- Nº 2644 (2024/08/1)

SNS defende-se com a luta

Em Foco

Na véspera de uma greve nacional de enfermeiros e uma semana depois de uma greve de médicos, a valorização dos profissionais sobressai como medida urgente e estratégica para defender o Serviço Nacional de Saúde e estancar a sangria do Orçamento do Estado para aqueles que lucram com o negócio da doença. Os sindicatos deixam claro que as lutas têm por objectivo último a melhoria do SNS público e para todos.

A greve de amanhã, nos turnos da manhã e da tarde, foi decidida pelo Sindicato dos Enfermeiros Portugueses a 16 de Julho, porque «é obrigatória a valorização dos enfermeiros e a melhoria das suas condições de trabalho».

No dia 26, sexta-feira, o SEP/CGTP-IN congratulou-se pelo facto de o Ministério da Saúde, na reunião realizada na véspera, ter aceitado retomar as negociações, de acordo com o estabelecido no Protocolo Negocial, marcando a reunião seguinte para dia 31. O sindicato sublinhou que «a onda de indignação dos enfermeiros e a sua mobilização para a greve nacional» foram determinantes para este resultado.

No entanto, perante a proposta de valorização da Carreira de Enfermagem apresentada pelo Ministério, «manter a greve é a única solução».

Na manhã do dia de luta, vão realizar-se concentrações de enfermeiros em alguns hospitais, como foi anunciado para o Hospital José Joaquim Fernandes, em Beja, às 9h30, para o Hospital de São João, no Porto, às 11 horas, e o Hospital de São José, em Lisboa, às 12 horas.

Ao convocar a greve, o SEP indicou «razões objectivas» para a sua realização, começando pelo não cumprimento do compromisso do Governo de apresentar uma proposta de alteração à grelha salarial, na reunião da assinatura do Protocolo Negocial (adiada duas vezes).

No dia 18, em nova reunião, o Ministério reclamou a suspensão da greve, mas não desmentiu as notícias sobre a medida da tão propagandeada valorização dos enfermeiros: mais 52 euros, para quem estiver nas primeiras posições remuneratórias de cada categoria, excluindo todos os demais.

 

Sem respostas

O Ministério continua a impedir a vinculação definitiva dos vínculos precários e a abertura de concursos para acesso às categorias de Enfermeiro Especialista e Enfermeiro Gestor. Persiste o problema das enfermeiras especialistas que estavam no gozo da licença parental, quando da transição para a actual carreira. Não foi marcada a reunião solicitada pelo SEP para, exclusivamente, abordar problemas nos Cuidados de Saúde Primários.

Do Ministério também não surgiu nenhuma proposta para pagar as horas em dívida.

Por cumprir continua a resolução das injustiças relativas, na contagem de pontos para evolução na carreira.

Outro problema de vulto, nas condições de trabalho, decorre de os enfermeiros serem convocados, por todo o País, para trabalharem além do seu horário normal. Essas horas a mais, «na maior parte dos casos, não são pagas, ou são pagas como trabalho normal», explicou o SEP, reclamando que os profissionais nesta situação possam ter tempos de descanso, como compensação.

Devido à carência de enfermeiros (sendo a contratação de mais profissionais uma reivindicação de há muito), tornou-se sistemático o recurso a trabalho extraordinário, o que agrava o risco e a penosidade do exercício da profissão, exigindo-se que sejam consagradas formas de compensar estes factores.

Por fim, é reafirmado que as 35 horas semanais devem vigorar como regime de trabalho dos enfermeiros.

 

O alerta dos médicos

A greve de 23 e 24 de Julho, com uma adesão média de 75 por cento, foi um alerta ao Ministério da Saúde, salientou a Federação Nacional dos Médicos, precisando: «é urgente negociar, e em tempo útil, a actualização das grelhas salariais, para estarem inscritas no Orçamento do Estado de 2025, e as condições de trabalho, como a revisão do período normal de trabalho semanal, tendo em vista a reposição das 35 horas, e a reintegração dos médicos internos na carreira».

Uma greve ao trabalho suplementar, nos cuidados de saúde primários, decorre até 31 de Agosto, com os mesmos objectivos.

Para a FNAM e os seus sindicatos, os 31 mil médicos do SNS devem ter «salários justos e condições de trabalho dignas, para garantir os melhores cuidados de saúde à população, num SNS público, universal e de qualidade». «Aprofundaremos as formas de luta, até que a intransigência e a teimosia do Ministério de Ana Paula Martins dê lugar à verdadeira vontade negocial, para haver mais médicos no SNS», assegurou a federação.

O Governo não deu mostras de pretender alterar o seu rumo, antes pelo contrário, como se viu nos mais recentes diplomas, sobre o pagamento do trabalho suplementar dos médicos e o novo «índice de complexidade dos utentes».

O Ministério «quer incentivar os médicos a fazerem mais horas, para além do seu horário normal», acusou a FNAM, que exigiu a clarificação das omissões que detectou no Decreto-Lei 45-A/2024. Este «não “recompensa” o trabalho suplementar», pois abrange «trabalho normal, pago através de um banco de horas ilegal, à luz dos acordos colectivos de trabalho dos médicos», e vem criar «a possibilidade de alargamento do período normal de trabalho de forma ilimitada».

Há um acréscimo remuneratório, entre 50 e 100 por cento do valor-hora, mas não se aplica ao trabalho diurno, de segunda a sexta-feira e ao sábado, até às 13 horas. Protestando contra a intenção de não pagar estas horas, a FNAM salientou que a aceitação deste trabalho normal, além das 40 horas semanais, através de blocos de 40 horas, tem de ser feita através de uma «declaração negocial e unilateral».

Aos médicos, a federação disponibilizou minutas de declarações de: indisponibilidade para a realização de trabalho diurno além do horário, em dias úteis e aos sábados entre as 07h00 e as 13h00; indisponibilidade e expressa falta de vontade para aceitar pagamento de trabalho em blocos; recusa a todo o trabalho que ultrapasse os limites legais do trabalho suplementar.

Para fixar médicos no SNS, a FNAM exige «negociações sérias, para um salário-base justo e condições de trabalho dignas, ao invés do recurso ao trabalho suplementar ou incentivos voláteis, em troca de mais trabalho, que promovem a exaustão e colocam a segurança dos doentes em risco».

 

Gravidade exige resposta de emergência

Construído com a dedicação dos seus profissionais, desde sempre, o Serviço Nacional de Saúde tem sofrido constante ataque dos governos sucessivos de PS, PSD e CDS. Ocultado pelas declarações formais, o objectivo da política de direita tem sido a destruição deste serviço público, que assegura o cumprimento de um direito inscrito na Constituição. Em simultâneo, tem sido facilitado o desenvolvimento de grandes negócios com a doença.

Hoje, com o Governo PSD/CDS, não se alterou e aprofunda-se a linha que marcou os governos do PS, persistindo no desinvestimento, que agrava a degradação dos serviços e empurra médicos e enfermeiros para clínicas e hospitais dos grupos privados (onde também se desenvolve a luta, devido ao descontentamento provocado pelas condições oferecidas, particularmente no que toca à enfermagem).

O PCP, no dia 11 de Julho, realizou uma audição parlamentar, com participação de dirigentes sindicais e de ordens profissionais, de comissões de utentes e instituições académicas, insistindo na urgência de alterar o rumo e dar efectiva resposta aos problemas do SNS. Foi reafirmada a actualidade e a necessidade de colocar em prática as medidas que constam no «programa de emergência para o Serviço Nacional de Saúde», apresentado em Abril.

As lutas dos profissionais do SNS têm merecido empenho, apoio e solidariedade dos comunistas. O PCP defende a valorização dos salários e a melhoria das condições de trabalho como uma medida essencial para reter os que hoje trabalham no SNS e também para atrair e contratar mais profissionais, necessários em praticamente todas as áreas.

As linhas de intervenção em que estão agrupadas as medidas urgentes, propostas pelo PCP, incluem ainda: melhorar o acesso aos cuidados, valorizar a prevenção da doença e a promoção da saúde, assegurar o acesso aos medicamentos; reforçar os meios financeiros e técnicos e aumentar a capacidade do SNS; melhorar a organização do SNS, como serviço articulado e com gestão democrática; disciplinar as relações do Estado com o sector privado e promover a sua verdadeira fiscalização.