- Nº 2590 (2023/07/20)

Fragmentos

Opinião

Deu que falar, nos últimos dias, a decisão da administração norte-americana de fornecer à Ucrânia as chamadas bombas de fragmentação (cluster bombs). As críticas surgiram de diversos quadrantes, alguns até pouco dados a elas quando se trata de condenar o imperialismo e as suas guerras.

Mas o que são, afinal, estas bombas de fragmentação?

São invólucros com dezenas ou até centenas de bombas de pequena dimensão, que podem ser lançados a partir de aviões, mísseis ou peças de artilharia. A sua fraca precisão é compensada pela vasta área de território que cobrem, ao espalhar por muitos quilómetros as bombas que contêm no seu interior. A probabilidade de atingirem zonas civis é extremamente elevada.

E há mais: parte considerável das pequenas bombas não explode no momento do bombardeamento, sendo muitas delas detonadas mais tarde, acidentalmente, pelas populações. Estima-se que 98 por cento dos milhares de mortos ou feridos graças a estes engenhos explosivos sejam civis – mais de um quarto dos quais crianças.

Utilizadas já em diversas ocasiões, foi porventura durante a agressão norte-americana ao Vietname, nas décadas de 60 e 70 do século XX, que os seus efeitos foram mais devastadores: sobre esse país asiático, como sobre os seus vizinhos Camboja e Laos, foram despejadas toneladas destas bombas. Só no Laos estima-se que 80 milhões não tenham explodido de imediato, sensivelmente 30% das que ali foram lançadas.

Desde o fim dos bombardeamentos, 20 mil laocianos morreram e muitos outros ficaram mutilados ou desfigurados devido a estes artefactos de pequena dimensão e, como refere o jornalista Lewis M. Simons (que cobriu a guerra não declarada dos EUA contra aquele país), «mais parecidos com brinquedos do que com armas mortais (...). São demasiado tentadores para qualquer menino ou menina os ignorar».

Naqueles três Estados do sudeste asiático, esta tragédia soma-se a outras, igualmente prolongadas, e também elas causadas pela agressão imperialista: o napalm e o Agente Laranja, profusamente utilizados pela aviação norte-americana, foram – e são ainda – responsáveis por milhares de cancros e malformações.

Mas voltemos às bombas de fragmentação, essas armas «traiçoeiras» e «indiscriminadas», independentemente de quem as use, já rejeitadas por mais de uma centena de países, que desde 2008 se têm juntado à convenção internacional que proíbe o seu uso, produção, transferência e armazenamento. As consequências da sua utilização massiva na Ucrânia não serão diferentes das verificadas noutras latitudes: apenas acrescentarão pelos anos fora mais sofrimento àquele já tão martirizado povo.

Mais do que continuar à procura da arma que virará o curso da guerra (já foram tantas e ela afinal continua), melhor seria que se trabalhasse para lhe pôr fim o quanto antes.

 

Gustavo Carneiro