Diplomas do PCP em defesa dos direitos laborais marcam agenda parlamentar

O PCP leva ao plenário da Assembleia da República, dia 20, quatro diplomas sobre legislação laboral. Antes da dissolução daquele órgão de soberania, prevista para 15 de Janeiro, no centro do debate estarão, assim, pela mão dos deputados comunistas, questões cruciais para a vida dos trabalhadores.

É dever do Estado promover e garantir o direito de contratação colectiva

Com esta iniciativa, marcada ao abrigo do direito regimental de agendamento potestativo, o PCP pretende não só repor e reforçar direitos como pôr termo a normas e disposições que se têm revelado altamente gravosas para os trabalhadores.

«Há a oportunidade de reverter normas gravosas da legislação laboral e reforçar os direitos dos trabalhadores», afirmou ontem numa declaração aos jornalistas a líder parlamentar do PCP, onde deixou claro o propósito da sua bancada em confrontar as demais forças políticas com as propostas e, desta forma, separar águas quanto ao posicionamento de cada uma no tocante à defesa dos interesses dos trabalhadores. «Será um momento de clarificação, em que terão de assumir uma posição», sublinhou Paula Santos.

Um dos projectos de lei visa reforçar os direitos dos trabalhadores no regime de trabalho nocturno e por turnos. Entendem os comunistas que o horário de trabalho, sua fixação e cumprimento, bem como o respeito pelos tempos de descanso, respectivas condições de pagamento e de compensação, a par da sua articulação com a vida pessoal e familiar, constituem questões da maior actualidade.
Nesse sentido, e partindo do princípio da excepcionalidade do trabalho nocturno, importa que o conceito que o define seja clarificado, fixando esse período das 20h00 às 7h00 do dia seguinte. Esta é precisamente uma de entre as várias medidas constantes no diploma, no qual são reconhecidas as «características penosas específicas deste regime de trabalho», com a simultânea definição de «medidas de limitação, salvaguarda e reparação dos seus efeitos».
Limitado é, assim, o trabalho nocturno, às «situações que sejam, técnica e socialmente justificadas, desde que sejam garantidas condições de segurança, de protecção da saúde, de garantia de protecção da maternidade e paternidade, de infra-estruturas e serviços sociais compatíveis com este tipo de horários de trabalho e sejam fixados, por negociação e contratação colectiva, subsídios e compensações adequadas aos trabalhadores abrangidos».

De enorme alcance é também o projecto de lei que repõe o princípio do tratamento mais favorável do trabalhador. Como é lembrado na exposição de motivos, este princípio «foi um princípio fundamental do Direito do Trabalho Português consagrado pela Revolução de Abril».
De acordo com o mesmo, sublinham os deputados comunistas, «as normas legais regulamentadoras das relações de trabalho devem estabelecer regras mínimas, as quais podem ser afastadas por normas constantes de instrumentos de regulação colectiva de trabalho, designadamente por convenções colectivas, desde que estas estabeleçam condições de trabalho mais favoráveis para os trabalhadores».
Repor o princípio do tratamento mais favorável do trabalhador, que fora removido da lei portuguesa em 2003 por um governo PSD – situação que não mudou com as alterações ao Código do Trabalho aprovadas em 2009 num governo PS –, eis, pois, o objectivo deste diploma comunista.

 

Pela retribuição justa

Repor os montantes e regras de cálculo do pagamento do trabalho extraordinário, trabalho suplementar e em dia feriado é, noutro plano, o propósito de um terceiro diploma com a chancela do PCP. Esta é uma medida destinada a contrariar as alterações às leis laborais promovidas por sucessivos governos, e em particular a revisão do Código do Trabalho levada a cabo em 2012 por um governo PSD/CDS-PP, que agravou ainda mais a degradação geral das condições de vida da maioria da população. Na óptica do PCP, representou mesmo um «retrocesso civilizacional profundo», que se traduziu na imposição do trabalho forçado e gratuito, diminuição de salários, promoção da precariedade, promoção dos despedimentos, ataque à contratação colectiva.
Daí que, no caso concreto do trabalho suplementar – e face à redução do respectivo pagamento praticada por várias empresas –, o PCP preconize a sua reposição para 50% da retribuição na primeira hora, 75% nas horas e fracções subsequentes e para 100% no caso de ser prestado em dia descanso semanal, obrigatório ou complementar, ou em dia feriado, para todos os trabalhadores.

 

Pôr termo à caducidade

Eliminar a caducidade dos contratos colectivos de trabalho, revogando para o efeito o respectivo regime, eis o objectivo de outro dos diplomas em matéria laboral com os quais o PCP marca os trabalhos parlamentares neste final antecipado de legislatura.
É sabida a importância que a contratação colectiva tem e o seu papel primordial na negociação entre trabalhadores e patronato. Só que essa dimensão negocial das relações laborais cedo começou a ser desvalorizada – foi-o logo na primeira versão do Código do Trabalho aprovada em 2003 por um governo PSD/CDS-PP – numa tendência que persistiu até hoje. Uma desvalorização que se materializou quer por via da «eliminação do conteúdo fundamental do princípio do tratamento mais favorável do trabalhador quer através da caducidade das convenções colectivas de trabalho por decisão unilateral dos empregadores».
Normas lesivas dos direitos dos trabalhadores que foram «pioradas pelo governo PS de maioria absoluta em 2009, agravadas pelo governo PSD/CDS em 2012», agravamento que se manteve com os governos do PS até à presente data, sempre com o apoio dos partidos de direita, como recorda o Grupo Parlamentar do PCP na nota preambular do seu diploma.
Assim, o que a caducidade dos instrumentos de regulação colectiva significou foi a outorga às associações patronais de poderem «fazer chantagem sobre os trabalhadores e os seus sindicatos, colocando-os perante a falsa alternativa entre a caducidade ou o acordo para a redução de direitos».
Rejeitar esse caminho de agravamento da exploração, revogando as medidas que o permitem, tal é a mudança que o diploma do PCP aponta.

 

1,8 milhões de trabalhadores (quase 44% do total) trabalham por turnos, à noite, ao sábado, ao domingo ou numa combinação destes tipos de horário

 

11% dos trabalhadores trabalha à noite

Incidência por sector (percentagem dos trabalhadores do respectivo sector que trabalham por turnos, à noite, ao fim-de-semana ou ao serão)
47% Serviços; 40% Agricultura, produção animal, caça, floresta e pesca; 33% Indústria