Poeta, ensaísta, tradutor, crítico literário, professor universitário, militante comunista, Manuel Gusmão, falecido na quinta-feira, 9, foi um dos maiores nomes da literatura e da cultura portuguesas dos séculos XX e XXI. «Foi um homem integral», afirmou, no funeral, o Secretário-Geral do PCP.
Centenas de pessoas – entre familiares, amigos, antigos colegas e alunos, personalidades do mundo da cultura, leitores e camaradas – participaram nas cerimónias fúnebres de Manuel Gusmão, realizadas no domingo em Lisboa. Reunidos em redor da urna coberta com uma grande bandeira vermelha do PCP, que foi o seu Partido durante 50 anos, ouviram Paulo Raimundo referir-se a Manuel Gusmão como um «intelectual comprometido com o seu povo e com o seu tempo».
A cultura enquanto factor de liberdade e emancipação constituem elementos que «davam corpo ao seu pensamento e à sua obra», acrescentou o dirigente comunista, para quem Manuel Gusmão contribuiu ainda, e como poucos, para a «interpretação do tempo em que vivemos e para a compreensão histórica do papel dos trabalhadores, dos explorados, dos oprimidos, na construção do seu devir colectivo».
Resistência e aspiração
Da condição de professor universitário na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, o Secretário-Geral do PCP sublinhou que o trabalho e a dignidade profissional de Manuel Gusmão foram «marcantes para todos aqueles que na academia com ele tiveram contacto. Um exemplo de rigor ético e pedagógico, em que o pensamento crítico e a reflexão foram uma marca e um contrário ao facilitismo do pensamento dominante».
Quanto à sua poesia, ela era «profundamente ligada à vida, ao povo de onde emanou», libertando-se dela a sua aspiração «a uma outra vida, a uma outra sociedade, a um outro mundo». Era o próprio Manuel Gusmão quem dizia que a poesia «pode ser uma forma de resistência» e que ela própria «resiste à quantidade de barbárie que em cada tempo insiste».
Para o Secretário-Geral do PCP, o intelectual que ali se homenageava era um dos maiores «do nosso País e do nosso tempo». Pela obra literária e ensaística, desde logo, como também pelo seu pensamento sobre o mundo, pela sua «dimensão histórica, filosófica e política».
Mais de meio século
de ligação ao Partido
Sublinhada foi, ainda, a condição de comunista de Manuel Gusmão, que se tornou membro do PCP a 2 de Maio de 1974, um dia após o grandioso 1.º de Maio que confirmou Abril e a sua natureza revolucionária. Chegava, assim, a esta «assembleia de homens, explorados e livres, oprimidos e livres», depois de uma ligação regular e directa ao Partido desde 1971. Nesse intervalo, participou activamente na luta contra o fascismo e acolheu em sua casa, a viver durante oito meses, um funcionário clandestino do PCP.
Nas múltiplas tarefas que assumiu, destacou ainda Paulo Raimundo, «inseriu a sua humildade e generosidade» e «acrescentou o seu pensamento e reflexão». Em todos os combates e lutas, esteve sempre com a mesma «forma empenhada, independentemente da organização ou tarefa e sempre com a profunda convicção da justeza da nossa luta, da sua necessidade e inevitabilidade».
Nome maior da cultura portuguesa
e destacado militante comunista
Numa nota emitida, no próprio dia 9, pelo Secretariado do Comité Central do PCP, destaca-se diversos aspectos da multifacetada biografia de Manuel Gusmão, nascido em Évora em 1945. A sua obra poética e ensaística foi amplamente reconhecida e premiada. Em 2019, foi distinguido pelo Estado português com a Medalha de Mérito Cultural.
A sua actividade como professor universitário, ensaísta e crítico literário enriqueceu o panorama dos Estudos Comparados e da Teoria da Literatura. Foi redactor das revistas O Tempo e o Modo, Letras e Artes, Crítica e Seara Nova e fez parte do Conselho Editorial da Revista Vértice.
Militante do PCP desde Maio de 1974, assumiu inúmeras tarefas e responsabilidades: integrou o Secretariado da Célula dos Professores da Organização Regional de Lisboa (ORL) e, mais tarde, o Secretariado de Artes e Letras, bem como a Direcção do Sector Intelectual. Em 1975 foi eleito deputado à Assembleia Constituinte pelo círculo de Évora e, em 1976 e 1979, à Assembleia da República. Foi membro do Secretariado do Grupo Parlamentar do PCP e fez parte do Conselho da Comunicação Social.
Membro do Comité Central do PCP do IX ao XIX Congresso, foi membro da Direcção da Organização Regional de Lisboa e era actualmente membro da Comissão Nacional da Cultura. Fez parte da Comissão Instaladora Provisória do Sindicato dos Professores, constituída em Maio de 1974, e da Comissão Directiva Provisória, eleita nesse ano.