Decompondo o «rearmamento» (I)

Joel Moriano

Na passada semana, dois momentos marcaram o caminho militarista que a União Europeia pretende aprofundar ainda mais nos próximos anos. Por um lado, o anúncio da presidente da Comissão Europeia da apresentação da proposta do chamado programa «Rearmar a Europa», que terá como objectivo gastar, pelo menos, 800 mil milhões de euros em armamento e na promoção da «economia de guerra». Por outro lado, a bênção do Conselho Europeu a este programa e o pedido de ainda mais meios para gastar em armas, na confrontação e na guerra.

Os 800 mil milhões de euros que pretendem gastar nos próximos quatro anos são o equivalente a 14 anos da política de coesão (tendo como referência os valores do actual QFP) ou a 56 anos de Fundo Social Europeu +, que tem entre os seus objectivos o combate à pobreza e à exclusão social.

Este «plano» é composto por 5 eixos.

O primeiro eixo é o da activação da cláusula de derrogação do Pacto de Estabilidade e Crescimento para os chamados «investimentos» em defesa. Isto significa que as despesas assim consideradas não serão tidas em conta para efeitos de contabilização dos limites de défice em 3% do PIB e de dívida em 60% do PIB. O objectivo desta medida é que os Estados aumentem a despesa na militarização em, pelo menos, 1,5%, 650 mil milhões de euros no total. O que em Portugal representará, pelo menos, 4,3 mil milhões de euros.

Esta medida é a tentativa de resposta às críticas que têm sido feitas às declarações de responsáveis da UE e da NATO que defendiam o aumento da despesa em armamento à custa da diminuição do investimento na saúde ou nas pensões. Dizem agora que com esta derrogação já não será necessário cortar nos serviços públicos e funções sociais dos Estados mas essa é uma falsa resposta à crítica.

Falsa porque os recursos que vão ser mobilizados para os gastos militares não ficarão disponíveis para outros fins, nomeadamente das pensões e da saúde. Falsa também porque os critérios do Pacto continuarão a ser a referência de PS, PSD e CDS e dos seus governos. Falsa ainda porque ninguém duvida de que a Comissão Europeia continuará a pressionar para o cumprimento dos critérios do Pacto e Estabilidade, tal como continuou a fazer durante a activação desta cláusula em consequência da pandemia, em prejuízo do investimento nos serviços públicos ou da garantia da totalidade dos salários e rendimentos dos trabalhadores.

Em próximas crónicas trataremos dos restantes eixos. Mas o que aqui fica já mostra com clareza as opções políticas que estão por trás destas decisões. Além da continuação da loucura belicista e militarista que agrava os riscos de confrontação, guerra e destruição, fica evidente a secundarização dos problemas sociais que atingem os trabalhadores e os povos.

Essas são as marcas principais destas opções da UE feitas sob o falso pretexto de garantir a segurança.

 



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