A ofensiva ideológica e a necessidade de a enfrentar com os meios próprios
Compreender as condições de luta é condição para melhor intervir, garantir o acerto de orientações e linhas de acção, definir objectivos imediatos de luta
1. Ter presente as condições concretas em que intervimos é condição para, a partir da compreensão da realidade, incorporá-la na acção, na definição dos seus objectivos, nas linhas de trabalho a adoptar para a enfrentar. Uma rigorosa apreensão das condições em que que intervimos e lutamos, da avaliação das forças em presença e da sua correlação, da expressão dos meios e instrumentos para condicionar a acção e objectivos de luta do Partido, mas também da nossa força para as enfrentar, assume acrescida importância, no quadro actual de luta. Tanto mais quanto as condições que, em concreto, estão presentes nesta acesa luta de classes o exige, a partir do confronto latente que persiste entre os que querem concluir os objectivos do seu projecto contra-revolucionário e as forças que afirmam uma outra perspectiva para o futuro do País ancorados nos valores de Abril tendo como horizonte um Portugal justo e desenvolvido.
2. A influência geral do Partido nas suas diversas expressões – política, ideológica, social e eleitoral – não é separável das condições de luta, das relações de produção social dominantes, da correlação de forças de classe em presença. É nesse quadro que o Partido tem de resistir à intensa ofensiva política e ideológica a que é sujeito, dirigir um processo de luta e acção que contribua para o acumular de forças que projecte o papel que é chamado a desempenhar e afirmar as suas propostas e o seu projecto. Uma realidade incontornável, resultante da natureza de classe do Partido, do seu projecto e objectivos de luta. Uma realidade que o Partido enfrenta, emergindo assim, aos olhos das forças do capital, como seu inimigo principal. É visto por ele como a força que, pelo seu percurso, acção e projecto, questiona o poder dominante e tem por objectivo pôr-lhe termo. O ataque ao PCP, à sua influencia e ao seu papel na sociedade portuguesa é tão só a expressão do que, neste confronto, representam os nossos programa, ideal e projecto. Ignorá-lo é desarmar o Partido neste conflito de classe, que só com a superação revolucionária do capitalismo, será integramente resolvido. O anticomunismo exacerbado cuja expressão concreta é o ataque ao PCP é tão só a expressão desse antagonismo de classe.
3. Compreender as condições de luta é condição para melhor intervir, garantir o acerto de orientações e linhas de acção política, definir em cada momento os objectivos imediatos de luta e a sua articulação com o projecto de transformação e emancipação que move a acção dos comunistas e do seu Partido. Fazê-lo não é auto-justificar-se, dissimular insuficiências próprias. Observar a evolução da influência do Partido, nas suas diversas expressões, apenas pela visão unilateral e exclusiva da nossa intervenção, isolada da acção de outros com quem nos confrontamos, iludindo que ela é parte indissociável de um embate político e de classe mais vasto, não circunscrito a um período temporal, nem separável do enquadramento ideológico, determinado por concepções dominantes decorrentes da estrutura socioeconómica, é um erro. Desde logo, porque despreza factores que não podem ser desprezados e, depois, porque carreia para a acção do colectivo partidário responsabilidades que lhe não cabem, nem está nas suas mãos ultrapassar de imediato e por inteiro. Não contribui para uma avaliação lúcida da situação e, sobretudo para mobilizar energia militante para enfrentar batalhas presentes e futuras, carregar sobre nós próprios responsabilidades que não encontram explicação no que fazemos, mas nas condições de luta em que intervimos. Não desvalorizamos a necessidade de identificar insuficiências, avaliar o que se pode e deve aperfeiçoar, o que a reflexão e contribuição colectiva com a incorporação da experiência e saberes do colectivo partidário permitirá. Tanto assim é que, quer na Conferência Nacional de 2022, nas suas conclusões e linhas de iniciativa aí definidas, quer nas Teses agora em discussão, encontramos dezenas de medidas e orientações que, partindo do reconhecimento de insuficiências, apontam respostas e soluções para as ultrapassar. Mas será um erro, que em si mesmo tolherá a indispensável reflexão para elevar a capacidade de comunicação, perder de vista que, nas condições concretas em que lutamos e intervimos – também e em particular no plano do confronto ideológico –, muito para lá do que podemos e devemos melhorar, há factores objectivos e subjectivos que a condicionam.
4. Não desconhecemos nem desvalorizamos as exigências e dificuldades colocadas à nossa luta, as forças que enfrentamos e os meios, materiais e ideológicos, de que dispõem, os condicionamentos e obstáculos que impõem. Mas dificuldade não é sinónimo de impossibilidade. Não se olhe apenas para a ofensiva do capital, a sua natureza e intensidade, com a percepção que cria e o que transporta, de facto, de avalanche que parece ser capaz de tudo soterrar. Olhe-se, como é dever de uma força revolucionária e transformadora, para o outro lado dessa realidade em movimento a que o confronto entre interesses e forças antagónicas obriga: pelo lado da força da resistência, da mobilização de forças combativas e da corajosa atitude de não soçobrar ao poder dominante. E, porque é a partir do concreto que realidade, avaliação e resposta devem ser examinadas, que se deve observar com um olhar de perspectiva e possibilidade o que a vida testemunha a partir da nossa intervenção e luta: é que, apesar dessa desproporção de meios e correlação desfavorável, dessas condições desproporcionadas de forças em confronto, dessa ambicionada agenda das forças do grande capital para concluir o projecto contra-revolucionário que há mais de quatro décadas e meia prosseguem, é a luta dos trabalhadores e do povo, a acção de democratas e patriotas e a intervenção do PCP que se tem erguido como obstáculo e tem impedido a concretização plena desse propósito antidemocrático e de retrocesso.
5. É essa luta que prossegue e em que estamos empenhados. Em tempos marcados pela deturpação ideológica do real de acordo com os interesses dominantes, vivendo da promoção do imediato e parcelar em prejuízo do todo e do geral sobre os quais se procura instituir uma forma de pensar e agir que desvaloriza o racional, dispensa a reflexão, atrela a acção de cada um ao sabor de interesses que não sendo os seus, se lhes apresentam como tal. Teia onde a difusão do individualismo exacerbado, o cultivo da inveja e do egoísmo no relacionamento social, o incentivo à competição gratuita - em si mesmos e no conjunto impeditivos de uma observação da vida e da sociedade ditada pelo interesse comum e colectivo - são chão para os que querem encurralar o olhar sobre a vida e as relações que nos rodeiam nas minudências para deixar de ver o que é grosso em desigualdades, injustiças, em enriquecimento ilícitos. Chão onde se promove a abordagem e resposta a problemas reais e sentidos numa linha de isolamento, sobreposição e confronto com a luta pelos objectivos essenciais em torno dos quais é necessário estabelecer a mais ampla convergência e unidade. Chão onde germinam e proliferam também factores de divisão baseados nos confrontos estéreis e desviados da questão central e sistémica que está na base da exploração e das desigualdades e injustiças que lhe são intrínsecas. Toda uma disseminação de concepções e ideias inerentes ao capitalismo e à ideologia burguesa de incentivo à competição gratuita, indispensáveis à aceitação do sistema de exploração, que não só aplana o terreno do preconceito anticomunista, como dá lastro ao que, conduzindo ao conformismo e à desistência, afasta todos e cada um da busca das razões e de saídas para os problemas que enfrenta. Toda uma construção para a qual concorrem a conjugação de meios diversos – dos currículos escolares aos padrões de entretenimento, das relações sociais à teia comunicacional – e em que a comunicação social, crescentemente sequestrada pelo poder económico e pelo processo de concentração a que está sujeita, liquida a liberdade de imprensa e o direito à informação.
Um quadro em que a resposta a essa deturpação do real tem, sem prejuízo do campo especifico da luta ideológica, na prática e no contacto com o real, a condição principal para lhe dar combate.
6. Tempos marcados por uma resistência que globalmente é já expressão de imposição de revezes a projectos e ambições reaccionárias e, sobretudo, desse acumular de forças que a luta e a acção concreta hão-de impor para abrir horizontes mais favoráveis. Essa soma de vontades e disponibilidades que resultarão do processo de tomada de consciência, a partir de cada um, quanto à condição concreta da sua vida, do sentido de pertença de classe que a luta e a intervenção concreta a partir dos seus interesses, direitos e aspirações, proporcionará. Vencendo, a partir da materialidade da vida e dos problemas que ela evidencia o que a ideologia dominante tende a ocultar e a atrasar, tendo na vivência concreta do exercício de afirmação dos seus direitos - ao trabalho, ao salário, à saúde, à habitação, à reforma, ao ensino e a tudo o mais que uma sociedade justa deve assegurar – a resposta ao que as expressões de diversão e os factores de subjectividade procuram inculcar para iludir as causas e raiz profunda das desigualdades e injustiças. Hoje e no futuro, como sempre, será o papel das massas e da sua luta a trilhar caminhos de progresso tão mais determinantes quanto percorridos por uma força de vanguarda com objectivos claros e programa de transformação social assumido.
7. A batalha ideológica ganha-se em definitivo na batalha mais geral da luta pela transformação da sociedade. O confronto permanente entre condicionamento ideológico para minar a influência do PCP e a intervenção dos comunistas para a alargar será determinado em última instância pela realidade concreta, as condições objectivas em presença, a ampliação da consciência da indispensável superação de um sistema iníquo e desumano. Superação que o capital tentar atrasar e impedir e que cabe aos comunistas impulsionar e concretizar como fazemos com a nossa intervenção determinada e corajosa. Com a convicção de que mais cedo ou tarde os processo de transformação social acabarão por prevalecer.