Contra a precariedade do trabalho temporário
O café concerto promovido, no sábado, pela Organização dos Jovens Trabalhadores de Lisboa da JCP tinha como objectivo esclarecer os trabalhadores dos call centers sobre os seus direitos e incentivá-los à luta. E conseguiu...
«Estejam atentos, não fujam, conheçam e exijam os vossos direitos»
A fria noite de sábado aqueceu em Lisboa na zona da Estefânia com o Café Concerto Contra a Precariedade nos Call Centers, promovido pela Organização dos Jovens Trabalhadores de Lisboa da JCP.
A iniciativa tinha como objectivo descodificar as armadilhas do pacote laboral no que se refere às questões da precariedade e da subcontratação. Durante os improvisos da banda que animou os participantes, Rita Rato, a responsável pela organização, destacou em entrevista a importância de a JCP intervir nos call centers devido às suas características de exploração e ao pouco conhecimentos dos trabalhadores sobre os seus direitos.
«É uma intervenção difícil devido ao controle sobre os trabalhadores, do estímulo à competitividade, da ausência de espaços de convívio dos trabalhadores, da desregulamentação dos horários de trabalho, das horas de almoço e dos períodos de pausa», enumerou.
Os contactos começaram há pouco mais de dois meses com a distribuição de documentos da campanha nacional dos jovens trabalhadores, panfletos abordando problemas específicos de empresas, apelando à mobilização para a jornada de luta nacional de dia 10 de Novembro e com os abaixo-assinados pela revogação do Código do Trabalho e pelo não ao aumento da idade da reforma.
«As distribuições só por si permitem que comecemos a conversar, que expliquemos a importância da contratação colectiva e da unidade dos trabalhadores. Fazemos um apelo à sindicalização justa, fora do movimento revisionista, e tiramos dúvidas sobre a legislação laboral. Muita gente desconhece, por exemplo, que existe uma lei que regulamenta o trabalho temporário, legislação que é uma das mais progressistas da Europa», declara Rita Rato.
Um importante apoio
O trabalho desenvolvido pela Organização Regional de Lisboa é reconhecido pelos trabalhadores dos call centers. «Fomos à PT da Rua da Estefânia mais de seis vezes. Já nos reconhecem, alguns cumprimentam-nos quando nos vêem», conta Rita Rato.
Mas há um factor extra com que os jovens comunistas têm de lidar: o medo dos trabalhadores. «Em todos os call centers há suspeição, vídeo vigilância, os seguranças insistem que nos temos de ir embora... Por isso é positivo e profundamente significativo dos laços de solidariedade entre os trabalhadores quando alguém se oferece para levar os nossos folhetos para dentro das instalações e distribuir aos colegas», destaca a dirigente.
«Quando nos vêem parece que se sentem mais confiantes para abordar os seus problemas. Na Optimus chegaram a pedir-nos para irmos falar com a administração da empresa que os tinha contratado. Nós explicámos que não podíamos fazer isso, que estávamos dispostos a ajudá-los mas que tinham de ser eles a organizar-se sindicalmente», recorda.
Rita afirma que «a JCP não pode deixar de intervir nos locais de trabalho e de aumentar a sua ligação aos trabalhadores», aliás concretizando as orientações dos últimos congressos da JCP e do PCP no sentido de privilegiar a intervenção nos locais de trabalho.
«A JCP tem um papel fundamental no esclarecimento, no debate e na apresentação pública dos problemas dos trabalhadores. Não questionamos o papel das empresas em si. As empresas têm o papel que o sistema social e económico permite. Mas confrontamos o Governo – na verdade, os sucessivos Governos que temos tido – em relação ao desrespeito pela lei e pela não fiscalização das condições de trabalho das empresas, por não obrigar as entidades patronais a fazer um contrato permanente ao fim de um ano e meio de contratos temporários», diz Rita. Tudo porque esta é «uma luta justa e que não pode parar».
A batalha do esclarecimento
contra o medo
Durante a noite, Carlos Galvão, dirigente da Interjovem, contou como é difícil a tarefa dos sindicatos nos call centers. «Há muito medo. E há medo porque há desconhecimento. Os direitos só podem ser garantidos se os trabalhadores os reivindicarem. Para isso têm de os conhecer. O sindicato não é um bicho papão, não pretende fazer mal a ninguém, mas é sim a melhor forma dos trabalhadores conhecerem os seus direitos e lutar por eles», afirmou.
O dirigente sindical referiu a publicação pelos sindicatos de fichas mensais sobre o Código do Trabalho, informando por exemplo que os trabalhadores temporários têm direito a férias e subsídio. «Esta é a lei e tem de ser cumprida. Muita gente não sabe disto e só conhecendo é que pode reivindicar. É a pescadinha de rabo na boca...», disse.
Carlos Galvão salientou que os trabalhadores dos call centers «são aquilo que as empresas chamam de mão-de-obra barata e descartável» e lembrou que não há que ter medo de ser delegado sindical, porque estão protegidos pela lei.
«Quando os trabalhadores se unem em volta do seu sindicato conseguem atingir os seus fins», defendeu, dando como exemplo uma luta dos funcionários da Vedior: «A TMN deu folga na véspera de Natal a todos os trabalhadores, mas a Vedior entendeu que os seus trabalhadores que trabalhavam na TMN não tinham direito.» Os trabalhadores decidiram fazer greve. O protesto contou com 86 por cento de adesão e a Vedior acabou por conceder folgas de compensação a esses trabalhadores.
Carlos Galvão insistiu na necessidade de esclarecer e fazer perder o medo dos trabalhadores: «É o medo que os impede de se organizarem no sindicato. Temos de ultrapassar isso. Como é que isso se faz? Não sei, não há uma fórmula mágica. É ir falando com os trabalhadores a não ser que fujam... Esta iniciativa é também uma forma de chegar aos trabalhadores, que, mal informados, nalguns casos politicamente inconscientes e receosos, precisam de ajuda e de ser esclarecidos.»
«Estejam atentos, juntem-se a nós, não fujam, venham ter connosco, conheçam e exijam os vossos direitos e saibam que podem contar com a Interjovem e a CGTP», concluiu.
Um cenário do século XIX
Também Vasco Cardoso, dirigente da JCP e do PCP, interveio classificando as condições gerais de trabalho dos call centers como sendo típicas da exploração laboral do século XIX. O jovem comunista contestou a ideia «que se procura veicular de que os jovens estão disponíveis para aceitar todo o tipo de trabalho, independentemente do horário, do salário, do contrato de trabalho e dos direitos, e que os jovens têm de aceitar tudo».
«Muitos jovens não conhecem os seus direitos mais elementares, mas o facto de haver trabalhadores implica à partida que existem direitos. Não abdicamos dessa perspectiva. Ela está na Constituição e faz parte dos direitos humanos», salientou Vasco Cardoso, não esquecendo que «esses direitos, não sendo eternos, têm de se garantir e se conquistar».
Por isso está na mão dos trabalhadores reivindicar e lutar pelos seus direitos e melhores condições de vida no seu local de trabalho. «Esta perspectiva de luta que contraria muitas vezes a ideia generalizada de que não há nada a fazer, que mais vale ter um emprego mal pago do que estar no desemprego. Mas estas ideias não têm razão de ser, porque estas empresas precisam destes trabalhadores», afirmou, acrescentando que é urgente que os trabalhadores dos call centers se organizem e se sindicalizem na CGTP.
Vítimas da sub-contratação
Milhares de jovens trabalham nos call centers, em especial na região de Lisboa. Grande parte são contratados por empresas de trabalho temporário e estão sujeitos a condições de trabalho de grande pressão e vítimas da lógica de sub-contratação e do aluger de mão-de-obra.
Não sendo efectivos em nenhuma empresa – nem na empresa onde prestam serviços nem na empresa de trabalho temporário –, estes jovens trabalhadores vivem uma permanente precariedade no emprego, o que conduz a uma instabilidade económica, social e familiar.
Segundo a lei portuguesa, nenhuma empresa pode recorrer ao trabalho temporário por um período superior a 12 meses, salvo se requerer uma excepção fundamentada à Inspecção-Geral do Trabalho podendo alargar o prazo até 24 meses.
Como refere a JCP em nota de impresa, «apesar dos ataques à legislação do trabalho conduzido pelos governos, a luta dos trabalhadores pelos seus direitos garante ainda que a lei obrigue a que a um vínculo laboral permanente corresponda um posto de trabalho permanente».
Para os jovens comunistas, as empresas de trabalho temporário são a solução que os grupos económicos encontraram para contornar os direitos dos trabalhadores, nomeadamente a estabilidade no emprego. «Estas empresas dispõem de um sem número de trabalhadores sobre os quais se demitem das suas responsabilidades enquanto entidade empregadora», sublinham.
A iniciativa tinha como objectivo descodificar as armadilhas do pacote laboral no que se refere às questões da precariedade e da subcontratação. Durante os improvisos da banda que animou os participantes, Rita Rato, a responsável pela organização, destacou em entrevista a importância de a JCP intervir nos call centers devido às suas características de exploração e ao pouco conhecimentos dos trabalhadores sobre os seus direitos.
«É uma intervenção difícil devido ao controle sobre os trabalhadores, do estímulo à competitividade, da ausência de espaços de convívio dos trabalhadores, da desregulamentação dos horários de trabalho, das horas de almoço e dos períodos de pausa», enumerou.
Os contactos começaram há pouco mais de dois meses com a distribuição de documentos da campanha nacional dos jovens trabalhadores, panfletos abordando problemas específicos de empresas, apelando à mobilização para a jornada de luta nacional de dia 10 de Novembro e com os abaixo-assinados pela revogação do Código do Trabalho e pelo não ao aumento da idade da reforma.
«As distribuições só por si permitem que comecemos a conversar, que expliquemos a importância da contratação colectiva e da unidade dos trabalhadores. Fazemos um apelo à sindicalização justa, fora do movimento revisionista, e tiramos dúvidas sobre a legislação laboral. Muita gente desconhece, por exemplo, que existe uma lei que regulamenta o trabalho temporário, legislação que é uma das mais progressistas da Europa», declara Rita Rato.
Um importante apoio
O trabalho desenvolvido pela Organização Regional de Lisboa é reconhecido pelos trabalhadores dos call centers. «Fomos à PT da Rua da Estefânia mais de seis vezes. Já nos reconhecem, alguns cumprimentam-nos quando nos vêem», conta Rita Rato.
Mas há um factor extra com que os jovens comunistas têm de lidar: o medo dos trabalhadores. «Em todos os call centers há suspeição, vídeo vigilância, os seguranças insistem que nos temos de ir embora... Por isso é positivo e profundamente significativo dos laços de solidariedade entre os trabalhadores quando alguém se oferece para levar os nossos folhetos para dentro das instalações e distribuir aos colegas», destaca a dirigente.
«Quando nos vêem parece que se sentem mais confiantes para abordar os seus problemas. Na Optimus chegaram a pedir-nos para irmos falar com a administração da empresa que os tinha contratado. Nós explicámos que não podíamos fazer isso, que estávamos dispostos a ajudá-los mas que tinham de ser eles a organizar-se sindicalmente», recorda.
Rita afirma que «a JCP não pode deixar de intervir nos locais de trabalho e de aumentar a sua ligação aos trabalhadores», aliás concretizando as orientações dos últimos congressos da JCP e do PCP no sentido de privilegiar a intervenção nos locais de trabalho.
«A JCP tem um papel fundamental no esclarecimento, no debate e na apresentação pública dos problemas dos trabalhadores. Não questionamos o papel das empresas em si. As empresas têm o papel que o sistema social e económico permite. Mas confrontamos o Governo – na verdade, os sucessivos Governos que temos tido – em relação ao desrespeito pela lei e pela não fiscalização das condições de trabalho das empresas, por não obrigar as entidades patronais a fazer um contrato permanente ao fim de um ano e meio de contratos temporários», diz Rita. Tudo porque esta é «uma luta justa e que não pode parar».
A batalha do esclarecimento
contra o medo
Durante a noite, Carlos Galvão, dirigente da Interjovem, contou como é difícil a tarefa dos sindicatos nos call centers. «Há muito medo. E há medo porque há desconhecimento. Os direitos só podem ser garantidos se os trabalhadores os reivindicarem. Para isso têm de os conhecer. O sindicato não é um bicho papão, não pretende fazer mal a ninguém, mas é sim a melhor forma dos trabalhadores conhecerem os seus direitos e lutar por eles», afirmou.
O dirigente sindical referiu a publicação pelos sindicatos de fichas mensais sobre o Código do Trabalho, informando por exemplo que os trabalhadores temporários têm direito a férias e subsídio. «Esta é a lei e tem de ser cumprida. Muita gente não sabe disto e só conhecendo é que pode reivindicar. É a pescadinha de rabo na boca...», disse.
Carlos Galvão salientou que os trabalhadores dos call centers «são aquilo que as empresas chamam de mão-de-obra barata e descartável» e lembrou que não há que ter medo de ser delegado sindical, porque estão protegidos pela lei.
«Quando os trabalhadores se unem em volta do seu sindicato conseguem atingir os seus fins», defendeu, dando como exemplo uma luta dos funcionários da Vedior: «A TMN deu folga na véspera de Natal a todos os trabalhadores, mas a Vedior entendeu que os seus trabalhadores que trabalhavam na TMN não tinham direito.» Os trabalhadores decidiram fazer greve. O protesto contou com 86 por cento de adesão e a Vedior acabou por conceder folgas de compensação a esses trabalhadores.
Carlos Galvão insistiu na necessidade de esclarecer e fazer perder o medo dos trabalhadores: «É o medo que os impede de se organizarem no sindicato. Temos de ultrapassar isso. Como é que isso se faz? Não sei, não há uma fórmula mágica. É ir falando com os trabalhadores a não ser que fujam... Esta iniciativa é também uma forma de chegar aos trabalhadores, que, mal informados, nalguns casos politicamente inconscientes e receosos, precisam de ajuda e de ser esclarecidos.»
«Estejam atentos, juntem-se a nós, não fujam, venham ter connosco, conheçam e exijam os vossos direitos e saibam que podem contar com a Interjovem e a CGTP», concluiu.
Um cenário do século XIX
Também Vasco Cardoso, dirigente da JCP e do PCP, interveio classificando as condições gerais de trabalho dos call centers como sendo típicas da exploração laboral do século XIX. O jovem comunista contestou a ideia «que se procura veicular de que os jovens estão disponíveis para aceitar todo o tipo de trabalho, independentemente do horário, do salário, do contrato de trabalho e dos direitos, e que os jovens têm de aceitar tudo».
«Muitos jovens não conhecem os seus direitos mais elementares, mas o facto de haver trabalhadores implica à partida que existem direitos. Não abdicamos dessa perspectiva. Ela está na Constituição e faz parte dos direitos humanos», salientou Vasco Cardoso, não esquecendo que «esses direitos, não sendo eternos, têm de se garantir e se conquistar».
Por isso está na mão dos trabalhadores reivindicar e lutar pelos seus direitos e melhores condições de vida no seu local de trabalho. «Esta perspectiva de luta que contraria muitas vezes a ideia generalizada de que não há nada a fazer, que mais vale ter um emprego mal pago do que estar no desemprego. Mas estas ideias não têm razão de ser, porque estas empresas precisam destes trabalhadores», afirmou, acrescentando que é urgente que os trabalhadores dos call centers se organizem e se sindicalizem na CGTP.
Vítimas da sub-contratação
Milhares de jovens trabalham nos call centers, em especial na região de Lisboa. Grande parte são contratados por empresas de trabalho temporário e estão sujeitos a condições de trabalho de grande pressão e vítimas da lógica de sub-contratação e do aluger de mão-de-obra.
Não sendo efectivos em nenhuma empresa – nem na empresa onde prestam serviços nem na empresa de trabalho temporário –, estes jovens trabalhadores vivem uma permanente precariedade no emprego, o que conduz a uma instabilidade económica, social e familiar.
Segundo a lei portuguesa, nenhuma empresa pode recorrer ao trabalho temporário por um período superior a 12 meses, salvo se requerer uma excepção fundamentada à Inspecção-Geral do Trabalho podendo alargar o prazo até 24 meses.
Como refere a JCP em nota de impresa, «apesar dos ataques à legislação do trabalho conduzido pelos governos, a luta dos trabalhadores pelos seus direitos garante ainda que a lei obrigue a que a um vínculo laboral permanente corresponda um posto de trabalho permanente».
Para os jovens comunistas, as empresas de trabalho temporário são a solução que os grupos económicos encontraram para contornar os direitos dos trabalhadores, nomeadamente a estabilidade no emprego. «Estas empresas dispõem de um sem número de trabalhadores sobre os quais se demitem das suas responsabilidades enquanto entidade empregadora», sublinham.