- Nº 2604 (2023/10/26)

As injustiças no Orçamento e as soluções necessárias

Em Foco

O PCP apresentou um primeiro conjunto de 12 propostas de alteração ao Orçamento do Estado para 2024 (as primeiras de muitas), que a ficar como está não responde aos graves problemas que afectam os trabalhadores, o povo e o País.

A realidade do País tem sido marcada pelo brutal agravamento do custo de vida e por uma indisfarçável contradição: baixos salários e pensões auferidos pela generalidade da população e os colossais lucros acumulados pelos grandes grupo económicos e multinacionais (cerca de 25 milhões de euros por dia nos primeiros meses do ano).

Mas há mais: o SNS atravessa uma situação dramática, graças ao desinvestimento e ao favorecimento dos grupos privados; faltam professores nas escolas; e o direito à habitação tornou-se praticamente inacessível para a maioria. Já os privilégios dos fundos imobiliários e da banca, com 11 milhões de euros de lucros diários, permanecem intocáveis.

E tudo isto acontece num quadro em que, como confirma o Eurostat, Portugal registou, no segundo trimestre deste ano, o segundo maior excedente das conta públicas na Zona Euro e na União Europeia. Ou seja, apesar de existirem recursos suficientes para responder a problemas do País, o Governo opta, na proposta de Orçamento, por limitar o aumento dos salários e das pensões, restringir a despesa e o investimento públicos e disponibilizar ainda mais recursos para garantir privilégios ao grande capital. Apenas e só por ser essa a sua opção.

Mais apoios ao capital

Às medidas de apoio ao grande capital contidas em orçamentos anteriores juntam-se agora outras, na proposta de OE para 2024.

- Aumento da despesa fiscal emImposto sobre Rendimento de Pessoas Colectivas (IRC). Trata-se do que não é cobrado devido aos benefícios fiscais ao grande capital, que passam para 1600 milhões de euros, mais 15% face a 2023. ou seja, mais 220 milhões de euros)

- Terminam as «contribuições extraordinárias de solidariedade» sobre lucros das energéticas e da grande distribuição

- Eliminação da TSU nos prémios no âmbito da participação dos trabalhadores nos lucros, como propõe a CIP. Ou seja, uma empresa pode «distribuir lucros» por um conjunto de administradores e gestores, num valor máximo de 4100 euros, sem tributação fiscal ou pagamento da TSU

- Reforço de verbas para as Parcerias Público-Privado para 1265 milhões, mais cerca de 200 milhões face ao previsto há um ano

- Mais de metade do Orçamento do SNS vai directamente para os privados. São 8000 milhões de euros, quando o total do orçamento para a saúde é de 15,700 milhões

- Regime dos residentes não habituais, cuja despesa fiscal em sede de IRS é de 1500 milhões de euros por ano. O anunciado fim deste regime mantém, no entanto, os privilégios fiscais para os actuais beneficiários

Opções fiscais injustas

O Governo vai atrás da manobra do PSD e concentra todas as medidas de suposto alívio fiscal no IRS, optando no entanto por não actualizar a dedução específica, valor congelado desde 2010, o que beneficiaria todos os rendimentos. Em vez disso, alivia – de modo mais tímido do que o proposto recentemente pelo PCP – apenas os rendimentos mais baixos e intermédios.

Ao fazer esta opção, passa ao lado da necessidade de reduzir os impostos indirectos, nomeadamente o IVA sobre bens e serviços essenciais, na energia ou nas telecomunicações. Ao contrário do que tem sido dito, quase metade dos trabalhadores não paga IRS e a maioria dos reformados também não – devido aos baixos salários e pensões que auferem. Já o IVA todos pagam, o que penaliza sobretudo a grande massa de população: um litro de leite custa o mesmo para um desempregado e para o accionista de um banco.

O Governo prepara-se também para acabar com o IVA Zero nos bens alimentares, o que levará a um maior agravamento dos preço dos alimentos. Como o PCP denunciou em devido tempo, sem a regulação dos preços esta medida acabou por beneficiar sobretudo a grande distribuição.

Ao mesmo tempo, entre outras medidas que permitiriam uma maior justiça fiscal, o Governo não acaba com regimes de privilégio fiscal e nem garante a tributação em Portugal dos lucros realizados no País.


PCP contra agravamento do IUC

A pretexto das «preocupações com o clima», o Governo propõe o agravamento do Imposto Único de Circulação até 25 euros para os automóveis com motor de combustão anteriores a 2007. Na passada quinta-feira, na Assembleia da República, Bruno Dias considerou esta proposta «mais uma escandalosa e aberrante medida de injustiça social, a penalizar em particular precisamente aqueles que não têm possibilidade de trocar de carro». Para o deputado do PCP, «alguém que pense em objectivos ambientais mantendo a falta de transporte colectivo, gravíssima, que existe em Portugal, não está a enfrentar o problema central».