- Nº 2675 (2025/03/6)

A clientela

Opinião

O que se está a passar com Montenegro não difere em quase nada do que acontece com todos os «políticos» da política de direita. Ou seja, do que acontece com todos aqueles que no PS, no PSD, no CDS, na IL e no CH se colocam ao serviço da continuação da política de direita, ao serviço da classe dominante, da grande burguesia nacional. E se colocámos o quase é porque Montenegro parece ter cometido um ou mais erros de forma, que o deixam exposto.

Por isso, vamos neste texto esquecer o erro de forma – o ter continuado a receber as avenças enquanto primeiro-ministro, o ter mantido a «empresa» em seu nome – e vamos concentrar-nos no problema de fundo exposto: a fortuna amealhada por Montenegro em meia dúzia de anos é gerada por pagamentos mensais generosos das seguintes famílias, através de algumas das suas empresas: dos 14.º mais ricos de Portugal (irmãos Violas, 939 milhões); do 26.º mais rico de Portugal (Fernando Pinho Teixeira, 493 milhões); e dos donos da Rádio Popular, cujos lucros ascenderam aos 12 milhões de euros em 2023.

Estes patrões de Montenegro, que lhe entregavam avenças que duplicavam o salário de um primeiro-ministro, quanto ganharam com a descida do IRC? Quantos deles estão com vontade de participar numa das privatizações que o Governo de Montenegro está a preparar? (Um deles fez boa parte da sua fortuna ao «comprar» a Unicer na privatização para depois entregar o grosso do seu capital à Carlsberg). Estão preocupados em ter a pensão garantida no futuro, como a maioria dos trabalhadores, ou olham para a Segurança Social como um sítio onde podem aplicar capital para o multiplicar? E assim para cada opção que o País tem que tomar.

Porque a existência das avenças ou a sua continuação está indirectamente ligada ao facto de Montenegro defender um conjunto de opções políticas que objectivamente servem os interesses dos avençadores. Como noutros casos, é o convite para integrar uma administração, uma Assembleia Geral, uma Fundação, para proferir uma palestra remunerada. Ou a colocação de fundos numa gestora criada. Ou... Tudo actividades absolutamente legais, imaculadamente legais, mas que são a essência corrupta do regime em que vivemos, onde o poder político vive ajoelhado aos pés do poder económico.

Manuel Gouveia