Leninegrado: martirizada insubmissa e heróica

Gustavo Carneiro

Em Leninegrado lutou-se até ao fim em defesa da liberdade e da vida

Leninegrado, berço da primeira revolução socialista vitoriosa, foi agraciada após a Segunda Guerra Mundial com o título de Cidade Heróica. Esta condecoração, concedida igualmente a Moscovo, Stalinegrado, Minsk, Kiev, Odessa, Sebastopol, Novorossisk, Kerch, Tula e à fortaleza de Brest, destacava o extraordinário valor e heroísmo massivo dos seus defensores face aos ocupantes nazi-fascistas.

Da epopeia de Leninegrado disse o jornalista norte-americano Harrison Salisbury que o «clímax de tragédia e de bravura» ali atingido «supera a nossa capacidade de compreensão». Cercada durante quase 900 dias, Leninegrado nunca foi conquistada e tamanha insubmissão teve um elevado custo: dos três milhões de habitantes, um milhão morreu durante o cerco – de fome, de frio ou sob as bombas alemãs. A estes somam-se os 300 mil soldados que deram a vida para defender e libertar a cidade.

Se resumidos desta forma os feitos da heróica Leninegrado são já notáveis, as estórias que compõem esta História são, simplesmente, impressionantes.

Nas semanas e meses que antecedem o ataque, mais de um milhão de leninegradenses prepararam a defesa da sua cidade, trabalhando dia e noite, por vezes sob fogo inimigo: ao todo, cavaram 550 quilómetros de valas antitanques e 25 500 de trincheiras abertas, ergueram cercas de arame farpado, colocaram inúmeros obstáculos naturais e construíram 5000 ninhos de metralhadoras e postos de combate em madeira e em betão. Ao mesmo tempo, toda a cidade era armadilhada.

Defender a vida

As ordens de Hitler relativamente a Leninegrado (como, a Moscovo) eram claras: não poupar a cidade, que deveria ser «varrida da face da terra». Entre os que capitulassem ou fugissem só uns deveriam ser poupados, os que se dirigissem mais para o interior do país, pelo caos que tal poderia gerar nas hostes soviéticas. Todos os outros deveriam ser pura e simplesmente eliminados.

Da parte dos resistentes, a situação foi colocada nos seguintes termos pelos principais dirigentes locais do Partido Comunista da União Soviética, Vorochilov e Jdanov: «ou a classe operária de Leninegrado será escravizada e verá exterminados os seus melhores filhos ou transformaremos esta cidade no túmulo dos fascistas.» Como um só, o povo de Leninegrado optou pela defesa da liberdade e a vida isolado pela força , com parcos recursos alimentares e energéticos, enfrentando invernos rigorosos e bombardeamentos constantes, impediu a invasão da cidade e assegurou a sua subsistência o tempo necessário até à libertação, consumada a 27 de Janeiro de 1944, após as vitórias decisivas do Exército Vermelho em Moscovo, Stalinegrado e Kursk.

Coragem e muito mais

Dimitri Pavlov, que durante o cerco trabalhou na área estratégica dos abastecimentos militares, explica o segredo de tamanha resistência. Leninegrado, garantiu, aguentou-se porque a população, «escorada pelas tradições da Revolução e devotada até ao último alento à pátria socialista e ao Partido Comunista, lutou até à morte pela sua cidade. Todo o país, todo o povo soviético lhe prestou auxílio moral e material. A atenção que o Comité Central do Partido Comunista da União Soviética e o Governo Soviético concederam à cidade e à situação dos seus habitantes constituiu uma fonte perene de energias para os leninegradenses. O Comité Central do Partido Comunista orientou a luta dos defensores da cidade do primeiro até ao último dia do cerco».




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