Facetas da mesma guerra

Jorge Messias
Nada do que se passa no mundo nos pode fazer esquecer a guerra no Iraque. Dê por onde der, o petróleo e a guerra continuam a ser os motores de toda a economia capitalista e o estribo principal do imperialismo. Por isso, os grandes financeiros sabem que é preciso investir no esmagamento da resistência iraquiana, garantir o controlo efectivo do Afeganistão e da Palestina, instalar e proteger os oleodutos e promover gigantescos negócios já prontos e orçamentados. Na sua gíria característica, os capitalistas chamam a este quadro de intervenção, reconstrução do Iraque, quando melhor seria dizer reconstrução do Capitalismo. Sem vitória militar no Iraque, não haverá nova economia nos países ricos.
O tempo passa e a guerra marca passo. Os financeiros, minuciosos como são, conhecem bem os altos custos do tempo que se esbanja. As sofisticadas forças ocupantes fazem sortidas devastadoras mas logo regressam às bases. A aviação de combate lança, a esmo, as suas bombas terroristas. Os técnicos em segurança, prendem e torturam. Mas nada melhora. Com a passagem do tempo, as posições tendem a inverter-se. O atacante é atacado. A economia capitalista angustia-se com os altos e baixos do sagrado petróleo. Arrastam-se os velhos sonhos de uma Europa federada e ao serviço dos mais fortes. Os aliados chocam-se, dividem-se e revelam a verdadeira natureza dos interesses que os movem. E há um novo terror que se avizinha. Impelidos pelas suas contradições, EUA e Europa tendem ao isolacionismo, enquanto que o terrorismo que o capitalismo inventou, ameaça devorar os seus próprios criadores. Tudo isto, porque os tempos não correm de feição. O capitalismo minou com bolsas de pobreza os paraísos do grande capital.
O temporal também atingiu a igreja católica. No meio da desorientação generalizada, a sua hierarquia começa a perder capacidade política de intervenção. É repetitiva no método, não encontra o discurso adequado, revela-se enfadonha na comunicação. O novo papa é o retrato desse fatal imobilismo.
Veja-se como, desde a sua entronização, já perdeu tempo precioso, sempre a repisar os mesmos dogmas.

Novos evangelistas

Mas olhe-se outra vez o Iraque. Soberbos e insensatos, os politólogos americanos tomaram a decisão de fomentarem, no Médio Oriente, as lutas religiosas. Na peugada das colunas militares, começaram a entrar
na região verdadeiros bandos de novos evangelistas, formados entre as seitas norte-americanas. Dispõem de generosos orçamentos, gozam do apoio das forças de ocupação e propõem-se minar e dividir as forças religiosas iraquianas tradicionais, todas elas opostas entre si, em termos de culto, mas unidas na exigência da retirada das tropas invasoras. Organizam espectáculos de música rock, convidam iraquianos para excursões gratuitas, rezam nas praças públicas e exibem as encenações dos rituais das seitas, procurando promover a imagem da american way of life. São tições que os generais ianques lançam na fogueira dos ódios. Todos os credos vão sendo atingidos, justamente numa região onde a religião se confunde com o sentimento pátrio. Porque a ofensiva visa todos os credos. Procura-se impor o abandono imediato das tradições de culto das populações.
Se dermos nova guinada e voltarmos a Portugal, veremos que a confusão e o cepticismo também se instalaram entre os bispos. Em Junho, após um longo período de silêncio, a conferência episcopal publicou três notas pastorais num só dia. Duas delas falam de negócios (acordos imobiliários e questões que se prendem com a compra e venda de relíquias de Santa Teresa do Menino Jesus).
A terceira nota é mais extensa e refere-se à actual crise financeira do país. É decepcionante, até porque nada acrescenta ao que, nesta matéria, já foi afirmado pelos governantes e pelos empresários. Começa, aliás, com um passo em falso: os bispos dirigem-se ao Governo da Nação, a fórmula consagrada antes do 25 de Abril, durante o fascismo. Devem entender, os prelados, que houve mudanças. O Governo, agora, diz-se da República. Depois vem um acervo de banalidades e frases ocas, completamente à margem das realidades sociais e políticas. Fala-se em termos de reconciliação de classes, da harmonia dos valores e da esperança no futuro. Tudo em tom conventual. E, já no final do texto, os bispos produzem este curioso desafio: «desafiamos as Obras sociais da Igreja para uma maior fantasia da caridade! ». Terão os bispos consciência do que estão a propor?
São distintos na forma, mas semelhantes, no fundo, os episódios que se vivem no Iraque, em Portugal, em África, no G8 ou em qualquer ponto do globo que oponha pobres e ricos. É a luta de classes. Uma longa batalha que exige coragem e firmeza.


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