Propostas para assegurar os meios do socorro e de emergência no quadro do SNS
No sábado, o Secretário-Geral do PCP, Paulo Raimundo, esteve na Associação Humanitária de Bombeiros Voluntários de Sacavém, onde destacou a necessidade de garantir condições dignas para os profissionais que asseguram 90 por cento do socorro e emergência em Portugal. Para o Partido é necessária uma política que valorize carreiras, salários e meios essenciais para reforçar o Serviço Nacional de Saúde (SNS), travando o caminho das privatizações e apostando no serviço público.
«Não é com mais transferências do orçamento do SNS para aqueles que fazem da doença um negócio que isto vai lá»
A delegação do PCP – também constituída por Gonçalo Tomé, do Comité Central, e Gonçalo Caroço, vereador na Câmara Municipal de Loures – foi recebida pela Direcção da Associação dos Bombeiros de Sacavém. À saída do encontro, Mário Pina, presidente da Direcção, começou por lembrar que a actividade principal do seu corpo de bombeiros é precisamente o socorro às populações, para depois alertar as autoridades políticas de que «o cumprimento dos protocolos com o Instituto Nacional de Emergência Médica de Portugal (INEM) é fundamental», o que não tem sido o caso. Como exemplo, referiu que os protocolos «deveriam vir acompanhados de viaturas e não vêm» e que o parque automóvel dos Bombeiros de Sacavém está «envelhecido», o que acarreta «elevados custos de manutenção». A isto acrescem os custos com materiais e consumíveis.
Outro dos problemas apresentados é a dificuldade de encontrar profissionais «em função dos baixos salários que auferem», até porque esta é «uma actividade dura». «Trabalhamos 24 horas por dia, temos quatro equipas, cada equipa com duas pessoas, uma ambulância com dois tripulantes» e «recebemos de subsídio fixo 6690 euros», informou. É só fazer as contas!
Sobre o novo protocolo de cooperação que vai ser assinado entre o INEM e a Liga dos Bombeiros, «ligeiramente mais bem pago», Mário Pina considerou que não vai dar resposta aos problemas do seu corpo de bombeiros, até porque é trimestral e dirigido para o «período de gripe» [entre Dezembro e Fevereiro], durante o qual há uma maior pressão sobre as urgências hospitalares. «É muito difícil preparar uma equipa para ajudar nas questões da saúde em três meses. Acabando esse período, ficamos com o problema nas mãos», salientou.
Problemas no SNS
Paulo Raimundo destacou a «resposta extraordinária» prestada pelas associações de bombeiros, compostas por «homens e mulheres» que exercem a sua função «não por questões financeiras», mas por «dedicação» e espírito de serviço para «ajudar os outros». «Aliás, este é um problema transversal» a todo o SNS, sendo «preciso aumentar os salários, dignificar as carreiras e as profissões, dar melhores condições de trabalho e físicas, ambulâncias e não só, de maneira a poder fixar, neste caso, os bombeiros», que «respondem a 90 por cento de todo o socorro no País».
Tendo em conta que há mais de uma década que são detectados problemas no INEM, sobretudo relacionados com a falta de pessoal e de salários dignos, que está a criar uma pressão nos bombeiros, o Secretário-Geral do PCP frisou ser «preciso resolver os problemas de fundo», soluções que não estão presentes no Orçamento do Estado para o próximo ano e, por isso, «não correspondem às necessidades das populações, nem às necessidades do SNS, nem às necessidades do socorro prestado». Ilustrou com o facto – dado a conhecer naquele dia – de que pelo menos dois terços das vagas para a especialidade de Medicina Geral e Familiar terem ficado por ocupar «com o que isso implica quando faltam médicos de família no SNS». Ao todo eram 904 vagas, mas apenas foram contratados 279 jovens médicos de família.
«Não é com mais transferências do orçamento do SNS para aqueles que fazem da doença um negócio que isto vai lá», mas sim com «com a fixação de médicos, de enfermeiros, de técnicos, de condições e meios, para que haja a resposta no socorro, tendo a estrutura dos bombeiros como peça fundamental para esse socorro, naturalmente intermediado pelo INEM».
Refundação do INEM?
Sobre a ideia apresentada pela ministra da Saúde, Ana Paula Martins, durante o debate na especialidade do OE, de «refundação» do INEM, Paulo Raimundo frisou que a «única» opção é «fazer aquilo que está escrito e não está concretizado», ou seja, o reforço de meios humanos e a valorização dos profissionais, e que «os protocolos que têm com os bombeiros se cumpram». Defendeu também que «só com o aumento dos valores pagos aos bombeiros é que é possível não só as associações viverem sem estarem a contar os tostões todos os dias, mas também valorizarem as próprias carreiras e salários dos seus próprios profissionais».
Questionado se considera que pode ser a privatização do INEM que pode estar em causa, Raimundo respondeu: «A partir do momento em que ninguém foi muito claro a excluir, ficamos muito preocupados».
Ideias peregrinas
Outras ameaças vão surgindo, por exemplo pela Associação Nacional de Técnicos de Emergência Médica, como a criação da profissão de paramédicos, tal como existe noutros países, com uma formação superior e autonomia para fazer outras intervenções de socorro, hoje reservadas aos médicos.
Também se avança com a criação de métodos administrativos de bloqueio do acesso às urgências, que passa pela obrigatoriedade de referenciação pela Linha de Saúde 24 para aceder a urgências hospitalares, já em prática em várias unidades locais de saúde, sobretudo na região Norte. Note-se que, por mais apurado que seja o protocolo clínico para o atendimento telefónico, ele não é idêntico a uma observação presencial por um profissional de saúde, o que pode resultar na subvalorização da gravidade de algumas situações.
PCP quer a valorização dos técnicos de emergência pré-hospitalar
Entre as 517 propostas apresentadas pelo PCP de alteração ao Orçamento do Estado para 2025 (ver pag. 4 e 5) está a necessidade de o Governo proceder, por via da negociação colectiva com as organizações representativas dos trabalhadores, à valorização da carreira e das condições de trabalho dos técnicos de emergência pré-hospitalar.
No texto da proposta de aditamento refere-se que a valorização da carreira envolve «a valorização salarial de todas as categorias da carreira especial de técnico de emergência pré-hospitalar» e admite-se «o reconhecimento do risco e penosidade em que os técnicos de emergência pré-hospitalar exercem as suas funções e a respectiva compensação, designadamente nas condições remuneratórias, de progressão, de descanso obrigatório, de aposentação, entre outras».
A ser aprovada a proposta dos comunistas, o INEM, entidade responsável pela abertura de concursos para a contratação de técnicos de emergência pré-hospitalar, ficaria «dispensado de obter autorizações dos membros do Governo para a utilização das verbas necessárias para proceder às contratações». Assim, o Executivo PSD-CDS terá que transferir «as verbas necessárias para a contratação dos técnicos de emergência pré-hospitalar previstos no mapa de pessoal».
Graves dificuldades
Na nota justificativa alerta-se para a «recorrente dificuldade deste serviço em corresponder às necessidades de resposta, em particular no que diz respeito a meios humanos, mas também a veículos de socorro», em consequência «de políticas de restrição orçamental e desinvestimento, de degradação de carreiras e remunerações», assim como para a «elevada carga de trabalho imposta aos profissionais mais directamente intervenientes na missão de socorro, com funções de grande responsabilidade, a que corresponde uma muito insuficiente remuneração», uma das razões para a frequente saída destes trabalhadores e para as dificuldades de contratação.
Revisão do protocolo até ao final de 2025
O PCP exige também a revisão, até ao final de 2025, do protocolo entre as associações humanitárias de bombeiros, o INEM e a Autoridade Nacional de Emergência Civil, de modo a contemplar os valores que cubram de modo integral os custos efectivos dos serviços prestados. Desta forma, «compete ao Governo criar os mecanismos que permitam o pagamento atempado dos valores devidos às associações humanitárias de bombeiros e à regularização de valores em dívida», segundo a proposta dos deputados Paula Santos, António Filipe, Alfredo Maia e Paulo Raimundo, apresentada no passado dia 14.
«Todos têm direito à protecção da saúde e o dever de a defender e promover»
No artigo 64.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) afirma-se que «todos têm o direito à protecção da saúde e o dever de a defender e promover», sendo realizado «através de um Serviço Nacional de Saúde universal e geral e, tendo em conta as condições económicas e sociais dos cidadãos, tendencialmente gratuito».
No ponto 3 do artigo refere-se que «incumbe prioritariamente ao Estado» garantir «o acesso de todos os cidadãos, independentemente da sua condição económica, aos cuidados da medicina preventiva, curativa e de reabilitação» e «uma racional e eficiente cobertura de todo o País em recursos humanos e unidades de saúde».