Ambiente e inovação

– Os automóveis dos chineses

Francisco Silva
O crescimento como até agora tem acontecido, consumista e ocidental, não é modelo para os outros – os do «antigo» Terceiro Mundo, ou do Sul – se desenvolverem, senão para onde iria a desgraça do nosso ambiente, até onde iria o esgotamento dos nossos recursos – perguntavam-se (perguntar-se-ão ainda) tantos bem pensantes ocidentais (e outros não tão bem pensantes), ocidentais, mesmo que japoneses, sulcoreanos, hongkonguianos, taiwaneses, singapurenses e outros que tais.
Mas o «seu» crescimento aí está. A superpesadíssima China – com uma população dez vez maior que o «gigantesco» Japão – cresceu no primeiro trimestre de 2005 a uma taxa rondando os 9,5%, mais do que em 2004, quando as vozes apontavam para o seu arrefecimento económico - que raio de termo! -, mas, até agora, parece, NADA! Bem pelo contrário.
Um crescimento que, em particular, vai atingindo já, diz-se, [muitas (?)] dezenas de milhões de pessoas com um desejo «consumista» aparentemente incoercível, de posse do famoso bem automóvel. Com o decorrer do tempo, e não tanto tempo assim – tanto tempo assim, podemos imaginá-lo, na verdade leva sempre menos tempo –, os automobilistas e automóveis na China, que já eram em 2004 mais de 20 milhões de unidades, quantidade com alguma importância – contudo, 1 automóvel por cada 65 pessoas, enquanto nos EUA há 1 automóvel por pessoa –, o número de carros a circular na China deverá atingir um nível que, mantendo-se a tecnologia o que é hoje, refinada aqui e acolá, o seu impacto no ambiente, e em necessários recursos para o seu fabrico, poderá atingir uma quantidade, dizíamos, incomportável, pelo menos aos olhos dos nossos pré-ocupados cidadãos.
A questão não estará tanto nos automóveis já existentes na China - ainda nem um décimo serão do total dos EUA. A questão está no crescimento do seu parque. Com efeito, enquanto no fim dos anos 90 se vendiam na China milhares de automóveis, em 2004 as vendas atingiram quase 3 milhões. Tendo passado a Alemanha em 2004, o mercado chinês de viaturas novas é já o terceiro maior do mundo, a seguir aos EUA e ao Japão. Os que fazem previsões – sempre falíveis, sabe-se muito mais que bem – afirmam que, nos próximos anos, no máximo até ao início da próxima década, a China ultrapassará o Japão e que, antes do fim dessa mesma próxima década, passará a primeiro mercado automóvel do mundo. Ou seja, dentro de uma dezena de anos, segundo os «melhores peritos», a China atingiria os 100 milhões de viaturas – 1 em cada 13 (15? - a população vai aumentando!) pessoas. Em termos absolutos de existências, um parque menor que os dos EUA, da Europa ou, ainda, do Japão, mas, de qualquer forma já da mesma ordem de grandeza.
Portanto, está aí uma oportunidade e um desafio para a indústria automóvel. Este é, porventura, «um acontecimento sem par desde…a invenção do motor de combustão», como escreve Erik Izraelewicz(1) . O problema da poluição poderá levar a acelerar a I&D e a uma viragem ecológica, tão rápida quanto possível, que contribua para resolver o problema ambiental, para além da questão da dependência petrolífera.
Com efeito, a defesa do ambiente passou a uma das primeiras prioridades. A agência de protecção ambiental viu, no plano quinquenal 2001-2005, duplicar os seus meios, agora 1,3% do PIB chinês. Definiu-se um quadro legal, desenvolvem-se vastas campanhas a favor do ar e da água, existe uma política de substituição do carvão pelo gás natural. É certo, cada chinês emite, em termos de gases de efeito de estufa, 1/10 de um europeu e 1/20 de um americano. Mas a China é já o segundo maior «emissor» do mundo, depois dos EUA. Sem mais, em 2008, chegaria ao dobro. Para espanto de muitos, propôs-se já a China a produzir 10% da sua energia, em 2010, de fontes renováveis. Estar-se-á na véspera da passagem do motor a gasolina ao de hidrogénio? Qual virá a ser o papel de veículos híbridos, prontos a trabalhar com gasolina e electricidade? E só a electricidade?
Que o Estado chinês atribui uma grande importância a estas questões, não será um sinal menor a sua vontade de erigir os Jogos Olímpicos de Pequim em «JO's verdes», estando previsto que os espectadores se desloquem através de uma rede de autocarros a hidrogénio. Ou ainda relembrar que o Salão Mundial de 2004, em Xangai, teve lugar logo após a primeira edição do Grande Prémio de Fórmula 1. Apenas acções de propaganda?


(1) Erik Izraelewicz (2005). “Quand la Chine change le monde”. Paris : Éditions Grasset & Fasquelle.


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