Comentário

A mudança que se exige

Ilda Figueiredo
Das eleições de 13 de Junho para o Parlamento Europeu, importa retirar algumas conclusões imediatas:
1ª - A estrondosa derrota da coligação governamental PSD/CDS é a conclusão mais clara da noite eleitoral deste último domingo. Foi o pior resultado da direita portuguesa nos últimos 28 anos. Com apenas 33, 2% dos votos, ou seja, pouco mais do que aquilo que o PSD conseguiu sozinho em 1999, perdeu dois deputados no Parlamento Europeu. O enorme descontentamento da maioria da população com a política governamental, bem visível de norte a sul do País, durante as muitas semanas que durou a pré-campanha eleitoral da CDU, fez-se sentir de forma muito forte nesta votação para o Parlamento Europeu. E não há abstenção que possa escamotear a dimensão deste enorme castigo. Até porque, como insistentemente ouvimos nas ruas, praças, mercados e à porta de empresas, muita desta abstenção é também um voto de protesto contra a política de direita. O desânimo de quem pensa que já não vale a pena votar, porque a política vai de mal a pior. Por vezes, com o nosso esclarecimento, a nossa insistência, foi possível retirar votos à abstenção, dar confiança, retomar uma ligação das pessoas com a política. Mas, em muitos casos, não se conseguiu, dada a própria forma abruptamente dramática como acabou a campanha, três dias antes da data oficial, após a tragédia da morte do Prof. Sousa Franco, cabeça de lista do PS.
2ª- O desejo de mudança foi, a seguir ao descontentamento, o sentimento mais comum que as pessoas exprimiram nos milhares de contactos que realizámos. Há um cansaço generalizado com uma política que agrava o desemprego, impede o emprego de milhares de jovens licenciados, agrava as condições de trabalho e de vida da maioria dos trabalhadores que, em muitos casos, se sentem entre a espada e a parede, receando consequências de uma luta na sua frágil estrutura familiar, dependente de empréstimos bancários e de prazos no pagamento de prestações de compras a crédito. Por sua vez, desestabiliza micro, pequenos e médios empresários, que vivem momentos difíceis com a diminuição das vendas, resultante do agravamento do custo de vida, os entraves no acesso ao crédito bancário, a crescente burocracia e o compadrio generalizado que sufoca e asfixia a nossa débil estrutura produtiva e comercial.
Os verdadeiros dramas humanos com que fomos sendo confrontados ao longo das visitas e nos inúmeros diálogos travados, mostrou as consequências da dimensão humana de uma política profundamente anti-social que está a minar os próprios alicerces da democracia social, que a revolução do 25 de Abril tinha ajudado a construir. São os idosos a quem a reforma mal chega para os medicamentos. São as mães e os jovens casais a quem o desemprego despedaça sonhos e ameaça estabilidade familiar. São as pessoas com deficiência que se sentem duplamente discriminadas. É a alimentação deficiente de cada vez mais famílias e a fome a aumentar em muitas outras. São as desigualdades crescentes de um País cada vez mais desigual. A sensação de impotência que muitas vezes senti perante os inúmeros dramas humanos, confirmou-me a necessidade de lutar, cada vez com maior determinação, por uma alternativa que possibilite a mudança o mais rapidamente possível.
3ª - As melhores condições para a luta foram sendo criadas ao longo do desenvolvimento da espantosa campanha de militância que a CDU promoveu. Foram muitos milhares os activistas que ao longo dos últimos três meses se empenharam na batalha do esclarecimento e da mobilização, alargando a base de contactos, distribuindo documentos, colocando propaganda nas ruas, sendo a televisão que não tínhamos. Perante uma comunicação social de massas profundamente adversa e discriminatória, que há muito tinha decidido eleger um deputado do BE à custa da CDU, questão só parcialmente ultrapassada nas duas últimas semanas da campanha eleitoral, valeu a militância dos comunistas e outros activistas da CDU, merecendo também destaque a comunicação social regional e local que foi dando cobertura às inúmeras visitas, reuniões, debates e contactos realizados, sobretudo durante o último ano.
Importa, pois, agora, aproveitar este movimento de mobilização de milhares de pessoas para lutar pela mudança que se impõe na política portuguesa, concretizar propostas e defender soluções na defesa do interesse nacional, numa posição patriótica que afirme a importância de Portugal, e numa estratégia negocial que promova os interesses portugueses nas políticas europeias, seja na defesa da produção e do emprego com direitos, seja por novas políticas sociais, por uma Europa mais justa, mais democrática e solidária, empenhada na cooperação e na paz. Os dois deputados agora novamente eleitos pela CDU vão continuar esta luta, aqui e no Parlamento Europeu.


Mais artigos de: Europa

Voto de protesto

As eleições para o Parlamento Europeu, que decorreram entre quinta-feira e domingo, 10 e 13, deram um claro sinal descontentamento com as políticas anti-sociais prosseguidas pela generalidade dos governos da UE.

A voz da esquerda na Europa

Num Parlamento Europeu que continuará a ser dominado por forças da direita, com relevo para o Partido Popular Europeu, que segundo as actuais projecções contará com 276 deputados, contra 201 do Partido Socialista Europeu, seguidos dos Liberais (66) e Verdes (42), o Grupo Confederal da Esquerda Unitária Europeia/Esquerda...