Povo não aguenta mais suportar os escandalosos lucros da banca

O perdão de uma multa de 225 milhões à banca nacional é mais uma evidência – entre tantas outras – de que a política de sucessivos governos de PS, PSD e CDS (a que se juntam, mais recentemente, IL e Chega) não atenta às necessidades do povo e do País. Está, isso sim, ao serviço do lucro e olha apenas pelos bolsos de uma pequena, mas muito poderosa e influente, minoria.

Ao longo dos últimos 50 anos, ao lado dos accionistas estiveram sempre PS, PSD e CDS, a quem se junta agora IL e Chega

É a prescrição do processo relativo à cartelização da banca, movido pela Autoridade da Concorrência (AdC), que está em causa. Um «escândalo inaceitável», como afirmou desde logo o PCP. Mas afinal de que se trata? Como e porque é que aconteceu? São questões complexas, mas têm resposta e inserem-se num plano mais amplo de anos e anos de política ao serviço do capital financeiro, em detrimento dos interesses nacionais.

No dia 10, o Tribunal da Relação de Lisboa considerou prescrita a multa determinada pelo Tribunal da Concorrência a um conjunto de 11 bancos (ver caixa). O processo iniciado pela AdC deveu-se a práticas, mais do que comprovadas, de cartelização de preços, ocorridas entre 2002 e 2013 – período em que a banca terá acumulado em lucros qualquer coisa como 15 mil milhões de euros.

A AdC refere que esteve em causa a troca de informações consideradas «sensíveis», entre os bancos, sobre a concessão de crédito às famílias e empresas e o spread que cada um aplicava – o que é ilegal, mas frequente, como sublinha o Partido em nota do dia 11. O alinhamento de estratégias, de cartelização e combinação explícita ou implícita de preços é prática comum e este caso demonstra-o.

Por explicar, isso sim, fica a prescrição de todos os actos, incluindo os praticados há menos de dez anos, contados do momento de aplicação da coima pela AdC. A «morosidade» da Justiça não pode ter as costas tão largas… Na referida nota, o PCP fez ainda notar que a desproporção de meios entre a banca (as instituições reguladas) e a AdC (neste caso, a entidade reguladora) e a incapacidade ou inércia para intervenções sobre casos evidentes de monopolização e cartelização são «falhas inerentes» quer ao «sistema de supervisão pelas chamadas autoridades independentes», quer, sobretudo, a um «sistema financeiro crescentemente dominado pelos grupos económicos privados», que funciona como um «sorvedouro de recursos nacionais».

Impunidade para uns dificuldades para a maioria

Choca a impunidade com que se livra este conjunto de bancos de uma coima de 225 milhões de euros. Mas é o contraste entre os lucros colossais da banca e os sacrifícios da população e das pequenas empresas que escandaliza ainda mais. A forma como este processo foi conduzido confirma toda uma política e um sistema favorável aos interesses do grande capital financeiro.

Quantas necessidades do País cabem nestes 225 milhões? Quantos interesses do povo português são postos de parte em função desta decisão. São questões complexas, mas entre os seus trâmites ficam, sobretudo, os trabalhadores que empobrecem a trabalhar e têm cada vez mais dificuldades em fazer chegar o salário até ao fim do mês. Atingem os milhares de portugueses que carregam, todos os meses, o autêntico calvário que são as prestações do crédito à habitação ou o aumento do preço dos bens essenciais, incluindo alimentação, electricidade, gás, telecomunicações e outros serviços.

Torna-se assim inadmissível que se perdoe, quase de mão-beijada, uma multa de 225 milhões.

 

225 milhões de euros perdoados à banca, porquê?

Quem foi multado?

No essencial, o processo foi movido contra um conjunto de 11 bancos – CGD, BCP, Santander Totta, BPI, Montepio, BBVA, BES (hoje em liquidação), BIC, Crédito Agrícola, Deutsch Bank e União de Créditos Imobiliários. Os valores das multas variam, sendo o mais alto de 82 milhões e o mais baixo de 150 mil euros. No total, o valor do conjunto das coimas alcança os 225 milhões de euros.

Quem multou?

O processo foi movido pela Autoridade da Concorrência, um regulador dito independente e com competências transversais a todos os sectores da economia. Tem como objectivo, entre outros, velar pelo cumprimento da legislação de defesa da concorrência. A decisão foi tomada pelo Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão.

Porquê?

O processo relaciona-se com comprovadas práticas de cartelização de preços ocorridas entre 2002 e 2013. O caso ficou conhecido como o «Cartel da Banca». Em causa está a troca de informações, consideradas sensíveis, entre os bancos sobre a concessão de crédito às famílias e empresas e o spread que cada um aplicava.

Porque demorou a AdC tanto tempo a chegar a um veredicto?

Não há ainda uma resposta clara. No entanto, o PCP afirma ser preciso garantir o total apuramento das circunstâncias e das responsabilidades que permitem à banca escapar ao pagamento da coima. Para isso, irá requerer a presença da AdC na Assembleia da República para prestar esclarecimentos sobre a sua actuação neste processo.

Porque prescreveu a multa?

Outra questão de resposta difícil. A verdade é que a autoridade competente demorou mais de sete anos a chegar a um veredicto e o Tribunal da Relação de Lisboa deu razão aos bancos que tinham recorrido da decisão do Tribunal da Concorrência, alegando a prescrição deste caso a 1 de Setembro de 2023 ou, no limite, a 11 de Fevereiro de 2024.

É uma decisão irreversível?

Não. A decisão do Tribunal da Relação é ainda passível de recurso e é essa a intenção anunciada pela AdC.

 

A paixão privada entre a banca e os governos de PS e PSD/CDS

A opção dos partidos que governaram o País ao longo das últimas décadas pela banca privada e pelos seus accionistas não é de agora. Recorde-se o caso do Banco Espírito Santo/Grupo Espírito Santo (BES/GES).

As práticas que levaram o BES ao seu colapso são internas e externas: no essencial, o banco financiava as opções de todo o império Espírito Santo, o Banco de Portugal fingia regular e supervisionar essas opções e os governos enlaçavam-se com o grupo, criando assim uma situação de grave exposição do banco ao GES. Todo este processo resultou naquela que foi, até ao dia de hoje, a maior operação de resolução de uma instituição bancária no País. Por opção política e contra a vontade do PCP, autorizou-se o sacrifício de milhares de milhões de euros de recursos públicos na resolução do banco, sem que a componente não financeira do Grupo tivesse sido nacionalizada, impedindo assim que o património do GES colmatasse as perdas públicas.

Ao mesmo tempo, foi o Governo PSD/CDS que determinou que o Estado pagaria a factura da corrupção dos grandes accionistas do BES que, através do Fundo de Resolução, continuaram a distribuir créditos entre si.

Todo este processo desenvolveu-se ao abrigo do quadro legal: foi a lei que permitiu as transferências para off-shores de todo o tipo de pagamentos a grandes accionistas; é a lei que dita que o Banco de Portugal não tenha auditoria própria e que os bancos sejam auditados por empresas privadas (as tais ditas independentes); e é a lei que permite que lucros gerados no País não paguem cá impostos (no caso do Millennium BCP, por exemplo, apenas cerca de 25 por cento dos seus accionistas são grupos com sede em Portugal).

O exemplo paradigmático do BES não é um caso isolado: a este somam-se os processos, anteriores e posteriores, do Banco Português de Negócios (BPN), do Banco Português Privado (BPP) e do Banco Internacional do Funchal (BANIF), entre outros. Com a factura final, os accionistas acabam sempre por esfregar as mãos de contentes. Já a conta sobra invariavelmente para os trabalhadores e o povo português.

 

Comissões, dividendos e lucros à boleia das opções políticas

O ano de 2023 foi «histórico» para a banca: os maiores bancos privados portugueses registaram lucros recorde. Falamos de 12 milhões de euros por dia, num total de 7,3 mil milhões antes de impostos, dos quais 3,4 mil milhões resultaram da cobrança de taxas e comissões bancárias – as mesmas que o PCP procura há muito limitar e que PS, PSD, CDS, IL e Chega querem eternizar.

Se no início de 2024 se procurou justificar esse crescimento como tendo sido «excepcional» e, no essencial, devido ao aumento das taxas de juro pelo Banco Central Europeu, os lucros previstos para esse mesmo ano deitam por terra essa ideia: a menos de um mês do final de 2024, a previsão era de que os lucros suplantassem os do ano anterior.

Só em 2023 foram distribuídos em dividendos 2,4 mil milhões de euros, dos quais 1,6 mil milhões saíram do País, para accionistas estrangeiros.