A consequência lógica<br>da privatização da PT
Por toda a Europa, ao mesmo tempo que são impostos pesados sacrifícios aos trabalhadores e aos povos, estão em curso gigantescos processos de acumulação e concentração capitalista com fusões e aquisições de grandes empresas.
Com a privatização da PT, o Estado perdeu um instrumento estratégico na economia
É à luz desta realidade – inseparável da actual fase da crise do capitalismo – e do processo de privatização de sectores estratégicos que devemos analisar a operação em curso de aquisição pela Telefónica (espanhola) da participação da Portugal Telecom na empresa Vivo (brasileira).
O (des)conhecido percurso da PT
A Portugal Telecom – uma das maiores empresas do País – foi moldada durante anos para ser entregue aos grupos económicos privados. Resultou da segmentação em 1992 dos CTT – Correios e Telégrafos de Portugal, com a separação da componente das telecomunicações do serviço postal, e da posterior fusão em 1994 de três empresas públicas do sector das telecomunicações: Telecom Portugal, TLP (Lisboa e Porto), TDP (Teledifusão), a que se associava ainda o controlo de 51% da Marconi (comunicações internacionais).
Um ano depois, em 1995, era então primeiro-ministro o agora Presidente da República, Cavaco Silva, iniciou-se a privatização da empresa.
Quinze anos volvidos, a PT é hoje uma empresa cotada em bolsa (com um valor de capitalização bolsista de cerca de 8 mil milhões de euros) e onde o Estado detém pouco mais de 7% por via da CGD. Mas o dado mais significativo é que mais de 75% da sua propriedade se encontra nas mãos de capital estrangeiro. O conjunto dos grupos económicos nacionais detém o restante, com destaque para o Grupo Espírito Santo, Visabeira, e Controlinvest.
Com a privatização da empresa – ao longo de 5 fases distintas até ao ano 2000 – o Estado perdeu receitas e um instrumento estratégico na economia. A lógica de investimentos e os objectivos da principal operadora de telecomunicações em Portugal alteraram-se. Os investimentos na modernização e desenvolvimento das infra-estruturas nacionais ou a prestação de serviço público a que está obrigada foram substituídos pela maximização do lucro – 2300 milhões de euros entre 2007-2009 –, com o consequente agravamento da exploração dos mais de 10 mil trabalhadores cada vez mais confrontados com a precariedade, a redução de salários e a generalização da subcontratação. A penalização de milhões de consumidores e de milhares de pequenas empresas veio por arrasto.
A chamada política de internacionalização da empresa, que está na origem dos mais de 7 mil milhões de euros de dívidas que esta contraiu para a realização de operações no estrangeiro, designadamente a aquisição de uma parte da operadora Vivo no Brasil, subverteu ainda mais a lógica e as prioridades da PT.
Pelo caminho ficou ainda a tentativa de aquisição por parte do grupo SONAE em 2007 que, independentemente de objectivos próprios, funcionou como testa-de-ferro de grupos económicos estrangeiros. Operação cuja factura – remuneração dos accionistas – está ainda hoje a ser paga pelo conjunto dos trabalhadores e por milhões de clientes.
Não foi certamente a pensar no «interesse nacional» que PS, PSD e CDS caucionaram cada um dos passos deste processo, mas sim nos interesses dos grupos económicos privados, nas clientelas que as privatizações geraram, em todo o tipo de serviços decorrentes das relações promíscuas entre poder político e económico.
Aqui chegados, três apontamentos:
Primeiro: a operação agora em curso com vista à aquisição por parte da Telefónica da participação da PT na Vivo é – na continuidade de um percurso de sujeição da estratégia da empresa aos interesses do grande capital e no quadro de uma situação internacional marcada pela crescente especulação financeira onde diariamente se jogam os interesses dos povos (português, espanhol, brasileiro,…) – uma consequência da conjugação do processo de privatizações com a fase de acumulação e concentração capitalista que está em curso. E que tenderá, a não ser interrompida, a transferir para fora do nosso país outras empresas e sectores estratégicos como é o caso dos CTT, cuja privatização está prevista no PEC.
Segundo: a inaceitável contestação pela União Europeia da utilização da golden share – instrumento criado no decurso das privatizações para iludir a efectiva transferência para o capital privado do controlo estratégico da empresa – pelo Estado português, que inviabilizou até ao momento a concretização dessa operação, vem tornar ainda mais claro o papel da UE enquanto estrutura ao serviço dos monopólios mas, sobretudo, a firme convicção de que as questões da defesa da soberania são inseparáveis da luta pelo desenvolvimento económico.
Por último: dê-se as voltas que se quiser dar, a questão central que todo este processo vem revelar é a da necessidade do controlo público dos sectores básicos e estratégicos da nossa economia como única garantia de defesa dos interesses nacionais. A recuperação da PT para as mãos do Estado afirma-se como uma necessidade para o País, como um objectivo de luta não apenas dos comunistas mas de todos os democratas e patriotas que querem um Portugal com futuro.