Democracia «a la carte»

Gustavo Carneiro

Os Estados Unidos e a União Europeia estão preocupados com a democracia na Bielorrússia. A tese da última ditadura da Europa volta agora em força, martelada pela comunicação social dominante – ou, antes, dominada pelo imperialismo.

Mas esta crónica não é sobre a Bielorrússia, nem sequer sobre mais uma revolução colorida que ali estará em preparação, seguindo o mesmo guião de outras. É sobre democracia ou, melhor dizendo, sobre o que o imperialismo realmente quer dizer quando fala em democracia. E isso nada tem a ver com votos, direitos ou liberdades, mas antes com liberalizações, privatizações, despedimentos e exploração e com submissão política, económica e militar. E, no caso do Leste Europeu, acresce o total alinhamento com o cerco político, económico, diplomático e militar contra a Federação Russa.

Esta democracia, de facto, não se encontra na Bielorrússia, onde sectores produtivos, direitos e postos de trabalho herdados do socialismo foram defendidos e se impediu a entrada da NATO e da União Europeia no país e a sua transformação numa lança apontada ao vizinho russo. É esta ditadura que o imperialismo não tolera. O resto, seja lá qual for, interessa-lhe pouco…

Ali ao lado, na vizinha Ucrânia, o Estado foi tomado de assalto pela extrema-direita abertamente fascizante, que não só recuperou símbolos e heróis do colaboracionismo com a ocupação nazi, como lhe copia o estilo: em 2014, dezenas de pessoas morreram carbonizadas na Casa dos Sindicatos de Odessa, num incêndio perpetrado de modo premeditado por grupos paramilitares neonazis, que não só não pagaram por esse e outros crimes como constituem hoje a Guarda Nacional, ramo oficioso das forças militares e repressivas do país, treinada e apetrechada pela NATO.

Da Ucrânia, porém, dizem EUA e UE (e amplificam os media ao seu serviço) tratar-se de um país finalmente democrático – mesmo que o Partido Comunista não possa concorrer a eleições, as suas sedes sejam assaltadas e militantes seus assassinados, que a pobreza e as injustiças alastrem, que a guerra dilacere regiões e comunidades inteiras e que a própria independência e integridade do país sejam cada vez mais uma miragem. Como tantos exemplos demonstram, é no caos que a democracia do imperialismo se dá melhor!

Nesta democracia, onde nunca coube Lukachenko, é aceitável que haja um golpe de Estado na Bolívia patrocinado por Elon Musk (dono da Tesla e da SpaceX) para deitar a mão ao lítio, que se imponha à Venezuela um presidente interino capaz de dar uma aparência legítima ao saque de riquezas e recursos do país, que se cubra de verniz respeitável fascistas e fundamentalistas de todo o tipo.

É a democracia dos senhores!




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