Seis mil manifestaram-se em Lisboa

Estudantes do superior em greve hoje

Isabel Araújo Branco
Realiza-se hoje, quinta-feira, uma greve nacional dos estudantes do ensino superior. Na semana passada, seis mil estudantes manifestaram-se em Lisboa contra a política educativa do Governo.

Os estudantes pediram a demissão do Governo de Durão Barroso

O percurso entre a Cidade Universitária e a Assembleia da República foi percorrido com grande animação pelos seis mil estudantes universitários e politécnicos que se manifestaram em Lisboa, na semana passada, no Dia do Estudante, 24 de Março.
Juntaram-se estudantes de quase todas as cidades onde existem pólos universitários, mostrando que a contestação ao Governo é partilhada por todos. Lisboa, Coimbra, Porto, Évora, Braga, Guimarães, Setúbal, Viseu, Covilhã, Faro, Bragança, Leiria e Caldas da Rainha estiveram presentes e muitos foram os estudantes que pediram a demissão do Governo, devido às suas políticas para o sector.
Os estudantes sublinham a necessidade de valorizar a população cultural, social e tecnologicamente e dizem que não querem ver negado aos jovens o direito a estudar no ensino superior. Por isso, protestam contra a Lei de Financiamento e o aumento das propinas, a saída dos estudantes dos órgãos de gestão das instituições, o regime de prescrições, a degradação das escolas e a falta de materiais. Exigem ainda o aumento da qualidade do ensino, um sistema de acção social escolar eficaz e a resolução da falta de saídas profissionais.
Apitos, palmas, cantigas, palavras de ordem e por vezes algumas corridas marcaram o desfile. «A propina dói», cantavam em coro os estudantes da Universidade de Évora, Mais à frente, alunos de Lisboa diziam que «Nem mínima, nem máxima, revogação já!».
Num prédio na Rua Braancamp foram expostos cartazes de apoio a Durão Barroso por uns anónimos esquivos, escondidos atrás de uma janela. Os manifestantes não deixaram de responder à provocação. «Vocês são uma vergonha!», gritaram.
No final da manifestação, na escadaria da Assembleia da República, dirigentes associativos falaram sobre o protesto com Odete Santos e Bruno Dias. Os deputados do PCP manifestaram o apoio do Grupo Parlamentar às reivindicações estudantis.

Trabalhadores-estudantes

Os trabalhadores-estudantes também estiveram presentes e o seu núcleo da Universidade de Coimbra distribui panfletos explicando que lhes foram retirados direitos no Código do Trabalho.
Contabilizando os trabalhadores-estudantes em cerca de 20 mil, o núcleo sublinha que este imenso grupo não recebe bolsas de estudo e frequentemente não pode ir às aulas devido aos seus horários de trabalho e por não existirem aulas nocturnas na maioria das escolas superiores públicas.
«Muitos estudantes que não são formalmente trabalhadores são obrigados a fazer trabalhos em part-time para custear os seus estudos em bares e pizzarias, como baby sitters, etc. São poucas as famílias de trabalhadores que conseguem ter a estudar dois ou três filhos no ensino superior. Serão precisamente estes trabalhadores-estudantes que irão sofrer as consequências do regime de prescrições, porque os papás dos tais meninos da boémia e com muitas matrículas, esses podem pagar», afirma o núcleo.

Governo Civil «imita Estado Novo»

A PSP está a investigar os promotores da manifestação dos estudantes do enino superior para os acusar de desobediência pública, por o protesto não ter sido autorizado pelo Governo Civil de Lisboa. As forças policiais «não impediram a realização da manifestação para não criar uma situação de alteração da ordem pública, mas foi levantado um auto de notícia pelo crime de desobediência pública e, a partir daqui, vai decorrer um inquérito para apurar os responsáveis», afirmou à Lusa o sub-intendente Neto Gouveia.
As associações de estudantes que promoveram a manifestação, por seu lado, acusam o Governo Civil de proibir todos os protestos que «não vão ao encontro da sua ideologia», lembrando que a manifestação «Pró Vida», realizada a 3 de Março contra a despenalização do aborto, foi autorizada.
«Este órgão de soberania só começou a proibir os protestos estudantis quando passou a ter como responsável máximo militantes de um partido que não se revê na Constituição da República. Concluímos que o Governo Civil tentou imitar o Estado Novo, quando, há precisamente 42 anos, no dia 24 de Março de 1962, também tentou proibir a Comemoração do Dia Nacional do Estudante», afirmam as AEs, num comunicado.
No ano passado, a manifestação do ensino superior realizada a 2 de Abril também não foi autorizada. Foi a primeira vez que isso aconteceu após o 25 de Abril. «No dia 31 de Março, à noite, a polícia dirigiu-se a casa do dirigente associativo responsável pelo contacto com o Governo Civil, com uma notificação que dizia que, se a manifestação prosseguisse, ele seria acusado de desobediência qualificada», recordam.
Desde então, nenhum protesto estudantil foi autorizado pelo Governo Civil da capital, usando como argumento o decreto-lei n.º 406/74 – anterior à Constituição –, que define que «os cortejos e desfiles só poderão ter lugar aos domingos e feridos, aos sábados depois das 12 horas e nos restantes dias depois das 19h30». O decreto refere ainda que as autoridades «poderão, por razões de segurança, impedir que se realizem reuniões, comícios, manifestações ou desfiles em lugares públicos» situados a menos de 100 metros das sedes dos órgãos de soberania, instalações e acampamentos militares, estabelecimentos prisionais, representações diplomáticas e sedes de partidos.
«Muitos juristas entendem que o decreto-lei deixou de fazer sentido desde a aprovação da Constituição. Contudo, o Governo Civil continua a recorrer a ele sempre que há uma manifestação de estudantes», salientam as AEs.
Os estudantes argumentam que mesmo que o pedido de autorização da manifestação fosse assinado por três promotores identificados pelo nome, profissão e morada – outro requisito do decreto-lei –, «ela seria proibida por causa do horário». «Este facto foi comentado com um responsável do Governo Civil que, após uma longa conversa telefónica, acabou por dar razão aos estudantes», acrescentam.
As AEs – «não querendo que nenhum estudante fosse alvo de um processo de desobediência qualificada» – informaram o Governo Civil da realização do protesto através de um fax.


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