Notícias da luta dos povos pela paz, o desenvolvimento e a soberania
Portugal foi testemunha privilegiada das lutas que se travam, em várias latitudes do planeta, pela paz, a soberania e o desenvolvimento, contra as cadeias com que o imperialismo procura manter a todo o custo a sua hegemonia: do Médio Oriente à América Latina, são muitos os povos que insistem no direito a, livremente, decidirem dos seus destinos e a solidariedade desempenha neste combate um relevante papel.
A construção de um mundo mais justo beneficiará todos os povos do mundo
O genocídio que Israel leva a cabo na Faixa de Gaza desde há quase nove meses trouxe para primeiro plano a longa e persistente luta do povo palestiniano contra a ocupação, a repressão e o apartheid e pela concretização dos seus legítimos direitos nacionais, consagrados em sucessivas (mas nunca cumpridas) resoluções das Nações Unidas.
Um pouco por todo o mundo, e também em Portugal, são cada vez mais os que exigem um cessar-fogo imediato e permanente, a entrada de ajuda humanitária, a reconstrução do território, o fim da ocupação da Cisjordânia e de Jerusalém Oriental e a criação do Estado da Palestina.
Por cá, circula uma petição a exigir o reconhecimento por Portugal do Estado da Palestina – nas fronteiras de 1967 e com capital em Jerusalém Oriental –, que já recolheu milhares de assinaturas. Amanhã, 28, às 14h00, será entregue no Palacete de São Bento uma carta aberta ao primeiro-ministro, subscrita por dezenas de organizações e movimentos sociais, instando precisamente a esse reconhecimento.
Para o dia 4 de Julho, às 18h00, está marcada uma concentração na Praça do Rossio, em Lisboa, no momento em que passará pela capital a «Flotilha da Liberdade para as Crianças de Gaza». Desde 2020 que esta organização leva à população da Faixa de Gaza bens de primeira necessidade, procurando romper o bloqueio israelita e denunciando aquela que da «maior prisão a céu aberto do mundo» se transformou, nos últimos meses, num imenso cemitério de crianças – mais de 14 mil crianças mortas em nove meses de massacres. No dia 5, em Évora, há manifestação «Pela Paz! Palestina livre»: é às 18h00 no Largo Luís de Camões.
No dia 19 realizaram-se concentrações de solidariedade em Beja e em Coimbra.
Apartheid e genocídio
O bastonário da Ordem dos Advogados da Palestina, Fadi Abbas, esteve em Portugal e participou, dia 24, numa conferência na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (FDUL), promovida pelo MPPM e pela Associação Portuguesa dos Juristas Democratas.
Na sua intervenção, o advogado palestiniano lembrou a violação sistemática de resoluções das Nações Unidas por parte de Israel e denunciou as múltiplas e graves violações do direito internacional, na Faixa de Gaza e não só: os massacres; a destruição de hospitais, escolas, abrigos e bairros; a expansão dos colonatos nos territórios ocupados; a expulsão de populações; as prisões arbitrárias de palestinianos, muitos dos quais menores de idade (são actualmente mais de 9000 os detidos em prisões israelitas). Fadi Abbas não tem dúvidas: Israel está a destruir qualquer possibilidade de criação futura de um Estado palestiniano.
Na mesa com Abbas estavam representantes das organizações promotoras da sessão, o presidente da Associação Académica, o professor de Direito Internacional Pedro Caridade Freitas, o director da FDUL Eduardo Vera Cruz Pinto e o embaixador da Palestina em Portugal, Nabil Abuznaid. Em debate estiveram conceitos jurídicos como o direito de resistência, a autodefesa, o apartheid ou o genocídio, a política de «dois pesos e duas medidas», onde se exige a uns o que se perdoa a outros, e a morosidade da justiça internacional. A este respeito foi dado um revelador exemplo: por carência de financiamento, o Tribunal Internacional de Justiça está ainda a investigar os massacres cometidos por Israel nos campos de refugiados de Sabra e Chatila, no Líbano, cometidos no início da década de 80 do século XX.
Foram ainda escalpelizadas as decisões do TIJ relativas à acção interposta pela África do Sul, que invoca a Convenção para a Prevenção e Punição do Crime de Genocídio. Trata-se de um crime que se encontra tipificado e que estará a ser cometido na Faixa de Gaza, nomeadamente com a matança indiscriminada de populações, a destruição de hospitais (considerados desde meados do século XIX como «território neutro»), a privação de água, alimentos e outros bens de primeira necessidade.
Algumas das resoluções das Nações Unidas relativas à Palestina
Resolução 181 da Assembleia-Geral das Nações Unidas (1947): consagra a divisão da Palestina em dois Estados, um judeu e um árabe. Só o Estado de Israel existe, num território mais vasto do que lhe era consagrado (em 78% do território, conquistados pela força, e não nos 56% previstos na resolução)
Resolução 194 da Assembleia-Geral das Nações Unidas (1948): estabelece o direito de retorno de refugiados palestinianos, expulsos pela guerra no processo que ficou conhecido por Nakba, a «Catástrofe»
Resolução 242 do Conselho de Segurança das Nações Unidas (1967): aprovada na sequência da chamada «Guerra dos Seis Dias», estabelece a inadmissibilidade da aquisição de território em resultado da guerra e exige a retirada dos territórios entretanto ocupados – Cisjordânia, Jerusalém Oriental e Faixa de Gaza, na Palestina, os Montes Golã sírios, e a Península do Sinai, no Egipto, entretanto devolvida em 1978
Resolução 3379 da Assembleia-Geral das Nações Unidas (1975): classifica o sionismo como uma forma de racismo e discriminação racial
Resolução 2334 do Conselho de Segurança das Nações Unidas (2016): reafirma a ilegalidade dos colonatos israelitas em território palestiniano ocupado, incluindo Jerusalém Oriental, tendo em conta as fronteiras de 1967
Com submissão não há progresso nem justiça
A biblioteca da Casa do Alentejo, em Lisboa, acolheu no dia 19 a sessão pública «América Latina: paz, desenvolvimento e soberania». Promovida pelo CPPC, contou com a participação de Mary E. Flores, embaixadora da República Bolivariana da Venezuela em Portugal; Laura Martínez Chacon, terceira secretária da Embaixada de Cuba; e Pedro Prola, coordenador do núcleo de Lisboa do Partido dos Trabalhadores (PT) do Brasil. A presidente da direcção nacional do CPPC, Ilda Figueiredo, lançou o debate.
«A história da América Latina está marcada pela luta e pelo sacrifício na busca da justiça, igualdade e autodeterminação», começou por sublinhar a diplomata venezuelana, traçando uma perspectiva histórica sobre o confronto dos povos do subcontinente face ao imperialismo norte-americano. É neste quadro, sublinhou Mary E. Flores, que se deve analisar a «violação flagrante» da soberania venezuelana que constitui o roubo pelos EUA da Citgo (filial da empresa petrolífera nacional no estrangeiro) e de outros valiosos activos do país.
Denunciando os efeitos do bloqueio imposto à Venezuela pelos EUA nas condições de vida da população, sobretudo da mais vulnerável, a diplomata sublinhou a resistência e determinação «admiráveis» dos venezuelanos e de outros povos latino-americanos. Informou ainda que para as eleições de 28 de Julho foram registadas 10 candidaturas, apoiadas por 37 forças políticas, o que demonstra a «credibilidade e força» do sistema eleitoral venezuelano, «provado e validado em mais de 30 processos eleitorais nos últimos 24 anos».
«Máxima asfixia» contra Cuba
De Cuba veio a recordação de mais de seis décadas de «guerra sem cessar-fogo e sem armistício» contra um pequeno país por parte da mais poderosa potência económica e militar do mundo. O objectivo, lembrou Laura Martínez Chacon, é «derrubar as colunas que sustentam a resistência do povo cubano» e impedir que este exerça o seu «direito humano a viver em paz». Logo em 1960, meses após a vitória da Revolução, um memorando secreto do Departamento de Estado dos EUA apontava a promoção do descontentamento interno como o único meio previsível para derrubar o poder revolucionário. No ano seguinte foi imposto o bloqueio.
A situação, nos últimos anos, agravou-se ainda mais, denunciou a diplomata: «Está em curso um cenário de máxima asfixia», sublinhou, referindo-se às 243 medidas adicionais implementadas pela administração Trump (e não revertidas pela actual), mais de 50 das quais no período mais intenso da pandemia de COVID-19. Foram cortadas todas as fontes de divisas do país, o turismo diminuiu consideravelmente e foi promovida uma «enorme perseguição energética e financeira». A vergonhosa inclusão de Cuba na lista de países que supostamente patrocinam o terrorismo, elaborada pelos EUA, levou a que bancos e instituições financeiras deixassem de conceder créditos ao país.
Apesar disso, Cuba continuou a salvar vidas. De cubanos, sim, mas enviando também brigadas médicas a 46 países e criando três vacinas para o novo vírus.
Retomar o progresso
Pedro Prola, por seu lado, destacou os avanços registados em dois anos e meio de governo do presidente Lula da Silva, que «retomou o caminho da democracia e do desenvolvimento com justiça social»: valorização dos salários e do salário mínimo; benefícios para os funcionários públicos, designadamente na Saúde e na Educação; isenção do imposto sobre rendimentos para quem aufere até dois salários mínimos; aprovação da lei da igualdade salarial entre homens e mulheres; retomada de programas sociais históricos, como o Bolsa Família e o Minha Casa, Minha Vida, e o lançamento de novos programas.
Em resultado disto, valorizou o dirigente do PT, «24 milhões de brasileiras e brasileiros saíram da fome», o desemprego recuou para níveis de 2014 e o PIB cresceu 2,9 por cento em 2023, três vezes acima das previsões. Apesar dos avanços, salientou Pedro Prola, o governo «enfrenta feroz oposição de sectores altamente privilegiados, que atacam duramente o programa de reconstrução do Brasil com desenvolvimento e justiça social». A correlação de forças institucional, acrescentou, não é particularmente favorável: «no Congresso, as forças de esquerda e centro-esquerda não ocupam sequer um terço dos mandatos».
O responsável pelo núcleo do PT em Lisboa destacou ainda o papel de Lula da Silva e do governo brasileiro na busca de uma solução política para o conflito no Leste da Europa e de um cessar-fogo imediato e permanente na Palestina.