Mais uma «vitória»...
E à terceira foi de vez. No passado dia 26 de Junho, os ministros da agricultura chegaram a um acordo político sobre a reforma da Política Agrícola Comum (PAC). Deu-se assim um passo derradeiro na liberalização dos mercados agrícolas e na progressiva renacionalização da PAC. Apesar de todas as dificuldades, o compromisso estava à vista com o acordo franco-alemão.
O acordo final é uma versão mais mitigada da reforma proposta pela Comissão, mas Fischler conseguiu salvar os elementos centrais da proposta, nomeadamente a desvinculação das ajudas à produção, fundamental para fazer avançar as negociações agrícolas no âmbito da Organização Mundial de Comércio. Um «trunfo negocial» importante, quando se pretende usar o sector agrícola como moeda de troca de outros interesses, nomeadamente a liberalização do investimento, dos contratos públicos e dos serviços.
Completa-se assim, o caminho encetado pela reforma da PAC de 1992 (governo PSD), no sentido da desvinculação das ajudas, com o progressivo desmantelamento dos mecanismos de regulação de mercado e a introdução de pagamentos directos nas principais organizações comuns de mercado (OCM), posteriormente aprofundado com a reforma de 1999 (governo PS).
PAC, anticoesão
O acordo obtido não só não aumenta as ajudas aos pequenos agricultores (que representam quase 80% dos agricultores e recebem menos de 20% do total das ajudas), como a redução linear das ajudas atinge sem distinção os grandes e médios agricultores. A redistribuição comunitária das ajudas é posta em causa com a introdução de um limiar mínimo de 80% de retorno das poupanças efectuadas ao Estado-membro de origem. Ficam agora disponibilizados para redistribuição comunitária, em média, cerca de €230 milhões anualmente, face aos €950 milhões da proposta da Comissão. O acordo final confirma que não serão melhoradas as ajudas para as OCM mediterrânicas (frutas e legumes, vinho e azeite), ao afirmar que a revisão destas será baseada nos objectivos e na abordagem da actual reforma da PAC, mantendo-se assim a injustiça face às produções continentais. É introduzido um mecanismo de «disciplina orçamental» que implica a redução automática das ajudas directas no caso de ultrapassagem do tecto orçamental, confirmando a decisão do Conselho Europeu de Bruxelas (Outubro 2002) de congelar das despesas com as OCM.
Assim, irão manter-se e ao que tudo indica agravar-se, as actuais injustiças na redistribuição das ajudas entre países, produções e produtores. A PAC vai continuar a ser uma política anticoesão.
«Vitórias» antigas
Apesar de Portugal não ser ter juntado ao compromisso final da presidência, não deixa de ser caricato que o ministro Sevinate Pinto, tenha considerado «fantástico» o resultado obtido, afirmando «ter alcançado os principais objectivos negociais». Caricato, não só porque de uma má proposta não se poderia esperar grande coisa, como o acordo fica longe dos objectivos delineados pelo ministro, nomeadamente o reequilibro da distribuição das ajudas e o aumento das quotas de produção, que, de acordo com o próprio, «congelam o subdesenvolvimento agrícola em Portugal».
As «vitorias» apresentadas - mais €168 milhões anuais - não só ficam aquém do mínimo necessário, como representam recuos negociais significativos, face àquilo que já se dava por adquirido. Dos 90 mil direitos adicionais para vacas aleitantes, 51 mil estavam já em parte garantidos, através do programa de reconversão de cereais por carne de bovino. Em relação à quota do leite dos Açores, o que se obteu foi uma quantidade de referência adicional de mais 50 mil toneladas (Grécia obteve mais 120 mil toneladas), quando o mínimo indispensável era de 73 mil toneladas e o próprio governo exigia as 100 mil toneladas.
Por último, os €33 milhões de transferências líquidas anuais para o desenvolvimento rural, ficam muito aquém da já parca proposta da Comissão, e são manifestamente insuficientes face às necessidades, quando Portugal não só é um dos Estados-Membros que menos recebe da PAC, como é contribuinte líquido da mesma. Esta transferência para o desenvolvimento rural levanta questões, como: vai o governo ter a capacidade (ou vontade) de disponibilizar o co-financiamento nacional destas medidas? Irão estas medidas ser usadas para compensar os grandes agricultores pelas reduções decorrentes da degressividade?
Há muito que é necessária uma profunda reforma da PAC, que tenha em conta a diversidade das agriculturas europeias e as suas especificidades. Uma reforma baseada nos princípios da soberania alimentar, da segurança alimentar e da preferência comunitária, que reequilibre a distribuição das ajudas, através da aplicação da modulação e do plafonamento, e que promova o desenvolvimento dos mercados locais. Uma reforma que retire a agricultura dos ditames da OMC. Com o actual acordo, a agricultura portuguesa sofre mais um revês. Já se tornou hábito, cada «vitória» negocial de um ministro se traduz numa derrota para a agricultura portuguesa, sobretudo para os pequenos e médios agricultores e a agricultura familiar. Nada de novo. O mesmo aconteceu em 1992 e em 1999. Mais uma reforma feita à medida dos grandes agricultores e da agro-indústria.
O acordo final é uma versão mais mitigada da reforma proposta pela Comissão, mas Fischler conseguiu salvar os elementos centrais da proposta, nomeadamente a desvinculação das ajudas à produção, fundamental para fazer avançar as negociações agrícolas no âmbito da Organização Mundial de Comércio. Um «trunfo negocial» importante, quando se pretende usar o sector agrícola como moeda de troca de outros interesses, nomeadamente a liberalização do investimento, dos contratos públicos e dos serviços.
Completa-se assim, o caminho encetado pela reforma da PAC de 1992 (governo PSD), no sentido da desvinculação das ajudas, com o progressivo desmantelamento dos mecanismos de regulação de mercado e a introdução de pagamentos directos nas principais organizações comuns de mercado (OCM), posteriormente aprofundado com a reforma de 1999 (governo PS).
PAC, anticoesão
O acordo obtido não só não aumenta as ajudas aos pequenos agricultores (que representam quase 80% dos agricultores e recebem menos de 20% do total das ajudas), como a redução linear das ajudas atinge sem distinção os grandes e médios agricultores. A redistribuição comunitária das ajudas é posta em causa com a introdução de um limiar mínimo de 80% de retorno das poupanças efectuadas ao Estado-membro de origem. Ficam agora disponibilizados para redistribuição comunitária, em média, cerca de €230 milhões anualmente, face aos €950 milhões da proposta da Comissão. O acordo final confirma que não serão melhoradas as ajudas para as OCM mediterrânicas (frutas e legumes, vinho e azeite), ao afirmar que a revisão destas será baseada nos objectivos e na abordagem da actual reforma da PAC, mantendo-se assim a injustiça face às produções continentais. É introduzido um mecanismo de «disciplina orçamental» que implica a redução automática das ajudas directas no caso de ultrapassagem do tecto orçamental, confirmando a decisão do Conselho Europeu de Bruxelas (Outubro 2002) de congelar das despesas com as OCM.
Assim, irão manter-se e ao que tudo indica agravar-se, as actuais injustiças na redistribuição das ajudas entre países, produções e produtores. A PAC vai continuar a ser uma política anticoesão.
«Vitórias» antigas
Apesar de Portugal não ser ter juntado ao compromisso final da presidência, não deixa de ser caricato que o ministro Sevinate Pinto, tenha considerado «fantástico» o resultado obtido, afirmando «ter alcançado os principais objectivos negociais». Caricato, não só porque de uma má proposta não se poderia esperar grande coisa, como o acordo fica longe dos objectivos delineados pelo ministro, nomeadamente o reequilibro da distribuição das ajudas e o aumento das quotas de produção, que, de acordo com o próprio, «congelam o subdesenvolvimento agrícola em Portugal».
As «vitorias» apresentadas - mais €168 milhões anuais - não só ficam aquém do mínimo necessário, como representam recuos negociais significativos, face àquilo que já se dava por adquirido. Dos 90 mil direitos adicionais para vacas aleitantes, 51 mil estavam já em parte garantidos, através do programa de reconversão de cereais por carne de bovino. Em relação à quota do leite dos Açores, o que se obteu foi uma quantidade de referência adicional de mais 50 mil toneladas (Grécia obteve mais 120 mil toneladas), quando o mínimo indispensável era de 73 mil toneladas e o próprio governo exigia as 100 mil toneladas.
Por último, os €33 milhões de transferências líquidas anuais para o desenvolvimento rural, ficam muito aquém da já parca proposta da Comissão, e são manifestamente insuficientes face às necessidades, quando Portugal não só é um dos Estados-Membros que menos recebe da PAC, como é contribuinte líquido da mesma. Esta transferência para o desenvolvimento rural levanta questões, como: vai o governo ter a capacidade (ou vontade) de disponibilizar o co-financiamento nacional destas medidas? Irão estas medidas ser usadas para compensar os grandes agricultores pelas reduções decorrentes da degressividade?
Há muito que é necessária uma profunda reforma da PAC, que tenha em conta a diversidade das agriculturas europeias e as suas especificidades. Uma reforma baseada nos princípios da soberania alimentar, da segurança alimentar e da preferência comunitária, que reequilibre a distribuição das ajudas, através da aplicação da modulação e do plafonamento, e que promova o desenvolvimento dos mercados locais. Uma reforma que retire a agricultura dos ditames da OMC. Com o actual acordo, a agricultura portuguesa sofre mais um revês. Já se tornou hábito, cada «vitória» negocial de um ministro se traduz numa derrota para a agricultura portuguesa, sobretudo para os pequenos e médios agricultores e a agricultura familiar. Nada de novo. O mesmo aconteceu em 1992 e em 1999. Mais uma reforma feita à medida dos grandes agricultores e da agro-indústria.