VJing e Cinema ao Vivo
Nas acid house parties dos anos 80/90 fundia-se ao vivo música e imagens em movimento
A partir dos anos 1980/90, os equipamentos de registo e edição de imagens em movimento iniciaram a sua conversão para o digital. Combinados com os sintetizadores e os equipamentos de montagem e mistura de som previamente utilizados para a música electrónica, passaram a integrar a cena nocturna e as acid house parties que se iniciam também nesse período. Estas festas, que passaram a ser designadas por raves, consistiam em eventos realizados em espaços ao ar livre ou em armazéns e edifícios abandonados, situados na periferia das cidades.
Vulgarmente definidas pela combinação entre a música electrónica e o consumo de drogas sintéticas, estas propuseram a fusão de múltiplas expressões, como música, luz e imagem. As primeiras tiveram lugar em Manchester e em Londres, no Reino Unido, em finais dos anos 1980. Foi neste contexto que se desenvolveram as práticas de VJing que complementavam a mistura ao vivo de música com apresentações visuais.
Animados pela possibilidade de criar novas performances e trabalhando no espírito da estética e filosofia do-it-yourself em voga na mesma década, os VJ foram muitas vezes os responsáveis pela criação e aperfeiçoamento de novos equipamentos e software capazes de integrar diferentes funções e melhorar as suas apresentações. Embora circunscritas a um contexto específico, estas performances desenvolveram-se e adquiriram características particulares e uma linguagem própria. O surgimento do canal de televisão MTV em 1981 foi um dos catalisadores do VJing, ao estabelecer uma conexão mais estreita entre música e imagem e tendo em conta que vários VJ tomaram como inspiração para a elaboração dos seus trabalhos os efeitos e manipulação de imagens presentes nos videoclips.
O termo VJ foi apropriado pela MTV desde o início das suas emissões para designar os seus apresentadores. No entanto, julga-se que o mesmo tenha sido empregue pela primeira vez nos anos 1970, na discoteca nova-iorquina Peppermint Lounge, para designar algumas performances de combinação de som e imagens aí realizadas.
Apesar das práticas de VJing não se terem originado no campo do cinema ou do audiovisual, estas apresentam hoje resultados que são o reflexo da confluência deste domínio com o da performance e com o cenário e experiências das acid house parties do final dos anos 1980.
Estas apresentações acontecem hoje em espaços diversificados, tais como galerias de arte e museus, salas de espectáculo ou festivais de música e cinema, pelo que não faz sentido pensá-las contemporaneamente como habitantes da cena nocturna.
A distinção entre VJing e outras modalidades como o Cinema ao Vivo é uma questão colocada diversas vezes na reflexão sobre estas práticas, mas ainda não resolvida. O debate está presente na proposta de trabalho da edição conjunta do Festival Transmediale e do Festival Club Transmediale dedicada ao cinema ao vivo, que questiona, de modo claro, quais as diferenças que podem ser apontadas entre ambas as manifestações e está também expressa no uso indiferenciado dos dois termos por parte de diferentes autores.
Optar por uma designação específica pode significar apenas seleccionar uma herança ou um percurso histórico dominante para as apresentações ao vivo de imagens em movimento e definir o contexto artístico e mediático onde um artista opta deliberadamente por se integrar.
Vários artistas e cineastas associados ao cinema experimental e à videoarte construíram a sua obra mediante a remistura ou desconstrução criativa de found footage e, contemporaneamente, outros trabalham de modo semelhante enquadrados pela cultura remix, não deixando, no entanto, de estar inseridos no território das práticas cinematográficas.
Além disso, a generalidade dos artistas que elabora performances ao vivo com imagens em movimento combina, muitas vezes, uma série de procedimentos, que podem variar de obra para obra ou mesmo dentro de uma mesma obra, tornando difícil unificar e rotular a natureza do seu trabalho. Assim, considera-se prudente não utilizar categorizações rígidas e admitir a ocorrência habitual da sobreposição destes dois conceitos.