-se a rejeitar a ideia, e não há-de ter sido apenas porque ela surgia um poucochinho parecida com uma coisa feia. E, chegados aqui, a telenovela prossegue. Paixões! Intrigas! Rivalidades! Traições? Não perca os próximos episódios.
Acção e mistério
Entretanto, o mais apaixonante «clou» desta telenovela ocorreu não em qualquer dos confrontos bilaterais ou no decurso de alguma reportagem, mas sim no «Quadratura do Círculo», o democratíssimo programa de debate onde sempre o PCP foi impedido de entrar: foi quando Jorge Coelho lançou o espantoso apelo para que três candidatos desistissem a favor de Soares, o que toda a gente percebe que resultaria no aumento de abstenções à primeira volta e a consequente eleição triunfal de Cavaco logo no primeiro escrutínio. Mas, como se sabe, não foi tudo: dois dirigentes socialistas, precisamente de entre os que não são nada burros, apressaram-se a secundar Coelho. Logo a notícia apanhou ventos de feição na TV e o triunfalismo cavaquista enfunou velas. Perante este autêntico «golpe de teatro» em contexto de telenovela, fica a gente a matutar no que terá sido o móbil dos autores do desatino, palavra aqui usada como cortês eufemismo. Eles bem sabem, decerto, que eleitores comunistas, bloquistas e mesmo alegristas, só se resignarão a votar Soares numa segunda volta, de modo a mandar Cavaco brincar com os netinhos, depois de numa primeira volta terem votado como o coração lhes pede. Sendo assim, o que os move? Darem um alegrão aos senhores grandes empresários, grandes financeiros, grandes gestores, reunidos em torno da candidatura do «independente» Cavaco? Se for assim, bem se pode dizer que são muito amigos de praticar o bem, de pelo Natal verem felizes não apenas as crianças mas também os grandalhões. Ou terá sido com a preocupação de poupar os patacos que vão ser gastos na segunda volta? Nesse caso, são poupadíssimos, mas mais valia sugerir o corte de certas benesses fiscais à banca. Há uma terceira hipótese, a de lhes ter deslizado pé para o impudor, mas essa é improvável, até informulável. Uma coisa é certa: Soares, que não é parvo, apressou-se a rejeitar a ideia, e não há-de ter sido apenas porque ela surgia um poucochinho parecida com uma coisa feia. E, chegados aqui, a telenovela prossegue. Paixões! Intrigas! Rivalidades! Traições? Não perca os próximos episódios.