A educação é um direito e cabe ao Estado garanti-lo

Mais um ano lectivo que começa sem que esteja garantido a todos os estudantes, em condições de efectiva igualdade, o direito à educação. Faltam professores, técnicos e funcionários não docentes, há muitas escolas sem condições e são inúmeros os obstáculos colocados ao prosseguimento dos estudos. Perdem os jovens e perde também o País e o seu futuro.

Mas nada disto é inevitável, garante o PCP, que defende o investimento na escola pública, gratuita e de qualidade – a escola de Abril.

O desinvestimento e a degradação põem em causa os objectivos da escola pública

A Constituição da República Portuguesa consagra, no seu artigo 73.º, que o Estado «promove a democratização da educação e as demais condições para que a educação, realizada através da escola e de outros meios formativos, contribua para a igualdade de oportunidades, a superação das desigualdades económicas, sociais e culturais, o desenvolvimento da personalidade e do espírito de tolerância, de compreensão mútua, de solidariedade e de responsabilidade, para o progresso social e para a participação democrática na vida colectiva». A realidade, porém, está longe dos preceitos constitucionais – que na Educação, como em tantas outras áreas, estão longe de ser cumpridos. A forma como se iniciou mais um ano lectivo comprova-o.

O PCP levou o assunto a debate na Assembleia da República, confrontando o Governo com as suas opções. Da tribuna parlamentar, a deputada Paula Santos salientou que «fora a propaganda para iludir a comunidade educativa, o que fica é a opção pela não adopção das medidas imediatas e estruturais para valorizar a Escola Pública». Para a presidente do Grupo Parlamentar comunista, «não é com remendos, nem tapando uns buracos aqui para destapar outros, que se vai resolver os problemas».

Ao responsabilizar a política de direita – toda ela, independentemente dos seus executores –, o PCP não permitiu que outros se aproveitassem indevidamente do assunto em debate: não o pôde fazer o PS, com pesadas responsabilidades no estado actual da educação, como não o puderam fazer IL e Chega, que têm tão somente para propor o agravamento das actuais opções políticas, de desinvestimento na escola pública e promoção das escolas privadas.

Problemas acumulam-se e agravam-se
É extensa a lista de problemas da escola pública, apresentada no debate por Paula Santos. Desde logo a falta de professores, que nesse mesmo dia – 19 de Setembro – afectava mais de 100 mil estudantes, que permaneciam sem docente a pelo menos uma disciplina. Este número, alertou-se, podia e pode ainda aumentar, como, aliás, viria a acontecer, «considerando os professores que estão em condições de se aposentar e em situação de baixa médica, cujas necessidades ainda não surgiram». Quanto às medidas tomadas, não passaram de «remendos»: a contratação de professores aposentados; a colocação de bolseiros, em situação de enorme precariedade, a dar aulas; os apoios à deslocação só para as vagas classificadas como carenciadas.

Mas há mais: faltam psicólogos, terapeutas, assistentes sociais e técnicos especializados, profissionais essenciais no acompanhamento dos estudantes e na prevenção da violência. Além disso, muitos dos que estão nas escolas a desempenhar funções permanentes, têm vínculos precários.

Denunciando a falta de «meios e recursos para uma verdadeira escola inclusiva», Paula Santos valorizou a gratuitidade dos manuais escolares (possível apenas graças à «persistente intervenção do PCP»), mas alertou para o peso significativo das despesas com educação no orçamento das famílias, que se agravou com o aumento do custo de vida verificado nos últimos anos e que a acção social escolar está longe de colmatar.

O elevado número de estudantes por turma, que impede o acompanhamento devido por parte dos professores, e a falta de vagas de pré-escolar na rede pública foram outras das questões levantadas pelo PCP no debate parlamentar. Os deputados comunistas foram ainda os porta-vozes daquilo que é evidente um pouco por todo o País: são muitas as escolas com instalações degradadas e desadequadas, que não garantem condições para quem aí estuda e trabalha: infiltrações, humidade, infraestruturas velhas, onde chove, com calor e frio excessivos, sem equipamentos nem pavilhões desportivos e espaços de recreio que não potenciam a brincadeira.

Porém, notou ainda Paula Santos, o Governo «foi muito célere a aumentar a transferência de verbas para a Escola Privada», aumentando a verba para os contratos de associação. «Assim se vê quais são os interesses que serve», concluiu.

 

Assim se constrói a escola pública consagrada na Constituição

  • Atribuição de um apoio à deslocação de professores e um apoio à habitação até 700 euros para os professores deslocados.

  • Valorização da carreira e da profissão docente, eliminando os obstáculos que impedem a progressão, designadamente as vagas no acesso aos 5.º e 7.º escalões e as quotas na avaliação, vinculando os professores com três ou mais anos de serviço e regularizando o horário de trabalho.

  • Combate à precariedade e integração nas carreiras, com vínculo efectivo, dos professores, técnicos especializados e todos os trabalhadores que desempenhem funções permanentes.

  • Reforço do número de psicólogos, terapeutas, professores de educação especial, assistentes sociais, técnicos e assistentes técnicos e auxiliares de acção educativa.

  • Alargamento da gratuitidade dos manuais escolares aos cadernos de fichas em toda a escolaridade obrigatória.

  • Reforço da acção social escolar, com o alargamento dos beneficiários, a gratuitidade das refeições e visitas de estudo para os estudantes da escolaridade obrigatória, incluindo o alargamento da distribuição de fruta e leite escolar.

  • Redução do número de alunos por turma.

  • Valorização da avaliação contínua, eliminando exames e revendo o regime das provas de aferição.

  • Implementação de um modelo de gestão democrática das escolas, com órgãos colegiais, directamente eleitos e com a promoção da participação dos estudantes, dos pais, dos professores e demais trabalhadores.

  • Fim dos entraves à participação estudantil.

  • Universalização e gratuitidade da educação pré-escolar a partir dos três anos, aumentando o número de salas da rede pública de pré-escolar e requalificando instalações.

  • Eliminação das propinas no Ensino Superior público, entrave objectivo ao acesso e permanência dos estudantes nos mais elevados graus de ensino.

  • Aumento do número de camas para estudantes deslocados, que respondam às necessidades.

 

Nas nossas mãos a escola de Abril

Na véspera do debate parlamentar, a Juventude Comunista Portuguesa (JCP) promoveu em Lisboa, junto ao edifício do Governo, uma «Tribuna de Luta» sobre educação, em que participou o Secretário-Geral do PCP. Por ali passaram, em discurso directo, os problemas reais que afectam a educação e ficou também evidente que – como afirmou o Paulo Raimundo – «os estudantes sabem bem o que querem, conhecem os seus direitos e estão disponíveis para tomar a iniciativa pela educação de Abril».

Vários estudantes testemunharam a realidade vivida nas escolas dos ensinos Básico, Secundário, Profissional e Superior e apontaram caminhos de luta e proposta para democratizar e universalizar o direito à educação (ver citações nestas páginas). Alguns dos jovens presentes seguravam cartazes, dizendo ao que vinham: «Fim dos exames nacionais»; «Mais professores»; «Investimento nas escolas não podem ser esmolas»; «Era uma escola muito engraçada, não tinha tecto, não tinha nada»; «Acção social não existe em Portugal», «A propina dói» ou «De fundação em fundação, o ensino cai ao chão».

Em vários desses cartazes, a reivindicação era antecedida da expressão «Nas nossas mãos», deixando evidente uma atitude combativa, de quem transforma o presente e constrói o futuro. Como lembrou o Secretário-Geral do Partido, «nas escolas e nas faculdades, esta luta faz-se sentir, terá de prosseguir e intensificar-se». Sobretudo porque há uma ofensiva para derrotar, assente na ideia – falsa! – de que «não há recursos financeiros e meios para que todos estudem», de modo a permitir que esses recursos «sejam transferidos dos nossos bolsos para os que fazem de cada dificuldade um negócio».

Os comunistas, profundamente identificados com as aspirações estudantis, propõem «o novo, face ao velho da política de direita de PSD, CDS e PS, e que Chega e IL querem intensificar. (…) o novo da prioridade a alunos e professores, à escola pública como espaço de aprendizagem, de comunhão, de alegria, que não deixa ninguém de fora por condições económicas e sociais, cor da pele, etnia, religião».

É essa a escola de Abril.


Voz aos estudantes

Os exames nacionais só servem como entrave ao acesso ao Ensino Superior. Está na constituição: todos temos direito aos mais elevados graus de ensino. Os exames nacionais são um entrave a este direito e são para acabar!

Estefânia Rebelo, Escola Secundária Maria Amália Vaz de Carvalho, em Lisboa

Não compactuamos com exames que procuram aplicar o mesmo teste a um estudante de uma escola onde faltam professores, não há o mínimo de condições, se passa frio no inverno e que muitas vezes não tem como estudar e outro estudante sem estes problemas, e ainda dizer que esta é uma forma de acabar com injustiças.

Tiago Antunes, Escola Secundária de Camões, em Lisboa

Os alunos do ensino profissional enfrentam diversas dificuldades, incluindo a falta de apoio material, taxas para recuperação de módulos, propinas em alguns casos, desadequação dos estágios em relação à sua formação e uma carga horária excessiva. (…) Alunos que entram de manhã na escola e só saem ao fim da tarde.

Leonor Pedro, Escola Profissional de Recuperação do Património de Sintra

A demora na entrega de vistos, acompanhada pela chegada tardia de estudantes PALOP a Portugal, bem como a falta de apoio da faculdade, geram por vezes a desistências por parte dos alunos. (…) Esses estudantes acabam por se sentir confusos e sufocados por não se conseguirem integrar neste meio académico.

Virgínia Bírom, Associação de Estudantes da Guiné-Bissau em Lisboa

A questão do alojamento e das residências é, a par da propina, um dos principais entraves à frequência do Ensino Superior. (…) Há milhares de estudantes que, tendo obtido efectivamente uma vaga no Ensino Superior, não se chegam a matricular devido aos custos.

Duarte Raposo, estudante deslocado e membro do Senado da Universidade de Lisboa

Um governo que pondera descongelar a propina, é um governo que não quer saber dos estudantes. Um governo que em vez de reforçar o número de psicólogos nas faculdades, oferece cheques. (…) Um Governo que em vez de cumprir e alargar o Plano Nacional para o Alojamento no Ensino Superior dá camas no INATEL ou nas Pousadas da Juventude.

Guilherme Vaz, presidente da AE da FCSH-UNL