Segurança Interna

Um balanço negro

José Martins
Um exame sumário de 18 meses de Governo Barroso/Portas é descobrir um mundo de incompetência, de irresponsabilidade e reaccionarismo que atinge todos os sectores e subsectores da Administração Interna.
É a existência de uma equipa, que na ânsia de controlar tudo e todos (fruto de uma mentalidade atrasada e reaccionária), encontra-se distanciada e desqualificada para compreender e intervir sobre a realidade desta área. As medidas tomam-se e as reestruturações fazem-se segundo as conveniências partidárias e ideológicas e não em função do interesse nacional. O resultado está à vista de todos e de forma dolorosa para o País e para os portugueses: os incêndios, a sinistralidade rodoviária, o aumento em flecha da criminalidade, a expulsão de milhares de imigrantes, a militarização das forças de segurança, a privatização e perversão das funções de segurança, os conflitos e as demissões, o descontentamento e a revolta nas instituições policiais e os atentados permanentes aos direitos, liberdades e garantias dos portugueses.
Uma política deliberadamente irresponsável como a que está a ser implementada nesta área tem um triplo efeito: desarticula o dispositivo, retira eficácia e atinge a segurança e bem-estar dos portugueses.

Um caminho perigoso

Acresce a esta situação, já de si grave e preocupante, a atribuição à instituição militar da capacidade para intervir na segurança interna e a entrega às forças de segurança de meios e responsabilidades para actuarem fora do território nacional. O governo ao inverter o quadro jurídico-constitucional em que estas instituições vivem e funcionam, está a abrir um perigoso caminho da sua utilização indiscriminada na repressão dos movimentos e lutas sociais.
Com estas velhas e bolorentas receitas e opções, o que pretende este governo não é tornar mais eficaz a actuação das forças policiais no quadro das suas missões constitucionais, de polícia, de segurança e protecção dos cidadãos. Mas torná-las mais interventivas (repressivas) nos conflitos laborais e nas lutas sociais, que legitimamente se travam contra a sua política impopular e de terra queimada.
É o percorrer de um caminho inverso àquele que é exigido pelas necessidades objectivas do país e dos cidadãos em matéria de segurança interna e na segurança pública.
Foi manifesta a intenção deste governo e da equipa à frente do MAI, neste período, de deixar degradar a segurança pública e que teve como consequências mais directas, a diminuição da capacidade preventiva das forças de segurança e o quase abandono dos programas integrados de polícia de proximidade – Escola Segura, Idosos em Segurança, Comércio Seguro, etc., o aumento da criminalidade violenta em 20% e o regresso do sentimento de insegurança às áreas metropolitanas de Lisboa e Porto.
É sintomático deste panorama de completa desordem, o facto da sociedade estar confrontada com cerca de 3 mil crimes por dia que vitimam os cidadãos; que em Lisboa e Porto ( em qualquer hora do dia e da noite) existe apenas 1 agente policial para cerca de 4 mil habitantes, ao mesmo tempo que 23 mil agentes, formados e qualificados, estejam compulsivamente ocupados em funções administrativas ou acantonados em forças de reserva.
Igualmente, contribuindo para este estado de coisas, está o Orçamento do ministério, onde na parte referente à segurança pública e forças de segurança representa um autêntico embuste, já que significa cortes gravosos nos investimentos em áreas nevrálgicas do combate ao narcotráfico, vigilância da fronteira marítima, na prevenção e luta contra a delinquência, na formação e nos equipamentos e na segurança dos cidadãos. O PIDDAC, que é um instrumento decisivo do investimento e suporte de muitos programas que estavam em desenvolvimento, sofreu um corte de 126,3 milhões de euros.
Quando uma esquadra da PSP ou um posto da GNR não possuem os meios de financiar o seu próprio funcionamento em material básico, como: o papel higiénico, papel de fotocópias e gasóleo, como podem dar respostas a questões fundamentais, como é a segurança dos cidadãos?

Receitas rígidas

A segurança interna e as polícias são vítimas de receitas rígidas e reaccionárias, às quais esta direita no poder é incapaz de se despegar.
Mas do que verdadeiramente se trata é de alterar as políticas e o rosto das polícias que se pretendem democráticas, mormente em aspectos centrais, como: a vertente civilista das forças e serviços de segurança e a democratização das suas estruturas; segurança de proximidade e comunitária e policiamento preventivo e próximo dos cidadãos: a afectação dos agentes, meios e equipamentos às missões de segurança públicas, a cooperação e articulação policiais; o direito de participação das populações nas questões de segurança; e a atribuição aos agentes policiais de um estatuto igual que determine formação e remuneração dignas e o exercício de direitos cívicos em correspondência com os demais cidadãos.
Há muito que, no quadro do regime democrático, não existe justificação para a continuidade de «forças de primeira linha» nas forças de segurança. As incursões monárquicas tiveram o seu fim no início do século passado e a defesa da República é da incumbência, em primeira instância, das Forças Armadas.
É assim, perigoso e preocupante, continuar-se a alimentar e a encarar como natural a imposição à GNR de um estatuto militar (de todo inconstitucional), acentuando a confusão entre aquilo que é política de segurança e política de defesa. E os resultados mais evidentes, desta deliberada confusão, estão já à vista. O esvaziamento no plano interno das funções legítimas e constitucionais das forças de polícia (caso da GNR ) e no plano externo, a sua utilização imoral e ilegítima em missões de projecção de força e de preponderância militar.
É visível, em todo este quadro, que a política do Governo Barroso/Portas de partidarização e instrumentalização desta área (aliás, como aconteceu em anteriores governos do PSD) prevalece sobre os objectivos e aspirações de segurança dos cidadãos, de dignificação das funções dos agentes policiais, da eficácia da actuação e qualidade do serviço policial prestado às comunidades.

Política irresponsável

A persistência, por parte do Governo, em manter uma política irresponsável e reaccionária numa área tão sensível como a Administração Interna, e perante a passividade incompreensível de outros órgãos de soberania, é estarmos a assistir ao fenómeno perigoso da bola de neve, sem qualquer mecanismo de travagem. A manutenção do actual ministro e da sua equipa (a pior de sempre) à frente desta área e a perda de mais tempo no tocante às medidas que deveriam de ser tomadas, pode ter consequências irreversíveis e perversas.
As questões relacionadas com a segurança interna porque é matéria do interesse nacional, deveria ser objecto obrigatório de debate nacional e não ficar dependente dos desígnios conjunturais de um governo.
É importante acções (intervenção) que possam abrir caminho para que as forças e serviços de segurança encontrem o seu natural enquadramento funcional (serviço público), clarificação da sua missão (protecção dos cidadãos e seus haveres, prevenção e combate à criminalidade), formação cívica e democrática, moderna e bem equipada tecnologicamente e adaptada a um país pequeno e de fracos recursos financeiros, como é Portugal.
A defesa a tout court do modelo francês na organização das forças de segurança é a prova da total incapacidade deste governo e deste ministro na implementação de um modelo mais adequado e de acordo com as especificidades e realidades do país. Portugal não é a Espanha e muito menos a França!
Este governo e este ministro têm a liberdade para continuar a iludir e a mentir aos portugueses; nós continuamos a ser livres para desmenti-los e para demiti-los!.


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