Queda do Governo abre espaço à afirmação de um novo rumo

A Assembleia da República rejeitou, no dia 11, a moção de confiança ao Governo, levando à sua queda. A votação decorreu seis dias depois da rejeição de uma moção de censura do PCP.

Moção de confiança ao Governo PSD/CDS é rejeitada

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A rejeição foi concretizada com os votos contra de PCP, BE, L, PAN, PS e CH, e votos a favor dos partidos do Governo, PSD e CDS, e da IL.

No debate que antecedeu a votação, Paulo Raimundo garantiu que «não há explicações possíveis que [o primeiro-ministro] possa dar, relativas aos casos que o envolvem, nem melhorias na comunicação, que consigam justificar aquilo que é injustificável».

Face a esta situação, o Secretário-Geral sublinhou que a única solução possível, e a única que poderia ser caracterizada como «a atitude certa», seria a demissão do primeiro-ministro.

«Não o fez, nem o faz, e o que tenta é iludir a incompatibilidade dos seus interesses com a gestão dos interesses do País», avançou, acusando o chefe do Executivo de «tentar sacudir as suas responsabilidades» para cima dos outros.

Assim é, assegurou, com o voto apresentado pelo Governo, referindo que o «primeiro-ministro não admitiu o erro e, numa fuga para a frente», decidiu apresentar «uma moção de confiança que, na prática, é um exercício de vitimização» perante a realidade dos seus próprios actos.

O deputado afirmou, para que não restassem dúvidas, que as reais intenções do Governo, mais do que solucionar a situação onde se colocou, é, «a todo o custo, salvar a sua imagem e a sua política», que se encontra, frisou, «ao serviço dos interesses dos grupos económicos e das multinacionais».

«É isso que está em causa», asseverou.

Em defesa dos interesses da maioria
«O capital manda, o Governo executa, a IL e o CH apoiam, e o PS leva ao limite o apoio a essa prática» – assim Paulo Raimundo classificou a actual governação. Ao contrário de outras bancadas, o PCP, frisou, recusa-se a «participar nesta autêntica novela», não a alimentando «em detrimento daquilo que é preciso resolver, que é a vida das pessoas».

Tal como fez questão de referir o Secretário-Geral, a rejeição assegurada pelo PCP à moção de confiança é, sobretudo, «um sinal de esperança e de mobilização», em torno daquilo que, fora das «novelas», realmente importa na vida das pessoas: lutar pelo aumento geral dos salários e pensões; defender um SNS e uma Segurança Social públicos e universais (e, em relação ao primeiro, gratuito e com o investimento em meios técnicos e humanos necessário); pôr o País a produzir; responder aos direitos dos trabalhadores, nomeadamente dos que se encontram em regime de trabalho por turnos e de trabalho nocturno; e dar resposta às necessidades e direitos dos pais e das crianças.

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«É aqui que se dá o confronto», assinalou, entre os interesses que a política do Governo serve e os interesses da larga maioria dos portugueses. «É aqui», vincou, com os interesses da maioria, «que o PCP está, e é daqui que o PCP nunca sairá».

«Este Governo e a sua política estão a mais»
Tal como definiu Paula Santos, numa intervenção antes do encerramento da discussão, «neste debate, tem valido tudo: pressão, chantagem, manobras à última hora».

Assim foi, por exemplo, na proposta do PSD de suspender o debate para que o Governo e o PS pudessem discutir a situação, à porta fechada, longe do escrutínio público.

Também o foi com a proposta do Governo, instando a constituição de uma comissão parlamentar de inquérito (e retirando, em caso de anuência pelo PS, a moção de confiança), mas com apenas 15 dias para chegar às suas conclusões.

Nesta intervenção, a líder parlamentar do PCP reforçou as linhas gerais já anteriormente elencadas pelo Secretário-Geral, afirmando que o Executivo «se socorreu, mais uma vez, da propaganda para ocultar os interesses que o Governo serve».

«O que as pessoas querem é uma política alternativa, que garanta uma vida digna», clarificou, apontando que o Governo «faz questão de demonstrar um profundo desprezo» pelos trabalhadores, os reformados, os utentes dos serviços públicos – pelas pessoas, de forma geral. Nesse sentido, frisou que «este Governo e a sua política estão a mais».

Tentativas de ilusão
Todo o debate foi marcado, da parte de vários partidos, por tentativas constantes de iludir o povo quanto às suas reais opções.

Ainda na abertura da sessão, Luís Montenegro assegurou que o seu Governo não podia prescindir da confiança da AR. No entanto, ao longo do debate, foram várias as ocasiões em queo Governo sugeriu acordos com o PS (como aquele já referido), viabilizando a retirada, pelo Executivo, da moção de confiança – que não seria, então, votada.

Também o PS se mostrou hesitante face à previsível derrota do Governo, pedindo, do início ao fim do debate, que o Executivo retirasse a moção.

Já o CH cumpriu o papel de suposto crítico do Governo, rejeitando a confiança no Executivo, apesar de, enquanto sucedâneo de PSD e CDS, não se afastar das opções da política de direita seguidas pelo primeiro-ministro – e, até, de manifestar a intenção de as aprofundar.

Autoridade e coerência...
Foi com estas palavras que Paulo Raimundo descreveu a actuação do PCP, no debate sobre a moção de censura ao agora findo Executivo PSD/CDS, apresentada pelos comunistas, discutida no dia 5 e rejeitada pelos partidos do Governo e a IL, com a abstenção de PS e CH.

O Secretário-Geral sublinhou que o PCP, «desde a primeira hora, não alimentou expectativas, denunciou e combateu a acção do Governo, e recusou qualquer cumplicidade com as suas decisões, incluindo no OE».

A moção de censura foi apresentada na sequência de uma sucessão de factos, reveladores da promiscuidade entre funções públicas e interesses pessoais e económicos, envolvendo variados membros do Executivo e o próprio primeiro-ministro. Sobre esta situação, Paulo Raimundo sublinhou «a urgência de uma clarificação», que poderia ter sido dada logo no dia 5, não fosse o oportunismo do PS.

O deputado frisou, igualmente, que a moção de censura não se prendia, apenas, com os casos envolvendo governantes, asseverando que, «para lá da gravidade dos factos», a proposta censurava a globalidade das opções do Governo: a submissão à UE; a degradação de serviços públicos (mormente o SNS e a Segurança Social); as dificuldades no acesso à habitação; o aumento dos preços; as borlas fiscais; o agravamento da legislação laboral; e o esbulho privatizador de empresas estratégicas como a TAP.

...contra os calculismos de alguns!
No dia 1, assegurou Paulo Raimundo, o primeiro-ministro «teve oportunidade de dar um contributo para a elevação da vida política nacional, mas não só não o fez como ignorou ostensivamente os factos que o envolvem, fez chantagem, lançou insinuações, sacudiu responsabilidades e falou de um País que não existe».

«Ao contrário do que alguns afirmaram, esses sim, de forma precipitada, desorientados e presos aos seus compromissos, não foi o PCP que mordeu o isco, foram outros que caíram na rede que o Governo lançou, para garantir a todo o custo a sua sobrevivência. O que queria, e há quem lhe tenha feito a vontade, era que nos pronunciássemos a partir dos critérios e do calendário» que lhe eram mais favoráveis, assegurou.

O Secretário-Geral do PCP garantiu que, da parte dos comunistas, não se brinca à política, nem se brinca «com a vida das pessoas».

O que é? O que acontece agora?
Ao contrário das moções de censura, as moções de confiança são da exclusiva iniciativa do Executivo, e a sua rejeição implica a demissão do Governo.

A decisão final está, agora, nas mãos do Presidente da República que, em declarações à imprensa no dia 5, avançou estar a ponderar «todos os cenários». Estes são dois: ou o chefe de Estado dissolve a AR; ou indigita um novo primeiro-ministro. Marcelo Rebelo de Sousa já referiu que, se convocar eleições, irá marcá-las para 11 ou 18 de Maio.

Em qualquer caso, o Presidente da República já anunciou que, antes de tomar uma decisão, irá ouvir os partidos com representação parlamentar e o Conselho de Estado.