Decompondo o «rearmamento» (II)
Vamos, neste artigo, continuar a empreitada que começámos há três semanas, de decomposição do chamado «rearmamento» da UE. «Rearmamento» que querem agora com outro nome, menos «carregado», mas cujos objectivos e fundamentos se mantêm intactos.
Se na nossa última crónica nos referimos a 650 mil milhões de euros dos 800 mil milhões, iniciaremos esta crónica decompondo os 150 mil milhões em falta.
Estes 150 mil milhões de euros provirão de empréstimos aos Estados-Membros. Para tal, a Comissão propõe a ida aos mercados para se financiar dando como garantia o Orçamento da UE. É uma repetição no Next GenerationEU, instrumento utilizado para financiar os PRR. No entanto, este instrumento está condicionado a que os valores emprestados sejam utilizados ou para financiar o prolongamento da guerra no Leste europeu ou para compras conjuntas de material militar.
Recordemos o processo de financiamento do chamado Mecanismo de Recuperação e Resiliência e os efeitos no orçamento da UE. Apesar de o pagamento do capital em dívida só se iniciar em 2028, o pagamento dos juros só no primeiro ano representou cerca de 2 mil milhões de euros e, de acordo com o Bruegel levará, até 2058, à saída de 222 mil milhões de euros do Orçamento da UE. Dinheiro que poderá vir de programas como a coesão ou o combate à pobreza, para pagar juros. Certamente, e apesar da diferença montantes, será também este o impacto dos empréstimos para a militarização.
Outro dos eixos é a possibilidade de que os montantes alocados para políticas de coesão que visarão, em princípio, promover a convergência, apoiar os Estados-membros menos desenvolvidos e mais prejudicados pelo processo de integração, pelas políticas comuns e pela moeda única, possam ser destinados aos chamados «investimentos em defesa». É colocar os montantes antes destinados à construção de hospitais, escolas, infraestruturas de transportes e de energia, ao combate à pobreza, agora ao serviço da corrida aos armamentos e da militarização.
Finalmente, os últimos dois eixos terão como objectivo promover o investimento privado nesta área. Por um lado, colocando o Banco Europeu de Investimento – outrora dedicado a financiar as PME, a promover o desenvolvimento económico, etc. – a financiar os lucros do complexo industrial militar. Por outro lado, através da chamada União das Poupanças e Investimentos, colocando as poupanças dos cidadãos, as pensões, a financiar o desenvolvimento da indústria de armamento e da guerra.
Analisados os cinco eixos, o que representam de perigo para o futuro, assim como os seus impactos profundamente negativos, só pode resultar o compromisso de dar o mais assertivo e corajoso combate a estas políticas e de colocar no centro do debate a defesa da paz e da solução para os problemas que os trabalhadores e os povos enfrentam.