O País não pode estar condenado a assistir às chamas que o destroem
O PCP agendou um debate na Assembleia da República para o dia 9 de Outubro sobre o Estatuto Social do Bombeiro, propondo que a profissão seja considerada de risco e desgaste rápido, com mecanismos de prevenção e compensação ou a redução da idade para a reforma.
«Este é o momento de fazer opções»
O anúncio foi feito pelo Secretário-Geral do PCP, no sábado, 21, numa conferência de imprensa realizada na sede do Partido, onde acusou PS e PSD de serem «os autores materiais das políticas» para a floresta e criticou PS, PSD, CDS, Chega e IL por terem, «sucessivamente», rejeitado propostas do PCP, nomeadamente em sede de Orçamento do Estado, que podiam mudar o paradigma dos fogos florestais.
«A não serem tomadas as medidas indispensáveis, tragédias» como aquelas que ocorra na passada semana, particularmente no Norte e Centro do País, «repetir-se-ão ciclicamente», antecipou Paulo Raimundo, que avançou com um conjunto de propostas, como intervir no preço da madeira, garantindo aos produtores capacidade de gestão da floresta; apoiar o desenvolvimento da pequena e média agricultura e da agricultura familiar, e em simultâneo garantir, no mundo rural, os serviços públicos e o emprego de qualidade que fixem as populações nesses territórios; concretizar a Lei de Bases da Floresta e dos Planos Regionais de Ordenamento da Floresta, instrumentos fundamentais para o ordenamento do território, mas que nunca mais saem do papel para o terreno; apostar nas espécies autóctones e travar o caminho da eucaliptização, que não serve o País; apoiar o Associativismo Florestal, nomeadamente as Zonas de Intervenção Florestal; reforçar os serviços do Estado, desde logo do Instituto da Conservação da Natureza e da Floresta; avançar com a concretização, no mínimo de 500 equipas de sapadores florestais, assim como com a reconstituição do Corpo de Guardas Florestais, com o aumento significativo dos seus efectivos; garantir aos bombeiros e às suas associações os meios para que cumpram a sua missão e as condições de comando e assim evitar perdas de eficácia na sua intervenção.
«Este é o momento de fazer opções. Ou se defende uma das maiores riquezas do País, que é a floresta, ou se garante que esta vai continuar nas mãos dos grandes interesses da indústria de celulose e das cortiças», frisou o Secretário-Geral do PCP.
«Dolorosa experiência dos incêndios de 2017»
A dimensão da destruição provocada pelos incêndios – vidas humanas, habitações, indústrias e equipamentos colectivos, floresta e biodiversidade, explorações agrícolas, animais, maquinaria, entre outros - «exige agora apoios amplos, simplificados e de rápida concretização», apelou Paulo Raimundo. Recordou a «dolorosa experiência dos incêndios de 2017, em que foi aprovada uma lei de apoio às vítimas, a partir de uma proposta do PCP», para dizer que esta «deve ser uma base para a resposta que se exige agora».
«Sem prejuízo da intervenção dos seguros onde houver lugar a isso», o Secretário-Geral do PCP defendeu ainda que «o Estado português tem de assumir de forma rápida e ágil» a reconstrução das casas de primeira habitação e apoios às de segunda habitação; apoios ao restabelecimento do potencial produtivo na agricultura e na indústria; apoios à perda de rendimento, particularmente aos pequenos e médios agricultores; apoios à alimentação animal; a retirada da madeira, impedindo a especulação e assegurando preços justos; apoio à reconstrução de equipamentos colectivos; apoios às corporações de bombeiros.
«Não desvalorizando as condições climatéricas excepcionais que se viveram nos últimos dias, esta vaga de incêndios traz uma vez mais à evidência as fragilidades do sistema de Protecção Civil, na prevenção e no combate, com uma clara insuficiência de meios humanos, técnicos, materiais e logísticos que, para além de sucessivas doses de propaganda, não só não tem sido corrigida como se agrava», criticou o dirigente comunista, referindo-se à nova Lei Orgânica da Autoridade Nacional de Emergência e Protecção Civil, que o PCP contestou, «concebida principalmente a pensar no acesso a fundos europeus» e que «insiste na subalternização dos bombeiros, ignorando que são estes que garantem mais de 95 por cento das missões de socorro no País».
Reformas por concretizar
Recuando aos incêndios de 2017, Paulo Raimundo criticou o «pacote de medidas» e a «profusão de legislação» apresentada pelo governo PS [da altura], a que apelidou da «maior reforma desde D. Dinis», mas que, na realidade, «grande parte delas não estão concretizadas total ou parcialmente».
«A verdade é que sete anos depois, as propostas da Comissão Técnica Independente então criada no âmbito da Assembleia da República foram em larga medida desconsideradas e, no plano da floresta, está à vista de todos o abandono a que foram votadas as áreas ardidas», apontou, lembrando que, «mais de uma década depois, o Cadastro da Floresta está por concluir».
Também os «apoios aos baldios estão bloqueados há mais de um ano, para não falar dos cortes brutais nas ajudas comunitárias», as «equipas de sapadores florestais teimam em não ser formadas na quantidade que estava identificada há dez anos», a «utilização do fogo controlado para redução dos combustíveis é residual», os «apoios públicos são na sua esmagadora maioria para as zonas de latifúndio onde os incêndios florestais têm menos impactos» e os «serviços do Estado, designadamente os ligados à Floresta, foram e são esvaziados de quadros e meios», elencou o Secretário-Geral do PCP, dando ainda conta da «falta de visão sobre o País que temos quando se separa as florestas da área da Agricultura, como fez o PS».
Décadas de política de direita
«Não negando origens criminosas, que devem ser apuradas e tratadas no quadro legal em vigor», e «rejeitando linhas de acusação à pequena e média agricultura», a verdade é que a brutalidade da dimensão dos incêndios florestais está profundamente ligada a décadas de política de direita no plano nacional, alinhada com a Política Agrícola Comum» (PAC), concluiu Paulo Raimundo, referindo-se às «opções erradas que levaram e levam à destruição de centenas de milhares de explorações agrícolas, com o consequente despovoamento e a substituição por matos ou monocultura de eucalipto».
Agricultores exigem medidas
A Confederação Nacional da Agricultura (CNA) reclamou do Governo e demais órgãos de soberania a «célere mobilização de meios para o rápido apuramento dos prejuízos e da incapacidade temporária para produzir». De igual forma, «devem ser implementados apoios financeiros aos pequenos e médios agricultores afectados a atribuir por perda de rendimentos, ajudas à alimentação dos animais no caso da destruição de pastagens e outras», defende a CNA.
Outras medidas do Executivo PSD-CDS, em colaboração com autarquias e produtores florestais, passam por promover a criação de Parques de Recepção e Comercialização das Madeiras «salvadas» dos incêndios, estabelecendo preços mínimos, por forma a conseguir algum rendimento aos pequenos e médios produtores afectados e para limpar as matas e proteger o ambiente e recursos como a água e os solos, mas também a implementação de medidas que assegurem a transparência na cadeia agro-alimentar e o aumento do preço das madeiras na produção, factor estruturante da maior importância para a floresta nacional e atractivo para os pequenos e médios produtores florestais.
Na promoção de iniciativas para um correcto Ordenamento Florestal, a prioridade, segundo a Confederação, «deve ser dada aos apoios adequados para a floresta multifuncional, não-intensiva ou monocultural».
Já a Confederação Nacional das Cooperativas Agrícolas e do Crédito Agrícola de Portugal (Confagri) pediu ao ministro da Agricultura e Pescas e à presidente da Comissão Europeia para reflectirem sobre o prazo de implementação do regulamento anti-desflorestação.